O globo, n. 31316, 04/05/2019. Economia, p. 19

 

Riqueza do pré-sal

Manoel Ventura

Martha Beck

04/05/2019

 

 

Governo prevê levantar R$1 tri em 30 anos com exploração. Proposta é dividir com estados

O governo calcula que será possível arrecadar R$ 1 trilhão pelos próximos 30 anos com a exploração de quatro blocos de petróleo do pré-sal que integram o megaleilão em outubro. Os recursos, que virão da arrecadação de royalties (compensação paga pelas empresas que exploram petróleo) e impostos, vão irrigar os cofres da União, estados e municípios. A conta foi apresentada pelo ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, em entrevista ao GLOBO. Atualmente, a maior parte do dinheiro arrecadado com o pré-sal, que inclui também a parte que cabe à União do petróleo explorado, vai para o governo federal. Mas, diante da penúria de estados e municípios, o ministro da Economia, Paulo Guedes, pretende fazer uma distribuição mais generosa dos valores. A promessa é partilhar até 70% do valor obtido.

— É R$ 1 trilhão em 30 anos de arrecadação nos três níveis. Isso é dinheiro e tem um efeito multiplicador —disse Albuquerque.

Alteração na constituição

Primeiro irá entrar no caixa do governo o bônus de assinatura do leilão, que vai chegar a R$ 106 bilhões, pago pelas empresas que vencerem a licitação. Esse dinheiro também será compartilhado com os governos regionais. Depois virá a exploração dos blocos. É nesse momento que o dinheiro de royalties começa a entrar nos cofres dos governos. O governo também fica com uma parte do petróleo produzido para depois vendê-lo. Albuquerque lembrou que a operação será possível graças a um entendimento firmado entre a União e a Petrobras para rever o contrato da chamada cessão onerosa — acordo pelo qual a estatal obteve o direito de exploração de 5 bilhões de barris de petróleo do présal. Os termos do contrato foram revistos depois de uma longa negociação, e a Petrobras ganhou o direito de ser ressarcida pela União em R$ 33,6 bilhões. Isso abriu caminho para que o governo possa vender o excedente de petróleo que existe nesse campos, depois de anos de discussão. O leilão está marcado para 28 de outubro, no Rio. O ministro alerta que a licitação não pode mais atrasar, sob o risco de o país perder dinheiro e investimentos. —Cada ano que a gente deixar de fazer o leilão, segundo dados bastante conservadores, são US$ 6 bilhões que se perdem em investimentos, em plataformas, em custo de oportunidades — disse ele, lembrando que o petróleo da cessão onerosa já está pronto para ser explorado. Segundo o ministro, outros países também têm reservas muito elevadas que vão entrar no mercado mundial nos próximos anos, o que pode concorrer com os campos brasileiros. — Daqui a pouco tem outros campos. México e Guiana estão aí. Aqui está pronto. Cada ano que você não faz o leilão, deixa de gerar emprego aqui, deixa de contratar plataforma — acrescentou.

A equipe econômica já sabe que, para dividir os recursos do petróleo com estados e municípios, terá que propor uma alteração na Constituição. Como antecipou o GLOBO, será necessário criar uma nova exceção na regra do teto de gastos, que limita as despesas federais. Com isso, o dinheiro pode ser transferido para os governos regionais sem contar como despesa sujeita ao limite do teto.

Sem aval do congresso

Albuquerque também defendeu a possibilidade de fazer o leilão e assinar o acordo com a Petrobras sem o aval do Congresso. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem insistido que a palavra final sobre o acordo cabe aos parlamentares. Mas o ministro tem uma visão diferente.

— Eu tenho um diálogo aberto com o presidente da Câmara. Em nenhum momento ele contestou resoluções do CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) que aprovaram o acordo e o leilão. Ele não contestou. Se ele tivesse contestado uma resolução, seria outra coisa. Tem que ver em qual contexto o presidente da Câmara fala — disse o ministro, acrescentando: — Imagina só o presidente da Câmara dizer que a Petrobras, a renegociação do contrato dela, uma empresa de economia mista, listada na Bolsa de Nova York, tem que passar pelo Congresso. Se eu tenho ação, eu vendo. Leva insegurança.

Ele explicou que a partilha dos recursos com o pré-sal pode até ser alvo de análise pelo Congresso, mas não a revisão da cessão onerosa. — Há uma discussão, que já vem do passado, que é sobre para onde vai o dinheiro. Isso é uma questão fiscal (que não necessariamente) tem a ver com o leilão da cessão onerosa —acrescentou .

“É R$ 1 trilhão em 30 anos de arrecadação nos três níveis. Isso é dinheiro etemum efeito multiplicador”

Bento Albuquerque, ministro de Minas e Energia

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Modelo de venda da Eletrobras sai até junho

04/05/2019

 

 

Ministro de Minas e Energia diz que uma preocupação é evitar que estatal fique com apenas uma empresa

O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, trabalha para apresentar o modelo de privatização da Eletro brasem junho. Para ele, será possível concluir o processo ainda neste ano, depois que a estatal for capitalizada. Uma das preocupações dele é evitar que a Eletrobras vá para as mãos de apenas uma empresa, o que concentraria o mercado de eletricidade no país. —É preciso algumas ações estruturantes antes da capitalização. Mas acredito que a gente possa resolver isso em 2019. O modelo vai ficar pronto em junho. É um patrimônio que temos, e que nós temos que saber como utilizar em benefício da União —disse o ministro. A empresa é responsável por cerca de 30% da geração de energia do Brasil e metade do sistema de transmissão. — Você não pode botar isso na mão de uma só empresa. Olha o desbalanceamento que você dá no mercado se passar esses 30% de geração para alguém —afirmou. Outra preocupação é gerar valor para a Eletrobras antes da capitalização. P orisso, antes da operação, o governo terá que resolver problemas que hoje diminuem ova lorda estatal eque vão além da reestruturação pela qual a companhia passou nos últimos anos. O governo deve encontrar uma saída, por exemplo, para as usinas da Eletrobras que operam no sistema de cotas. Nele-, o pagamento pela energia gerada é tabelado, sem lucros para a empresa. Algumas das principais hidrelétricas da Eletrobras hoje operam dentro desse sistema, como Sobradinho (BA).

— Se você vai capitalizar uma empresa pujante, é uma coisa. Se vai capitalizar uma coisa que está capenga, é outra coisa. A União tem que pensar nisso. As empresas da Eletrobras têm hidrelétricas que estão submetidas ao regime de cotas. Será que esse regime de cotas é interessante para fazer a capitalização da empresa? —disse o ministro. No modelo de capitalização proposto pela gestão Michel Temer, o governo permite à Eletrobras retirar suas usinas desse regime em troca de um bônus de outorga bilionário para o Tesouro.

 

ENERGIA EM RORAIMA

Outra preocupação do MME, Roraima só deve ser interligado ao sistema nacional de energia em 2021. Única unidade da federação fora do sistema, o estado depende da eletricidade da Venezuela para se abastecer. Com a crise no país vizinho, a energia consumida no estado é gerada por usinas termelétricas a óleo, mais caras e poluentes.

A solução para isso será a construção de uma linha de transmissão de energia entre Manaus e Boa Vista. A obra não começou porque depende de autorização da Funai, uma vez que a linha passa por território indígena.

— A licença de instalação deve ocorrer no fim de junho. As obras começam no início do segundo semestre e ficam prontas em 2021. Vamos ter o leilão de energia renovável. Temos de prover para aquele estado a segurança energética que outros estados têm.