Valor econômico, v.19, n.4674, 23/01/2019. Brasil, p. A3

 

'Minha Casa' levou moradia a áreas distantes e sem estrutura, aponta FGV

Thais Carrança 

23/01/2019

 

 

O programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV) levou habitações para locais distantes dos centros urbanos e carentes de serviços públicos e empregos. Os casos mais graves ocorrem em São Luís e Belo Horizonte, aponta estudo realizado pelo Instituto Escolhas e pela FGV.

Foram analisados empreendimentos da faixa 1 do programa (para famílias com renda até R$ 1,6 mil) em 20 regiões metropolitanas. Os pesquisadores compararam imagens de satélite de 2005 (antes do programa) e de 2015 e constataram que a mancha urbana cresceu nessas regiões.

Segundo Martha Hiromoto, pesquisadora da FGV, o estudo definiu três formas de expansão da mancha urbana: o preenchimento, quando ocorre a ocupação de espaços vazios dentro das cidades, onde já há infraestrutura e oferta de serviços; a extensão (o crescimento das cidades pelas bordas, forma mais comum de expansão urbana); e o salto, que é a construção de edificações distantes do limite da mancha urbana.

"Identificamos que municípios que firmaram contratos com o MCMV dentro dessas 20 regiões metropolitanas tiveram maior incidência de salto urbano", disse Martha. Segundo ela, também foi identificado que, quanto maior o número de unidades contratadas nos municípios, mais salto urbano e menos preenchimento acontece.

"As piores situações estão em São Luís e Belo Horizonte", destaca a pesquisadora. Na capital maranhense, com 14,1 mil unidades georreferenciadas, 4,4 mil unidades foram construídas afastadas da mancha urbana. Já na capital mineira, de 6,6 mil unidades, 2,5 mil estão em regiões afastadas, sem infraestrutura.

Analisando a oferta de infraestrutura nessas regiões metropolitanas, o estudo constatou que, nos municípios com mais unidades do MCMV, a oferta de saneamento cresceu a taxas inferiores em relação a cidades com menos unidades.

Conforme Ciro Biderman, também da FGV, são duas as constatações principais do estudo. "A primeira é que metrópoles que fizeram menos, em geral fizeram melhor", diz ele, que cita como exemplos Salvador e Recife. Na primeira, com 21,9 mil unidades analisadas, 17,5 mil foram construídas nas margens da mancha urbana e 2,8 mil afastadas delas, em áreas isoladas. No Recife, com 2,2 mil unidades, 1,7 mil estavam nos limites urbanos, e 458, em áreas sem infraestrutura.

A segunda observação, segundo ele, é que conjuntos enormes acabam facilmente virando "guetos", muitas vezes controlados por milícias. "Para trazer pessoas para dentro das cidades, precisa de mais dinheiro ou fazer menos unidades."