O Estado de São Paulo, n. 45811, 22/03/2019. Política, p. A8

 

Ex-presidente é levado para PF no Rio

Roberta Jansen

Fabio Grellet

Pedro Venceslau

Fabio Leite

Julia Afonso

22/03/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Responsável pela ordem de prisão, o juiz federal Marcelo Bretas alega isonomia com Lula, que está em Curitiba, para não levar Temer a presídio

Prisão.Sob escolta, Temer chega à PF no Rio de Janeiro (à esq.); acima, celulares que o coronel Lima tentou esconder; manifestante solta rojão em frente à PF em São Paulo

O ex-presidente Michel Temer chegou às 18h40 de ontem à Superintendência da Polícia Federal no Rio, onde ficará preso por ordem do juiz Marcelo Bretas, da 7.ª Vara Federal Criminal do Rio. O magistrado havia determinado inicialmente que Temer fosse levado para a Unidade Prisional da Polícia Militar, em Niterói, onde está preso o ex-governador Luiz Fernando Pezão (MDB). Depois, atendeu a requerimento dos advogados do emedebista, segundo ele por uma questão de isonomia com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já condenado na Lava Jato.

“Entendo que o tratamento dado aos ex-presidentes deve ser isonômico, uma vez que o ex-presidente Lula está custodiado na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba”, justificou Bretas, ao analisar o pedido da defesa de Temer.

Em resposta à consulta de Bretas, o delegado Ricardo Andrade Saadi, superintendente regional da PF no Rio, afirmou que a sede da corporação tem “condições de custodiar, provisoriamente, o investigado Michel Miguel Elias Temer Lulia, em sala previamente preparada e segura, com cama, banheiro e chuveiro”.

Em Curitiba, Lula está preso em um espaço de quinze metros quadrados, com banheiro anexo e uma janela basculante. No quarto, há uma cama de solteiro, um armário e uma mesa com quatro cadeiras, além de uma TV de plasma que transmite apenas os canais abertos. O banheiro dispõe de pia, vaso sanitário e chuveiro elétrico.

Além de Temer, Bretas determinou a prisão de mais nove pessoas – entre elas, do ex-ministro Moreira Franco e do coronel reformado da Polícia Militar de São Paulo João Baptista Lima Filho, amigo pessoal do ex-presidente.

A previsão era que Moreira e coronel Lima fossem levados para a Unidade Prisional da Polícia Militar, em Niterói, município vizinho ao Rio – onde o regime é militar: os presos usam uniforme (camiseta branca e bermuda preta) e, toda sexta-feira, se perfilam para o hasteamento da Bandeira Nacional.

Além das prisões, Bretas autorizou agentes da PF a cumprir mandados de busca e apreensão de documentos em casas e escritórios em nome dos alvos da operação de ontem.

Era quase meio dia quando duas viaturas estacionaram em frente à casa de Temer, no Alto de Pinheiros, bairro nobre de São Paulo. Uma vizinha que caminhava na praça em frente e um segurança da rua foram chamados como testemunha. “Eles tocaram a campainha e mostraram o distintivo para a câmera de segurança”, contou a arquiteta Lúcia Carvalho.

Os agentes saíram do local por volta das 17h com dois malotes e uma caixa de madeira. Antes disso, às 14h, a advogada Luciana Temer, filha do ex-presidente, chegou ao local carregando uma mala. Ela não quis falar com a imprensa.

Temer foi preso por volta das 11h, quando supostamente estava a caminho de um encontro particular em seu escritório. Ele foi abordado por policiais federais dentro de seu carro a cerca de 700 metros de sua casa. Na rua, os agentes do Grupo de Pronta Intervenção (GPI), fortemente armados, comunicaram o ex-presidente sobre o mandado de prisão e a ordem de levá-lo para o Rio de Janeiro.

O emedebista, então, foi escoltado por viaturas descaracterizadas até a delegacia da PF no Aeroporto Internacional de Guarulhos, onde chegou por volta do meio-dia por um acesso restrito a autoridades. Às 15h45, ele deixou a delegacia pela porta dos fundos e embarcou em uma aeronave da PF com destino à capital fluminense.

Celulares. Já Moreira teve seu carro interceptado na avenida 20 de Janeiro, nas imediações do Aeroporto Tom Jobim, no Rio. A ação da polícia foi filmada e o vídeo circulou pelas redes sociais. Preso também ontem, coronel Lima tentou esconder dois celulares após a chegada da PF a sua casa em São Paulo. Ele disse aos agentes que estava passando mal e sentou no sofá da sala de sua residência. Quando se levantou, a PF encontrou os aparelhos embaixo de uma das almofadas

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Após o Planalto, plano incluía livro e filme

Pedro Venceslau

Fausto Macedo

22/036/2019

 

 

Ex-presidente mantinha rotina tranquila até a chegada da Polícia Federal

 

São Paulo. PF fez buscas e apreensões na casa de Temer

O ex-presidente Michel Temer percebeu ontem que seu dia seria atípico quando viu pela janela de sua casa, no Alto de Pinheiros, bairro nobre de São Paulo, que um pequeno grupo de jornalistas estava na calçada.

Fazia tempo que isso não acontecia. Falando por celular, ele comentou o fato com o marqueteiro Elsinho Mouco e o jornalista Márcio Freitas, ambos amigos que foram auxiliares nos tempos de Palácio do Planalto.

Rumores sobre uma possível ação da Polícia Federal já circulavam em grupos de WhatsApp desde o dia anterior, mas ninguém no entorno do emedebista imaginava que ele pudesse ser detido na rua por policiais fortemente armados a cerca de 700 metros de casa.

“A gente tinha uma reunião às 11 horas. A imprensa chegou na casa dele antes da Polícia Federal”, disse Mouco ao Estado. Ao questionar a motivação da prisão preventiva, o publicitário relatou que Temer tinha uma rotina absolutamente previsível desde que deixou o poder. Recebia visitas de autoridades, políticos, jornalistas e amigos em seu escritório, na Rua Pedroso Alvarenga, no Itaim. Era lá também que fazia longas reuniões com seus advogados para destrinchar os processos nos quais está envolvido.

O ex-presidente dizia para seus interlocutores com orgulho que continuava frequentando seus restaurantes preferidos sem ser hostilizado. Geralmente almoçava no La Tambouille da Avenida Nove de Julho, no Gero, na Rua Haddock Lobo, ou no Parigi, na Rua Amauri.

Segundo o colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo, Temer foi visto na terça-feira passada almoçando no Parigi com o empresário Toninho Abdalla. Na ocasião, cumprimentou e foi cumprimentado por vários clientes da casa.

Ontem, antes de ser preso, tinha agendado almoço com um velho amigo constitucionalista. “Ele estava absolutamente tranquilo, com um humor ótimo e levando a vida normalmente. Essa prisão me assustou”, disse o jurista Adilson Dallari, um dos mais próximos amigos do ex-presidente. Advogado constitucionalista, Temer não acreditava que seria preso. “Não há nenhuma justificativa para a prisão do Michel”, afirmou Dallari.

Em entrevista ao Estado em dezembro do ano passado, o expresidente foi questionado sobre a possibilidade de uma prisão preventiva após deixar o poder e perder o foro privilegiado.

“Não tenho a menor preocupação. Zero. Começou uma onda de que eu teria assinado o decreto (dos Portos) para favorecer uma empresa chamada Rodrimar. Mandaram uma certidão e essa empresa não é beneficiada. A rigor, o que deveria ter sido feito com esse inquérito?”, questionou na ocasião.

Planos. Segundo amigos, Temer tinha planos de escrever um romance, um livro sobre sua passagem pela Presidência da República e estava gravando com Elsinho Mouco um documentário chamado O Brasil de Temer. Ele ainda comentava com os mais próximos ter disposição para voltar a escrever livros sobre Direito Constitucional, sua especialidade.

Nos fins de semana viajava com a família para Tietê ou Itu, onde passou o carnaval em um condomínio. Temer tinha decidido sair de vez da política e recusou até um convite para reunião do MDB em Brasília. “Ele não falava em fazer política. Pelo contrário, dizia que já tinha cumprido sua missão, disse Dallari.