O Estado de São Paulo, n. 45811, 22/03/2019. Economia, p. B3

 

Maia ameaça deixar articulação política da Previdência

Vera Rosa

Naira Trindade

22/03/2019

 

 

Irritado com posts de filho de Bolsonaro, presidente da Câmara ligou para Guedes e disse que vai abandonar a busca de votos para a reforma

Irritação. Dias antes, Maia havia sido chamado de ‘achacador’

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), avisou ontem ao ministro da Economia, Paulo Guedes, que deixará a articulação política pela reforma da Previdência. Maia tomou a decisão após ler mais um post do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), com fortes críticas a ele. Irritado, o deputado telefonou para Guedes e disse que, se é para ser atacado nas redes sociais por filhos e aliados de Bolsonaro, o governo não precisa de sua ajuda.

A ligação do presidente da Câmara para o titular da Economia foi presenciada por líderes de partidos do Centrão. Maia está irritado com a ofensiva contra ele nas redes, com a falta de articulação do Palácio do Planalto e com a tentativa do ministro da Justiça, Sergio Moro, de ganhar mais protagonismo na tramitação do pacote anticrime. “Eu estou aqui para ajudar, mas o governo não quer ajuda”, disse o presidente da Câmara, segundo deputados que estavam ao seu lado no momento do telefonema. “Eu sou a boa política, e não a velha política. Mas se acham que sou a velha, estou fora.”

Carlos Bolsonaro, o filho “zero dois” do presidente, compartilhou ontem nas redes a resposta de Moro à decisão de Maia de não dar prioridade agora ao projeto que prevê medidas para combater o crime organizado e a corrupção. “Há algo bem errado que não está certo!”, escreveu Carlos no Twitter. O texto acompanhava nota de Moro, divulgada na noite de quarta-feira, rebatendo ataques de Maia à sua insistência em apressar a tramitação do pacote. “Talvez alguns entendam que o combate ao crime pode ser adiado indefinidamente, mas o povo brasileiro não aguenta mais”, afirmou Moro. Além disso, no Instagram, Carlos lançou uma dúvida: “Por que o presidente da Câmara está tão nervoso?”.

Ao ler essas mensagens, Maia não se conteve, pois, dias antes, já havia sido chamado de “achacador”. A interlocutores, o deputado disse que não era possível ajudar a obter votos favoráveis ao governo nem mesmo construir a base aliada de Bolsonaro na Câmara sendo atacado desse jeito. Além disso, deputados e senadores do PSL – partido de Bolsonaro – comemoraram ontem a prisão do ex-presidente Michel Temer, que é do MDB, e houve quem associasse o presidente do PSDB, Geraldo Alckmin, ao Primeiro Comando da Capital (PCC) em São Paulo. Em conversas reservadas ao longo do dia, Maia disse não entender esses movimentos, que só afastam possíveis aliados do MDB e do PSDB.

Guedes procurou acalmar Maia. O presidente da Câmara tem fama de “temperamental” e há até mesmo entre seus amigos quem o esteja aconselhando a recuar da decisão de deixar a articulação pela reforma, da qual é o fiador na Câmara. Na prática, muitos bombeiros entraram em ação para apagar o novo incêndio político.

Bolsonaro foi, mais uma vez, aconselhado a conter seu filho para evitar uma crise em um momento no qual o governo precisa de votos para aprovar as mudanças nas regras da aposentadoria, consideradas fundamentais para o ajuste das contas públicas. No sábado, em um churrasco na casa de Maia, um interlocutor também já havia dito a Bolsonaro que ou ele dava “um basta” na guerra promovida nas redes sociais ou a situação ficaria complicada para o governo. O recado ali, como mostrou o Estado, foi o de que até mesmo ele poderia ser considerado avalista das agressões virtuais. Bolsonaro respondeu que não tinha como controlar seus milhões de seguidores.

Nos bastidores, o presidente da Câmara avalia que é o próprio Bolsonaro quem alimenta essas manifestações. Para Maia, ao não condenar a ofensiva de ódio na internet, Bolsonaro está desprezando o seu trabalho de articulador político para angariar votos favoráveis à reforma./ COLABORARAM MARIANA HAUBERT e CAMILA TURTELLI

Recado

“Eu sou a boa política, e não a velha política. Mas se acham que sou a velha, estou fora.”

Rodrigo Maia

PRESIDENTE DA CÂMARA EM CONVERSA TELEFÔNICA COM PAULO GUEDES

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Centrão rejeita relatoria da CCJ

22/03/2019

 

 

O envio da proposta de reforma da Previdência dos militares com compensações para a carreira foi o estopim para os deputados do Centrão deflagrarem uma ofensiva contra a articulação do governo. Em meio à crise, o Centrão decidiu rejeitar a relatoria da reforma da Previdência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e trabalha para barrar qualquer nome do bloco para o posto.

Segundo apurou o ‘Estadão/Broadcast’, lideranças do Centrão ligaram para o presidente da CCJ, deputado Felipe Francischini (PSL-PR), para pressioná-lo a designar um nome do próprio PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, ou até mesmo da oposição. Entre os cotados agora estão os deputados Bia Kicis e General Girão, ambos do PSL.

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Marinho defende proposta dos militares

Vinicius Neder

22/03/2019

 

 

O secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, Rogério Marinho, defendeu ontem a decisão do governo Jair Bolsonaro de incluir, junto da proposta de reforma da Previdência dos servidores das Forças Armadas, um projeto de reestruturação da carreira militar. Ao mesmo tempo, disse que “não há nenhuma margem” para tratar de reestruturação semelhante para qualquer outra carreira.

De acordo com o secretário, a reestruturação se justifica porque, nos últimos 20 anos, os militares foram a única carreira do serviço público federal que não passou por reestruturação de cargos e salários. Questionado se as corporações de outras categorias do serviço público federal não poderiam atuar junto aos parlamentares para incluírem reestruturações semelhantes junto à tramitação da proposta de emenda constitucional (PEC) da reforma da Previdência, Marinho disse que “pressão de corporações” sempre houve.

“O papel agora é do Congresso Nacional”, afirmou o secretário a jornalistas, pouco antes de participar da sessão de encerramento da a 53ª Convenção Nacional de Supermercados, promovida pela Associação Brasileira de Supermercados (Abras), no Rio. O secretário evitou estimar um prazo ideal para aprovar a PEC.

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Reforma de militar é um 'abacaxi', diz lider do PSL

Mariana Haubert

Camila Turtelli

22/03/2019

 

 

Deputado atribui adiamento de indicação de relator na CCJ a projeto que reduz peso de reforma para Forças Armadas

Líder do PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, o deputado delegado Waldir (GO) criticou duramente o projeto encaminhado pelo governo que trata da reestruturação das carreiras das Forças Armadas e da aposentadoria dos militares. “O governo nos mandou um abacaxi e não temos como descascá-lo com os dentes. É preciso nos dar a faca”, disse.

O deputado atribuiu a esse desgaste o adiamento da indicação do relator da reforma da Previdência geral na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O presidente do colegiado, Felipe Francischini (PSL-PR), havia dito que anunciaria o nome escolhido ontem, mas pela manhã o partido informou que aguardaria uma explicação do Ministério da Economia sobre o texto dos militares.

A principal crítica se dá à inclusão da reestruturação da carreira, que prevê reajuste de salários de algumas patentes militares, criação e ampliação de gratificações e extensão de um adicional de 10% a generais da reserva. A economia será de cerca de R$ 1 bilhão por ano. Waldir criticou parte do projeto. Segundo ele, era esperada uma economia muito maior com a proposta, que inclui mudanças nas regras previdenciárias, mas a reestruturação fez, na verdade, subir o gasto. A ideia inicial era que as mudanças pudessem trazer economia de R$ 97 bilhões. Porém, a reestruturação terá um custo de R$ 86,8 bilhões. O ganho fiscal líquido será de R$ 10,45 bilhões em dez anos.

Dificuldades. Para Waldir, o descontentamento do Congresso em relação ao texto ampliou as dificuldades do governo em angariar apoio para a aprovação da reforma da Previdência geral. Outro fator de ruído é a falta de diálogo do Executivo com os parlamentares. O deputado explicou que o PSL e outras siglas decidiram adiar a escolha do relator na CCJ porque os líderes precisam saber do governo se haverá “equidade” entre a categoria dos militares e as outras carreiras. “Esperamos que o governo envie equipes técnicas para explicar melhor a proposta e, assim, possamos prosseguir.”

“Não tive nenhum diálogo com representantes do governo sobre o projeto dos militares. Não participamos da festa, da construção dessa proposta. Meu gabinete está de portas abertas a qualquer horário”, disse. O deputado chegou a dizer, brincando, que teria de passar em uma delegacia para prestar queixa sobre a situação.

Para Waldir, será inevitável que a Câmara faça mudanças na proposta dos militares, se o próprio governo não pedir alterações. “Ou o governo faz as mudanças como queremos ou deixa a Câmara fazer. Nesse caso, ele tem de assumir que deu tratamento diferenciado a uma categoria.” O líder do PSL afirmou que, somente assim, o partido poderá entregar 54 votos a favor da reforma.

Apesar da cobrança por mais diálogo, Waldir avaliou que a ida do ministro da Economia, Paulo Guedes, à CCJ na semana que vem não é suficiente para apaziguar os ânimos dos parlamentares. Para ele, o ministro e a equipe econômica deveriam se empenhar mais para estabelecer uma relação com os líderes partidários.

Um grande problema

“O governo nos mandou um abacaxi e não temos como descascá-lo com os dentes. É preciso nos dar a faca.”

Delegado Waldir

LÍDER DO PSL NA CÂMARA DOS DEPUTADOS