Valor econômico, v.19 , n.4671 , 22/01/2019. Brasil, p. A4

 

Secretaria quer força-tarefa para vender 80 mil bens do tráfico

Isadora Peron

22/01/2019

 

 

Sob o comando de Sergio Moro, o Ministério da Justiça e Segurança Pública planeja uma "força-tarefa" para acelerar a venda de bens apreendidos de traficantes de drogas. Segundo o novo titular da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), Luiz Beggiora, hoje há um estoque de 80 mil itens, entre carros, imóveis e até aviões, dos quais 30 mil estão prontos para serem leiloados imediatamente.

"Nós vamos fazer uma força-tarefa para tentar alienar o máximo desses 30 mil bens neste ano. Não sei quantos desses vamos conseguir, mas haverá uma força-tarefa neste sentido", afirmou Beggiora.

De acordo com o secretário, a média anual de bens que são levados a leilão hoje é 1,2 mil, gerando uma arrecadação de cerca de R$ 6 milhões para os cofres públicos. Nesse ritmo, levaria 30 anos para liquidar o estoque já apto a ser vendido. Pelos planos de Beggiora, pelo menos um leilão será realizado nos primeiros cem dias de governo.

"Nesse período, a gente quer deixar tudo estruturado, todos os editais de leiloeiro prontos. Pretendemos realizar leilão já, a partir de fevereiro, março, para dar uma boa vazão nesse estoque", disse.

Os recursos levantados serão transferidos para a Polícia Federal e para as polícias civis estaduais, para que elas possam aumentar os investimentos. Não há, porém, uma estimativa ainda do valor que será arrecadado.

Beggiora destaca que é preciso dar celeridade para o processo, porque, hoje, um bem que é apreendido leva entre cinco e dez anos para ser vendido. A meta é que isso agora aconteça no primeiro ano da apreensão. "Imagine um carro novo. Se você deixá-lo sete anos num pátio, sem manutenção, o que vai acontecer? Vai virar sucata", diz.

Para acelerar o processo, a Senad pretende atuar em duas frentes. A primeira é conscientizar os juízes para que os leilões sejam realizados antes de os processos transitarem em julgado. Segundo ele, muitos juízes não realizam a alienação antecipada dos bens por medo de uma eventual reversão do processo. As estatísticas, no entanto, mostram que isso acontece em menos de 10% dos caso.

Para dar maior segurança jurídica aos magistrados, o ministério vai enviar um projeto de lei ao Congresso. Uma das propostas é que, se o bem for vendido antes do transitado em julgado, o valor será depositado em um conta judicial e renderá a taxa Selic. Caso a condenação seja revertida, o dinheiro será devolvido, já com a correção monetária. "Não haverá prejuízo, pelo contrário. Acredito que haverá interesse do próprio acusado que posteriormente conseguir reverter a decisão."

Outra proposta da Senad é criar um portal nacional para realização de leilões on-line. "A ideia é que uma pessoa que está lá no Pará possa comprar um bem que está lá no Rio Grande do Sul. Isso vai aumentar a publicidade e a eficiência da alienação, até para que se possa melhorar o preço, se tiver mais gente dando lances, a chance de aumentar o valor é maior", explica.

Em uma frente mais ampla, o secretário também espera entregar a Moro, neste início de governo, um modelo para a criação de uma agência de gestão e recuperação de ativos. De acordo com ele, o órgão, que já existe em países como França, Canadá e Estados Unidos, seria responsável por gerir os bens apreendidos em outras circunstâncias, como em casos de corrupção e organizações criminosas, e não apenas os relacionados ao combate ao tráfico de drogas.

"O que vai acontecer é que, desde o início do processo, o juiz já vai transferir a gestão desse bem apreendido para agência, e esta, por sua vez, pode fazer uma capitalização disso. Se for um imóvel, poderá locar. Fará toda a gestão desse patrimônio", diz.

Para dar mais eficiência ao novo papel da Senad, Beggiora conta também que toda a parte relacionada à assistência do dependente químico foi repassada ao Ministério da Cidadania.

Em relação a uma discussão mais ampla, sobre a descriminalização do uso de drogas, o novo secretário evita se manifestar e diz que este tema não está na pauta do governo. Ele afirma que a legislação não é clara sobre o que é tráfico e o que é consumo, e que esse é um debate para o Supremo Tribunal Federal (STF). "Essa questão não está na pauta da secretaria. A gente sabe que não tem intenção do governo de tratar disso neste momento. Vamos aguardar a posição do Supremo, para ver como o tribunal vai se posicionar", afirmou.

O STF deve retomar o julgamento sobre o tema em junho. Até agora, três ministros votaram a favor de descriminalizar o uso da maconha. O julgamento começou em 2015 e estava interrompido por um pedido de vista. Como o caso tem repercussão geral, o que for decidido agora pelos 11 integrantes da Corte terá efeito em todas as ações que tramitam na Justiça do país.