Valor econômico, v. 20 , n. 4765 , 05/06/2019. Brasil, p. A2

 

Manifestação no Rio reúne defensores do Fundo Amazônia

 

 

 

Gabriel Vasconcelos

05/06/2019

 

 

 

Ambientalistas, funcionários do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), servidores de órgãos fiscalizadores como Ibama e ICMbio, representantes indígenas e políticos protestaram, ontem, no Rio, contra a investida do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, sobre o Fundo Amazônia. Salles manifestou, em entrevista publicada ontem pelo Valor, a intenção de mudar a estrutura de governança do fundo, o que foi comunicado em carta enviada às embaixadas da Noruega e Alemanha, na sexta-feira. O fundo acumula doações da ordem de US$ 1,2 bilhão, dos quais cerca de 94% vêm do governo norueguês.

Aos gritos de "Fora Salles", cerca de 500 pessoas se reuniram na porta do BNDES, no centro do Rio. Segundo os organizadores do ato, o foco da manifestação é defender a atual estrutura do Comitê Orientador (Cofa) do fundo, que toma as decisões sobre a aplicação de valores em projetos de economia sustentável e políticas antidesmatamento, a finalidade do fundo.

A direção do banco, que gere o fundo, determinou o fechamento das portas, obrigando o público a se reunir em frente ao pilotis do prédio. Houve discursos de técnicos do BNDES, representantes de ONGs como o Observatório do Clima e do ex-ministro do Meio Ambiente Carlos Minc (PSB). Seus antecessores no cargo, Marina Silva (Rede), com dengue, e Rubens Ricupero não foram ao ato, mas enviaram cartas de solidariedade, lidas ao público.

"O Salles quer o mesmo que fez com o Conama, em cuja governança a participação de ambientalistas sempre foi minoritária, mas significativa. Eles querem desfigurar a composição harmônica do fundo, para que vire uma espécie de carimbador das decisões deste governo, que nem sequer acredita em mudança climática ou preservação", disse Minc ao Valor.

Dois técnicos do fundo disseram que o ministro não convocou nenhuma reunião do Cofa neste ano e que ao menos cinco projetos preparados nem foram avaliados pela direção do BNDES. Com 103 projetos concluídos ou em execução, o fundo tem uma média de dez desembolsos por ano. Nos corredores do banco, fala-se que Salles deseja reduzir o número de integrantes do comitê de 23 para sete ou dez, fortalecendo o governo federal em detrimento da representação dos Estados da Amazônia Legal e da sociedade civil. Hoje, embora tenham quantidades diferentes de cadeiras no Cofa, o voto de cada bancada tem o mesmo peso nas decisões.

"É justamente essa participação equilibrada que dá legitimidade às resoluções junto aos países doadores. Sem isso, eles podem resgatar os valores ainda não empenhados e encerrar o fundo", disse uma técnica que preferiu não se identificar. A sensação entre os funcionários do banco ouvidos pela reportagem é de perseguição e intervenção do governo federal. "O que está acontecendo é o livro-texto da ingerência política na ala técnica do banco e do fundo", disse Arthur Koblitz, vice-presidente da Associação de Funcionários do BNDES.