O Estado de São Paulo, n. 45811, 22/03/2019. Política, p. A6

 

Defesa de Temer diz que prisão é uma 'barbaridade'

22/03/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

O advogado Eduardo Carnelós, que integra a defesa de Michel Temer, afirmou que a prisão do ex-presidente “é uma barbaridade”. Em nota divulgada na manhã de ontem, ele disse que há “total falta de fundamento para a prisão decretada” de seu cliente. “(A prisão) Serve apenas à exibição do expresidente como troféu aos que, a pretexto de combater a corrupção, escarnecem das regras básicas inscritas na Constituição da República e na legislação ordinária”, disse.

Carnelós ingressou ontem com pedido de habeas corpus no Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF-2). O recurso foi distribuído para o desembargador Ivan Athié. Carnelós, que assina a peça com o criminalista Roberto Soares, afirmou que Temer “nunca integrou organização criminosa”, como afirma o Ministério Público, e não “representa risco à ordem pública”.

O pedido do juiz Marcelo Bretas sustenta que a medida “se impõe, seja para garantir a ordem pública, como por conveniência da instrução criminal”.

Para os advogados de Temer, a liberdade do ex-presidente “não coloca em risco a instrução criminal, nem a aplicação da lei penal”. “(Temer) Teve sua prisão preventiva decretada, sem que se indicasse nenhum elemento concreto a justificála”, afirmam os advogados.

De acordo com os criminalistas, Bretas “preferiu ignorar os comandos legais e a partir das palavras de delator lançadas há muito, sobre fatos que teriam ocorrido por volta de 2014”. O juiz, de acordo com os advogados, buscou apontar “prova” de fatos tidos como criminosos e os indícios de autoria para, depois, afirmar a existência também dos requisitos para decretar a prisão preventiva.

Os advogados ainda lembram que o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, relator do inquérito dos portos em que Temer foi denunciado, determinou a abertura de diversas investigações em diferentes varas da Justiça. Eles afirmam que a decisão que mandou prender o emedebista “trata praticamente de todos os fatos elencados na decisão” de Barroso. “Não se pretende demonstrar que Michel Temer não praticou os crimes de que tratam os autos – embora ele não os tenha praticado, não é demais dizer –, pois nem sequer há ainda acusação contra ele.”

‘Perplexo’. O advogado Maurício Silva Leite, que defende o coronel João Baptista de Lima Filho, declarou estar “perplexo” e disse que a ProcuradoriaGeral da República já havia se manifestado sobre os mesmos fatos e concluído que não havia elementos para a prisão. “Dois meses depois, contrariando o entendimento da PGR, a prisão é decretada pela primeira instância, sem a existência de nenhum fato novo”, afirmou.

Defensor de Vanderlei de Natale, o advogado Fernando José da Costa afirmou que a prisão é “ilegal”, que não vincula seu cliente aos fatos apurados no Rio. “Sua empresa está sediada em São Paulo e jamais prestou serviços para a Eletronuclear.”

Os advogados Alexandre Sinigallia e Paola Forzenigo, que representam Carlos Alberto Costa, falaram em “medida repressiva”. “Nenhum fato novo surgiu e, mesmo assim, o Juízo de primeiro grau absurdamente reaviva a questão, demonstrando sanha punitiva.” O Grupo ÅF Consult disse que “auditorias independentes descartaram qualquer indício de irregularidades no contrato”. As defesas dos outros presos não foram localizadas./ LUIZ VASSALO, CONSTANÇA REZENDE, ROBERTA JANSEN e MATEUS FAGUNDES

'Troféu'

“(A prisão) serve apenas à exibição do ex-presidente como troféu aos que, a pretexto de combater a corrupção, escarnecem das regras básicas inscritas na Constituição da República e na legislação ordinária.”

Eduardo Carnelós

ADVOGADO DO EX-PRESIDENTE MICHEL TEMER

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Alegações antigas não podem justificar prisões. diz jurista

Marcelo Godoy

Mateus Fagundes

22/03/2019

 

 

Decisão de Bretas recebe críticas de especialistas, que apontam falhas; constitucionalista acha difícil habeas corpus

A decretação da prisão de Michel Temer despertou polêmica entre juristas e advogados. Em 46 páginas de sua decisão, o juiz Marcelo da Costa Bretas não cita nenhum fato recente cometido pelo ex-presidente para justificar a decretação de prisão. De fato, o pagamento teria acontecido em 2014 e os supostos atos para atrapalhar as investigações são de 2017 e 2018 e, envolvem diretamente, na maioria dos caos outros acusados e não o expresidente. Bretas justifica-se afirmando que a corrupção é crime extremamente grave. “O Supremo tem súmula afirmando que a gravidade abstrata de um crime não é motivo para a decretação da prisão”, afirmou o professor de Processo penal da Universidade de São Paulo (USP), Gustavo Badaró. “A contemporaneidade dos fatos é requisito em todos os tribunais para a prisão”, afirmou.

De acordo com ele, em toda a decisão de Bretas não há nada que justifique a decretação de prisão de Temer. “Alega-se que ele (o ex-presidente) usava sua influencia política para a prática de crimes. Isso cessou quando ele deixou a Presidência. Ele foi encontrado em casa, uma coisa grotesca”, afirmou.

Bretas, segundo ele, diz que a prisão é necessária para a manutenção da ordem pública, para a garantia da instrução penal e para a aplicação da lei penal – que são as possibilidade legais para a decretação da prisão preventiva –, mas sem apresentar nada concreto no caso atual. “Não se pode alegar fatos investigados em outros processos para justificar a decretação da prisão em outro inquérito”, disse Badaró.

A prisão preventiva é um dos quatro tipos de detenção previstos na lei penal brasileira. Ela é um instrumento cautelar executado pela Justiça quando há suspeitas de obstrução à Justiça ou destruição de provas, bem como quando há indícios de que se permanecer solto o suspeito pode continuar cometendo delito. Ela não tem um período mínimo nem máximo para durar.

O criminalista João Paulo Martinelli, doutor em direito penal, também considerou o pedido de prisão de Temer “vago de fundamentação”. Também para ele, a justificativa de “gravidade de delito” não é suficiente para sustentar o pedido de Bretas. “Uma prisão como esta não pode ocorrer por fatos pretéritos.” O advogado disse ter tentado identificar alguma forma de obstrução à Justiça, destruição de provas ou existência de um plano de folga, mas não conseguiu encontrar esta fundamentação no pedido de prisão do juiz federal Bretas. “Em caso contrário, a prisão pode ser revogada em breve”, comentou.

Um eventual habeas corpus de Temer deve ser tratado pelo desembargador Abel Gomes, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Ele é o relator dos processos da Lava Jato no Rio de Janeiro. Para Badaró, se o TRF-2 negar a liminar, certamente o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou STF devem pôr em liberdade o ex-presidente. “Não apresentaram nenhum prova de que os crimes estariam ainda sendo cometidos em 2019”, afirmou Badaró. De acordo com ele, Bretas não explicou ainda por que não decretou medidas alternativas á de prisão, como a proibição de viajar para o exterior ou o bloqueio de bens para impedir que Temer se desfaça de seu patrimônio.

Já a constitucionalista Vera Chemim avalia como difícil de um habeas corpus ser concedido a Temer no âmbito da primeira instância. “Se houver indícios de crimes graves, organização criminosa, ou de um esquema de lese o Estado, acho difícil de ser concedido.”

Falta de provas

“Não apresentaram nenhum prova de que os crimes estão ainda sendo cometidos em 2019. Também não se pode alegar fatos apurados em outros processos para justificar prisão em outro inquérito.”

Gustavo Badaró