Valor econômico, v.20 , n. 4766 , 06/06/2019. Empresas, p. B1

 

Exigência de aval para privatização divide o Supremo

 

 

 

Mariana Muniz

Luísa Martins 

 

 

 

Ao retomar o julgamento das liminares nas ações sobre a necessidade de autorização legislativa e processo licitatório para a venda de estatais e subsidiárias, ontem, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) ficou com o placar empatado. Por enquanto, dois ministros votaram para manter a decisão de Ricardo Lewandowski - que prevê o aval do Legislativo -, e dois ministros para suspendê-la.

O julgamento foi acompanhado de perto pelo presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, e pelo ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, que nesta semana visitou o gabinete de alguns integrantes da Corte para tratar do tema, considerado crucial para o governo Jair Bolsonaro.

O empate visto no segundo dia de julgamento das liminares confirma a tendência de que o placar será apertado no Supremo. A discussão será retomada hoje, quando devem apresentar suas manifestações os ministros Rosa Weber, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Dias Toffoli.

Relator das três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) que tratam sobre a necessidade ou não de autorização legislativa para privatizações, Lewandowski votou para confirmar a liminar dada por ele em junho de 2018. "Voto para referendar a liminar para conferir interpretação conforme de modo a afirmar que venda de ações de empresas públicas exige autorização legislativa, bem como prévia licitação pública, dispensada quando não importar em perda de controle acionário", disse o ministro.

A liminar de Lewandowski prevê ainda que deve haver lei específica para cada estatal (seja ela municipal, estadual ou federal) em casos de venda de mais de 50% de suas ações à iniciativa privada.

Ao longo de seu voto, o relator elogiou a Lei 9.491 (a chamada Lei das Privatizações), implementada durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, e lembrou que a norma ainda está em vigor. Para ele, o dispositivo estabelece uma série de procedimentos que devem ser adotados antes da licitação e privatização, o que demonstra transparência, já que submete o processo a uma série de outras condicionantes.

"Permitir a venda direta de ações em montante suficiente a perder o controle acionário de estatal poderia atentar contra a Constituição, que diz que todas as alienações devem ser realizadas mediante processo de licitação pública", reforçou.

A divergência foi aberta pelo ministro Alexandre de Moraes ao defender que o Estado pode vender subsidiárias sem autorização do Congresso, mas não perder o controle acionário da "empresa-mãe". Sua compreensão é a de que, se não há autorização legislativa específica, mas só genérica, para criar subsidiárias, o mesmo deve ocorrer na venda. "Entendimento contrário levaria à inconstitucionalidade imediata de todas as subsidiárias, já que nenhuma das que existem hoje no Brasil está amparada por lei específica."

O ministro sustentou que a única limitação que deve existir é para que o estado não perca o controle acionário da empresa principal.

Lewandowski foi acompanhado pelo ministro Edson Fachin, relator da ação que trata da venda da TAG, subsidiária da Petrobras. Em decisão liminar do último dia 24, a venda da empresa para o consórcio formado entre Engie e o fundo canadense CDPQ, por US$ 8,6 bilhões, foi suspensa sob a alegação de falta de licitação.

Último a votar, o ministro Luís Roberto Barroso acompanhou Moraes e disse que alienação de controle acionário de subsidiárias não exige autorização legislativa, nem licitação. "O Congresso Nacional tem circunstâncias políticas que não correspondem às necessidades econômicas da empresa. Há uma assimetria e penso que esta não é a melhor interpretação para a Constituição", afirmou.

Sobre a licitação, Barroso disse ser "equívoco supor que há um modelo carimbado e único para realizar o certame". Para o ministro, o que a Constituição diz é que a competição respeite os princípios da moralidade e da impessoalidade, delegando à administração pública a capacidade de fazer a melhor escolha de contrato.