Valor econômico, v. 20 , n. 4766 , 06/06/2019. Política, p. A11

 

PEC que muda rito de medidas provisórias passa na Câmara

 

 

 

Raphael Di Cunto

Marcelo Ribeiro

06/06/2019

 

 

 

A Câmara dos Deputados aprovou ontem, em dois turnos, a proposta de emenda à Constituição (PEC) que altera o rito de tramitação das medidas provisórias (MPs), estabelecendo prazos para votação em cada uma das Casas e proibindo a inclusão de dispositivos com "matéria estranha" ao tema original da proposta (conhecidos como "jabutis").

O texto teve apoio de todos os partidos - foi aprovado com 394 votos a favor e nenhum contrário - e seguiu para votação no Senado Federal, que já tem acordo para confirmar a versão aprovada e promulgá-la. Por ser uma emenda à Constituição, o presidente Jair Bolsonaro não pode vetá-la.

A PEC altera os ritos de tramitação das MPs. Determina que a comissão mista, formada por deputados e senadores, terá quarenta dias para aprovar o parecer. A Câmara terá 40 dias para votar o texto em plenário. O Senado terá 30 dias para avaliar a MP e, se promover alterações, os deputados terão mais dez dias para decidir sobre as emendas feitas pelos senadores.

Em todos esses casos, os prazos só passam a contar a partir do segundo dia útil após a votação pela instância anterior - o que, portanto, ampliará um pouco o tempo de tramitação em relação ao que ocorre hoje, quando o Congresso tem 120 dias para decidir se transforma a MP em lei, a modifica ou a rejeita.

Se qualquer um desses prazos for desrespeitado, a proposta perderá a validade desde a data de sua edição e o Congresso votará um decreto legislativo para disciplinar os efeitos enquanto a proposta vigorou - as MPs deveriam ser usadas para casos "de relevância e urgência" e, por isso, tem força de lei a partir da sua publicação no "Diário Oficial da União".

Outra alteração é que as MPs só trancarão a pauta de plenário da Câmara e do Senado, impedindo a votação de outros projetos de lei, nos últimos 10 dias em que estiverem em cada Casa. Hoje as medidas provisórias tem prioridade desde que chegam a cada Casa. Projetos de lei complementar, PECs e projetos de lei ordinária com assunto que não pode ser tratado por MP (questões penais, por exemplo) não ficam impedidos de votação.

O texto também impede que o presidente, no mesmo ano, edite MPs "com matéria constante" de outra medida provisória que for rejeitada ou perder a validade. O termo dá mais abrangência a vedação - hoje é proibido reeditar uma MP derrubada, mas o governo costuma alterar alguns pontos e reencaminhá-la. Isso será proibido após a promulgação.

O projeto ainda determina que as MPs e os projetos oriundos delas não poderão conter "matéria estranha" ao tema ou que não for "vinculada a ele por afinidade, pertinência ou conexão". Embora o texto seja aberto e permita que o Congresso interprete de forma mais abrangente o que é ou não um jabuti, eventuais emendas poderão ser contestados na Justiça.

Atualmente, não há prazo para tramitação em cada uma das instâncias do Congresso, o que faz com que os senadores reclamem de receber o projeto muitas vezes em cima do prazo e não terem condições de alterá-lo - qualquer mudança feita pelos senadores deve ser confirmada ou rejeitada pelos deputados.

Foi o que ocorreu, recentemente, com as MPS da reforma administrativa do governo Bolsonaro, em que os senadores ficaram praticamente impedidos de decidir onde ficaria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) porque se não a proposta perderia a validade, e com a MP que alterava o Código Florestal (que, de fato, caducou).

A alteração exigirá atuação mais rápida do governo na comissão mista, que terá só 40 dias para aprovar o parecer - hoje, muitas vezes a comissão não foi nem instalada nesses 40 dias.

Relator da PEC, o deputado Walter Alves (MDB-RN) afirmou que as mudanças darão mais força ao Legislativo. "Todos os governos têm usado e abusado das medidas provisórias, então é importante estabelecer regras e prazos", disse. O projeto não terá validade para as MPs que estão em vigor até a promulgação.