O Estado de São Paulo, n. 45790, 01/03/2019. Internacional, p. A12

 

Guaidó define volta à Venezuela, apesar de ameaças

Mariana Haubert

01/03/2019

 

 

Líder opositor visita países da região para aumentar pressão sobre Maduro, que considera sua saída ilegal e ameaça prendê-lo

Pressão. Bolsonaro recebe Juan Guaidó em Brasília: líder da oposição venezuelana faz giro pela América do Sul para isolar ainda mais regime de Maduro

Em declaração após encontro com o presidente Jair Bolsonaro, o líder da oposição venezuelana, Juan Guaidó, afirmou ontem que tem a intenção de voltar ao seu país até segunda-feira. Sua saída foi considerada ilegal pelo regime de Nicolás Maduro, que ameaçou prendê-lo se ele pisar na Venezuela.

Horas antes de receber Guaidó, Bolsonaro disse estar disposto a se encontrar com Maduro. “Se o Trump pode conversar com o Kim [Jong-un, ditador da Coreia do Norte], posso conversar com Maduro também”, disse Bolsonaro. As declarações foram dadas em um café da manhã com um grupo de 11 jornalistas. Foi a primeira vez que Bolsonaro atendeu a representantes de veículos de comunicação, escolhidos por ele. O Estado não foi convidado. As informações foram confirmadas pela assessoria de imprensa do Palácio.

No início da semana, Guaidó iniciou um giro por países da região. Antes de visitar o Brasil, ele passou pela Colômbia e amanhã irá ao Paraguai. Ontem, ele se encontrou em Brasília com Kimberly Breier, vice-secretária de Estado dos EUA para Assuntos do Hemisfério Ocidental.

Ontem, Guaidó admitiu ver riscos em sua volta, mas afirmou que a viagem é importante para “reunir apoio contra a ditadura e superar a crise”. A Assembleia Nacional, controlada pela oposição, aprovou uma licença para Guaidó permanecer no exterior que acaba na próxima segunda.

A reunião de ontem entre Guaidó e Bolsonaro ocorreu no Palácio do Planalto. O encontro foi visto como uma importante sinalização de que o Brasil continuará seguindo os esforços internacionais contra Maduro. Após a reunião, Guaidó e Bolsonaro fizeram uma declaração conjunta à imprensa e o venezuelano respondeu a perguntas de jornalistas.

Ele afirmou que a sua geração cresceu na ditadura chavista, mas hoje vê que existe esperança para mudar. “Não será o medo que vai nos paralisar. O regime de Maduro está tão fraco que tem apenas as armas. Vamos imaginar por um segundo esse regime sem armas. Já teríamos uma eleição livre, com garantias. O que Maduro quer é prender sua família em casa à força. E o povo sabe disso.”

Guaidó afirmou que a oposição venezuelana tenta negociar com Maduro a realização de eleições livres há cinco anos. Para ele, o regime cria um dilema entre “guerra e paz” e continua intransigente para negociar uma alternativa. “Não pode ser um falso diálogo”, disse.

Guaidó assegurou ainda que aceitará qualquer tipo de ajuda, até mesmo da China e da Rússia, dois dos maiores aliados internacionais de Maduro. Os dois países têm bilhões de dólares em negócios na Venezuela.

Bolsonaro prometeu ajudar o líder opositor a restabelecer a democracia, inclusive com ajuda financeira. O brasileiro, no entanto, ressaltou que as ações se pautarão pela legalidade e pelas tradições diplomáticas, em uma sinalização de que, por ora, uma intervenção armada não está nos planos.

Em uma crítica aos governos de Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, Bolsonaro afirmou que o apoio de dois expresidentes brasileiros ao chavismo contribuiu para a crise atual. Ele não citou nomes. O presidente também voltou repetir o discurso de sua campanha eleitoral, afirmando que o Brasil estava seguindo o mesmo caminho da Venezuela.

Autoproclamado presidente interino da Venezuela, Guaidó é reconhecido como a principal liderança venezuelana por mais de 50 países. Apesar de não ter sido recebido por Bolsonaro como chefe de Estado, sua visita contou com a segurança da Polícia Federal e dos batedores de trânsito da Aeronáutica. Ao chegar ao Palácio do Planalto, ele foi recebido pela guarda presidencial Dragões da Independência e com tapete vermelho.