Correio braziliense, n. 20442, 10/05/2019. Economia, p. 6

 

Capitalização não para em pé, diz relator

Rosana Hessel

Alessandra Azevedo

10/05/2019

 

 

Conjuntura » Parlamentar considera que é quase unânime posição de que sistema, só com contribuição do trabalhador, não passa. Nem mesmo economistas convidados a debater a reforma da Previdência se mostram favoráveis à medida

É cada vez menor a chance de a reforma da Previdência incluir a capitalização proposta pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. Na Comissão Especial que discute o tema, é raro que algum deputado defenda a ideia. Até o relator da matéria, Samuel Moreira (PSDB-SP), responsável por elaborar o parecer que será colocado em votação, considera a criação de contas individuais apenas com a contribuição dos trabalhadores inviável.

“Eu acho que há quase que uma unanimidade de que a capitalização, só com a contribuição do indivíduo, não para de pé”, comentou ontem, após a segunda audiência pública da comissão. Para ele, é preciso que seja garantido ao trabalhador que, ao chegar à idade de se aposentar, ele terá acesso aos recursos que investiu na poupança individual. Moreira não disse, entretanto, se incluirá participação das empresas ou do governo no parecer. Essa parte, segundo ele, ainda está sendo estudada.

Já o presidente do colegiado, Marcelo Ramos (PR-AM), descarta que o assunto vá para a frente, com ou sem cobrança dos empregadores. Ele coloca a capitalização na lista de itens que o Parlamento rejeita — junto das alterações no Benefício de Prestação Continuada (BPC) e na aposentadoria rural, por exemplo. “Acho difícil (que passe), pelo clima que existe aqui dentro”, disse. Se a proposta avançar nos moldes que o governo propõe, “teria a capitalização, mas teria desmoralização de uma série de lideranças” que já se posicionaram contra, explicou o deputado.

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 6/2019, que tem sido discutida pelos deputados, prevê a criação de um sistema de contas individuais para a Previdência, mas não obriga que as empresas contribuam para o custeio. No texto, há apenas a previsão de que elas também possam ser cobradas, o que tem sido alvo de reclamações por parte de vários parlamentares, não apenas da oposição. Os detalhes só seriam discutidos depois pelo Parlamento, em caso de aprovação da PEC.

Nem mesmo os quatro economistas convidados para participar do debate na Comissão Especial defenderam a capitalização. Na véspera, quando Guedes esteve lá para explicar a proposta, os deputados criticaram a falta de números sobre o verdadeiro custo da transição do regime atual, de repartição, para o de capitalização individual. O chefe da equipe econômica manteve o discurso de que o novo regime só poderá ser implementado se o impacto fiscal da proposta for preservado em quase sua totalidade, ou seja, acima de R$ 1 trilhão.

Cálculos

Especialistas em Previdência estimam um que o país precisaria investir R$ 12 trilhões, o equivalente a duas vezes o Produto Interno Bruto (PIB), ao longo de um período de 35 a 45 anos, para implementar o sistema de capitalização. Esses dados foram publicados pelo Correio e citados por parlamentares, como o líder da Oposição na Câmara, o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ). “Se um matemático criticou a fórmula do governo e não foi desmentido, isso quer dizer que a conta do governo está errada”, declarou.

O consultor legislativo do Senado, o economista Pedro Fernando Nery, é um defensor da reforma da Previdência, mas também criticou o sistema de capitalização individual, como sugerido pelo governo. Para ele, esse novo modelo poderá agravar os atuais problemas do sistema. Ele considera que a criação de um sistema de seguridade social destinado às crianças, uma espécie de ampliação de iniciativas como o programa Bolsa Família, deve ser considerada para a reforma.

O economista Paulo Tafner, pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) da Universidade de São Paulo (USP), lembrou ainda que o custo das aposentadorias do setor público são muito maiores do que o do privado. De acordo com levantamento da Instituição Fiscal Independente (IFI), a média das aposentadorias do Legislativo é quase 19 vezes superior à média paga pelos benefícios no RGPS. O acadêmico reforçou a importância da reforma para controlar o valor crescente dos gastos com a Previdência, que giram em torno de 14% do PIB atualmente, patamares muito elevados para um país com uma população ainda jovem se comparada com países da União Europeia.

“O deficit consolidado da Previdência no Brasil é de 5% do PIB, e a tendência é crescer. Somos um país jovem ainda, mas gastamos como um país envelhecido”, alertou Tafner, citando que, apenas em pensões, o gasto do país é igual ao da Itália, por exemplo.

Fora do prumo

Apesar de ser um país jovem, o gasto do Brasil com pensões é parecido com o de países com população mais idosa, o que torna inegável a necessidade de uma reforma da Previdência

Gasto com pensões

Dados de 2012 (em % do PIB)

Brasil    2,7

Itália    2,7

Grécia    2,4

Espanha    2,3

Alemanha    2,0

Portugal    1,8

França    1,7

Suíça    1,7

Reino Unido    0,1

Média 28 países da UE    1,6

*Obs: Esse dado no Brasil está em 5% do PIB, atualmente, mas os gastos totais com a Previdência Social, de forma geral, giram em torno de 14% do PIB, segundo analistas

Comparativo dos benefícios

Aposentadorias no serviço público chegam a quase 19 vezes da média do RGPS, de R$ 1,4 mil, conforme levantamento da IFI

Poder    Valor médio da aposentadoria em R$     Múltiplo RGPS

Executivo    8.478    6,0

Legislativo    26.823    18,5

Judiciário    18.065    12,7

MPU    14.656    10,3

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Promessa de apresentar Plano Mansueto

 

 

 

 

 

Rodolfo Costa

10/05/2019

 

 

As cobranças de executivos estaduais por mais recursos surtiram efeito. O ministro da Economia, Paulo Guedes, prometeu ontem a governadores do Nordeste apresentar, na semana que vem, o Plano Mansueto, programa que permitirá aos estados ter mais crédito para pagar funcionários, fornecedores e outras despesas. O encontro ocorreu no Palácio do Planalto, com a presença do presidente Jair Bolsonaro e do ministro-chefe da Secretaria de Governo, Santos Cruz. Os gestores estaduais cobraram, ainda, um Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) permanente e a retomada de obras.

Os governadores saíram com a promessa do governo de atender a quase todas as demandas. A única cobrança que deixou Bolsonaro calado foi o pedido de suspensão do contingenciamento dos recursos na educação, decisão que provocou o corte de 30% de verbas das universidades públicas. O encaminhamento do Plano Mansueto, entretanto, foi positivo. O texto de recuperação dos estados será apresentado na próxima semana, aos secretários estaduais de Fazenda. Depois disso, será encaminhado ao Congresso.

A minuta da matéria está pronta desde quarta-feira, quando 25 governadores e vice-governadores se reuniram com Bolsonaro. Guedes, no entanto, não participou do encontro. “Foi um avanço que obtivemos, porque ontem (quarta), não tínhamos resposta e hoje (quinta) saímos daqui com a promessa de que ele vai ser apresentado na semana que vem”, afirmou o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB).

O referido plano faz referência ao secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida. Em contrapartida ao encaminhamento da matéria ao Parlamento, o governo pediu a promoção de um ajuste fiscal que possibilite que a antecipação de recursos garanta o equilíbrio das contas públicas estaduais, afirmou o governador de Alagoas, Renan Filho (MDB).

Outro compromisso do governo é a apresentação do plano Waldery, em referência ao secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues. A ação prevê a partilha das novas receitas, como a cessão onerosa o bônus de receita. A conclusão de obras, sobretudo no setor habitacional, foi outra demanda que Bolsonaro se comprometeu a atender. “Essas obras são importantíssimas para garantir o desenvolvimento da nossa região”, analisou a governadora do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra.