Correio braziliense, n. 20448, 16/05/2019. Brasil, p. 8

 

Decreto das armas na mira do MPF

Marina Torres

16/05/2019

 

 

Segurança » Ação, assinada por cinco procuradores da República, pede a suspensão da norma que regulamenta o porte. Para o Ministério Público Federal, regra desrespeita o Estatuto do Desarmamento e coloca em risco os brasileiros

O Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação para suspender, imediatamente, o decreto que facilita o porte de armas no Brasil. Para o MPF, o decreto extrapola a regulamentação, desrespeita as regras previstas no Estatuto do Desarmamento e “coloca em risco a segurança pública de todos os brasileiros”. A ação, ajuizada ontem na 17ª Vara da Justiça Federal,  foi assinada por cinco procuradores da República.

Pelo menos oito quesitos são ressaltados como problemas na norma. A facilidade da compra das armas de fogo para um público classificado como grandioso e a validade por tempo indeterminado dos certificados de registro foram criticadas pelos procuradores. “Não poderia o presidente da República, por decreto, de modo genérico e permanente, dispensar a análise do requisito”, dizem na ação. Já o dispositivo que autoriza a prática de tiro esportivo por crianças e adolescentes é entendido como um “flagrante retrocesso à proteção genericamente conferida pela Constituição da República e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente”.

O documento sinaliza, ainda, que o aumento da comercialização das armas de fogo impactará por décadas o número de armas em circulação no país, por se tratar de um bem durável. “Muitas das armas vendidas no Brasil antes do Estatuto do Desarmamento, portanto, municiam os agentes do crime até hoje.”

Ex-secretário de segurança do Distrito Federal, Arthur Trindade apoia o pedido do Ministério Público. “Mais do que válida, a ação é necessária. O decreto extrapolou em muito os limites da lei. Ele altera condições, cria categorias e as amplia. O decreto mudou profundamente o Estatuto do Desarmamento, colocou de cabeça pra baixo e me parece até ser inconstitucional. Todos os pareceres que tenho acompanhado do Ministério da Justiça, do Ministério Público Federal e da Ordem dos Advogados do Brasil têm indicado isso,” afirma.

Controle

Ainda segundo o ex-secretário, o decreto, da maneira que está colocado, põe em risco a segurança pública. “Ampliaram absurdamente o número de pessoas que passarão a ter o direito a armas de fogo. Hoje são cerca de 36 mil pessoas que a Polícia Federal (PF) analisou e constatou a necessidade do porte. Com o decreto, esse filtro da PF seria retirado e ampliaria o número em 19 milhões.” Para ele, o decreto falha em não tratar do assunto que deveria ser considerado o principal. “O decreto não avança em nada o item mais importante, que seria a melhoria do controle de armas. É um item que mal saiu do papel. Está previsto, mas precisa ser trabalhado. O decreto de certa forma dá passos para trás,” opina.

A ação requer também que a União dê explicações sobre as informações que fundamentaram o decreto. Caso a suspensão total do regulamento não seja deferida, os procuradores requerem que a medida seja aplicada a, pelo menos, 10 artigos do decreto. Nesse caso, aqueles que, para o MPF, incidem em maior risco para a ordem social e jurídica do país.