Valor econômico, v.20 , n. 4768 , 08/06/2019. Política, p. A7

 

PT no Senado ganha perfil técnico e apaziguador

 

 

Vandson Lima

Renan Truffi 

08/06/2019

 

 

Esqueça a estridência dos tempos de Gleisi Hoffmann (PR) e Lindbergh Farias (RJ). Ou a oposição radical de Fátima Bezerra (RN) e Regina Sousa (PI), que chegaram a ocupar por seis horas a mesa do Senado na tentativa de não deixar votar a reforma trabalhista há dois anos. A nova bancada do PT no Senado, de seis integrantes, tem um perfil apaziguador e técnico.

Novatos, o médico Rogério Carvalho (SE) e o economista Jean Paul Prates (RN) têm se destacado nas discussões. Carvalho é um discípulo do ex-governador do Sergipe Marcelo Déda, morto em 2013, e especialista em gestão hospitalar, com doutorado pela Universidade de Campinas (Unicamp). "Pela minha vivência acadêmica, você nunca vai me ver fazendo uma discussão sem que haja ali embasamento técnico", diz. O senador sergipano alega que a postura mais agressiva dos antecessores fazia sentido, em especial à época do controverso impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. O momento, contudo, é outro. "Precisamos tirar a bancada do PT do isolamento, construir relações com todos. Buscar uma relação mais afável, menos agressiva". Para isso, com menos de um mês de mandato, Carvalho passou a promover encontros em casa com outros senadores, em especial das regiões Norte e Nordeste e de siglas divergentes do PT. "Minha conversa ali é com Tasso Jereissati (PSDB-CE), Otto Alencar (PSD-BA). É entender que o governo [Bolsonaro] tem o direito de construir sua agenda e nós, de sermos guardiões daquilo que nos é caro. Nosso papel é produzir civilidade", defende.

Com Déda, Carvalho foi secretário de Saúde na capital sergipana e depois, do Estado. Para chegar ao Senado este ano, venceu uma dura disputa eleitoral. Na Casa, relata, viu-se obrigado a estudar economia para se colocar nas discussões. "A economia de mercado e o liberalismo tem um potencial de produção de riqueza imenso, desde que você tenha um Estado que faça a mediação e cumpra um papel redistributivo". Ante à surpresa do repórter com a defesa de tal agenda, o senador faz outra referência inesperada. "É como na série 'Game of Thrones': todos têm um pouco de bondade e um pouco de maldade. Nada é apenas um lado".

A política fortemente calcada nas desonerações de tributos do governo Dilma é alvo de críticas de Carvalho. "Fez-se ali uma política para salvar a indústria, mas aquele modelo esmagou a classe média", lembra. Classe média com a qual, diz, o PT precisa voltar a dialogar. "Espero que tenhamos uma reflexão para reposicionar o partido. O grande desafio é dar respostas de como gerar riqueza. Para isso, é preciso incluir a classe média. Temos que trazê-la para protagonizar um novo modelo de desenvolvimento".

Apesar de também ser uma das caras novas, o senador Jean Paul tem uma trajetória diferente. O parlamentar é suplente da ex-senadora Fátima Bezerra (PT-RN), que deixou o mandato após ser eleita governadora do Rio Grande do Norte. Com quatro anos de mandato pela frente, ele tem atraído atenção nas discussões em torno da cessão onerosa. Além de economista, é advogado e tem quase 40 anos de experiência nas áreas de petróleo e gás natural. "Sempre digo que cada um dos seis senadores tem uma peculiaridade diferente. Como acontece com heróis de quadrinhos, cada um tem um poder. A gente se integra adequadamente", brincou o petista, que entrou no partido apenas em 2013, depois de fazer carreira na iniciativa privada. A experiência na área de energia fez com que ele trouxesse uma visão antagônica em relação a defendida pelo partido até a última legislatura. Jean Paul é a favor do leilão da cessão onerosa do pré-sal, mas desde que seja com uma finalidade: reequilibrar as contas dos governos estaduais.

"Tem muita gente na própria esquerda que acha que soa como aceitação da venda do pré-sal. Não é isso. A gente está trabalhando nessa conciliação aí para mostrar que o pré-sal é um ativo estratégico que pode ser utilizado em momentos de necessidade. Agora é a vez de a gente cortar na própria carne, na panturrilha, para conter a crise nos Estados", disse.

A origem de Jean Paul também difere do que se costuma encontrar no PT. Criado em Copacabana (RJ), ele é de uma família de classe média alta e, por isso, tem interlocução com o setor do empreendedorismo. "Levo um canal aberto e de diálogo com o segmento empreendedor, quero mostrar o que o Estado brasileiro já fez por eles" disse. Na visão de Jean Paul, a classe trabalhadora está "mudando" e muitos deles não se enxergam mais como simples peões. "Quero fazer interlocução com esse pequeno empresário e médio empreendedor", explicou.