Valor econômico, v.20 , n. 4765 , 05/06/2019. Política, p. A8

 

Bolsonaro flexibiliza código de trânsito

Carla Araújo

Marcelo Ribeiro

Raphael Di Cunto

05/06/2019

 

 

Entregue em mãos ontem ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o projeto de lei proposto pelo presidente Jair Bolsonaro com alterações no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) dobra o número de pontos para perder a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) - de 20 para 40 - e o prazo de validade do documento - de cinco para dez anos -, torna obrigatória a instalação de luzes diurnas nos novos carros, flexibiliza punições para quem não usar cadeirinhas para crianças e acaba com a obrigatoriedade do exame toxicológico para condutores profissionais (carteiras C,D e E). A proposta não tramitará em caráter de urgência.

Desde que assumiu o mandato, Bolsonaro vinha prometendo, além de um "combate a indústria de multas", rever leis que em sua visão prejudicam os brasileiros. O projeto prevê mudanças, inclusive, em uma infração já cometida pelo presidente ao andar de moto em abril no litoral paulista com o capacete mal colocado e com a viseira aberta. Atualmente, o CTB considera gravíssimo dirigir moto sem capacete. No texto proposto, cria-se uma infração alternativa, considerada média, para um condutor flagrado nesta situação.

Bolsonaro também propõe acabar com as multas por não usar cadeirinha no transporte de crianças. Apesar de definir que crianças até sete anos e meio devem ser "transportadas nos bancos traseiros com dispositivos de retenção adaptados ao peso e à idade" e aquelas entre sete anos e meio e dez não possam ir no banco da frente, o PL diz que "a violação será punida apenas com advertência". Hoje os motoristas flagrados sem o dispositivo respondem a infração gravíssima, com 7 pontos na carteira e multa de R$ 293,47. Segundo a Casa Civil, a mudança "busca um caráter mais educativo".

O governo argumenta ainda que hoje a norma é regulada pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran) e "o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou que o Contran não pode formular exigências dessa natureza". Segundo fonte do Executivo, quem recorria revertia a multa.

As alterações também determinam que os novos veículos tenham "luz de rodagem diurna". O cronograma será decidido depois.

A justificativa para acabar com a exigência do toxicológico dos motoristas profissionais é simplificar o procedimento de habilitação. Segundo o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, em alguns casos havia "dúvidas sobre a exatidão" dos testes. A obrigatoriedade foi incluída em 2015. A reprovação no exame, atualmente, tem como consequência a suspensão do direito de dirigir por três meses.

Até o fechamento desta edição, o governo federal não havia divulgado uma estimativa do impacto fiscal da proposta. Questionado sobre estudos de impacto econômico do projeto, o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, disse que não dispunha dessas informações. O dado também não consta da exposição de motivos apresentada ao Congresso. Consultados, o Ministério da Infraestrutura e especialistas apontavam a complexidade de mensurar esse impacto da medida, que envolve órgãos federais, dos Estados e do Distrito Federal.

O ministro rechaçou a possibilidade de o projeto atrapalhar o trâmite da reforma da Previdência e disse que a proposta "vai andar bem". A líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), afirmou que comissão especial será criada para analisar o texto em "40, 45 dias".

Já a vice-presidente da frente parlamentar pelo trânsito seguro, Christiane Yared (PR-PR), criticou o projeto e prevê um aumento nos acidentes. "Uma ideia é aumentar os pontos para perder a CNH apenas para os motoristas profissionais e não para toda a população", antecipou. Ela também afirmou que a carteira pode ter validade de dez anos, mas com exames a cada três e pagos "pelos planos de saúde".

Na conversa que teve com deputados no gabinete de Maia, Bolsonaro ressaltou que a proposta iria mexer com todos os brasileiros e, sem explicar as razões, ressaltou que ele vai também influenciar na economia.

Ao citar a proposta de ampliação do aumento de pontos na carteira, Bolsonaro afirmou que tem recomendado para as pessoas que são contra a mudança que conversem com taxistas e motoristas de caminhão. "Para quem vive no trânsito, às vezes, com um pequeno descuido perde a carteira de trabalho, na verdade", disse.

O presidente disse ainda aos congressistas que acredita que eles possam ter novas ideias para acrescentar ao projeto, mas ressaltou que o ideal para o Brasil é que se confie no cidadão sem que seja necessário leis para tudo. "Nós começamos a acreditar mais na população. Quanto mais leis tem um país, maior é o sinal de que não está indo no caminho certo", afirmou, ressaltando que o "povo tem mais consciência dos seus deveres".