Correio braziliense, n. 20442, 10/05/2019. Cidades, p. 17

 

Fraude de R$ 26 milhões atinge o Banco do Brasil

Isa Stacciarini

Alan Rios

10/05/2019

 

 

Operação » Esquema liderado por morador do Distrito Federal e ex-servidor da instituição financeira cobrava propina em operações para pagamento de débitos. Organização criminosa contava com a participação de empresas terceirizadas

 

 

 

 

Carros de luxo, vida de alto padrão, viagens e movimentação de moeda nacional e estrangeira. Esse era o estilo mantido pela maioria dos acusados de integrar um esquema fraudulento que causou rombo de R$ 26 milhões no Banco do Brasil. As investigações da Polícia Civil duraram cinco meses até resultar na prisão de 15 pessoas — duas seguem foragidas — e no cumprimento de 28 mandados de busca e apreensão. A Operação Crédito Viciado, da Divisão de Combate à Corrupção e aos Crimes contra a Administração Pública (Dicap), para desestruturar a quadrilha ocorreu ontem no Distrito Federal e em outras oito unidades da Federação.

Entre os envolvidos havia dois ex-servidores do Banco do Brasil e donos de 11 empresas terceirizadas que mantinham acordo com a instituição financeira para cobrar dívidas de clientes. A fraude acontecia da seguinte forma: quando os devedores quitavam os débitos com as agências, o banco pagava uma comissão automática para essas companhias.

Ocorre que, em alguns casos, os suspeitos faziam com que o sistema apresentasse erro, chamado de “recusa” na linguagem financeira, para poder repassar o dinheiro manualmente aos empresários. Assim, era entregue mais do que o valor da comissão.

Em contrapartida, o acordo era que os responsáveis dessas terceirizadas devolvessem aos servidores uma parte do dinheiro pago a mais como forma de propina. Policiais identificaram a movimentação de mais de R$ 15,7 milhões, bloqueados pela Justiça, mas acreditam que a fraude tenha gerado lucro de R$ 26 milhões aos envolvidos — dinheiro retirado do Banco do Brasil.

Ameaça a executivos

As investigações começaram em janeiro de 2019, após executivos do banco sofrerem ameaças por não renovar contratos com 117 terceirizadas de cobrança de dívidas. A intenção era de que o serviço de recuperação de débitos de clientes passasse a ser feito pela BB Tecnologia e Serviços (BBTS), mas funcionários e ex-servidores da instituição financeira começaram a passar informações internas para os autores das ameaças com objetivo de manter o contrato com as empresas de cobrança.

O banco, então, fez uma auditoria no pagamento das comissões às firmas e descobriu o esquema. Segundo o delegado responsável pela investigação, Wenderson Teles, ao suspeitar dos desvios, a instituição financeira demitiu o homem apontado como líder do esquema e cancelou os contratos com os envolvidos. “As ameaças aos executivos dos bancos foi comunicada à Polícia Civil e, a partir disso, fomos investigando, com a colaboração do banco”, explicou o titular da Dicap.

Em nota, o Banco do Brasil informou que “detectou os indícios de fraude por meio dos seus instrumentos de segurança” e que fez uma ocorrência à Polícia Civil. A instituição também respondeu que colabora com as investigações desde o início da operação.

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Aprendiz do crime

10/05/2019

 

 

 

 

O suspeito de atuar como líder do esquema é um morador do Distrito Federal e ex-funcionário do Banco do Brasil. Segundo a Polícia Civil, ele abandonou as práticas ilegais após alcançar um alto padrão de vida. E ensinou um parceiro a continuar cometendo os crimes. Os dois foram presos. O primeiro, em Brasília; e o aprendiz, em Goiás. Outro preso do DF é suspeito de lavagem de dinheiro.

O esquema rendeu tanto que se espalhou entre empresários de pelo menos oito estados (veja mapa). Mas a polícia ainda não sabe a frequência dos pagamentos de propina. “Não temos informação sobre se esse dinheiro era repassado por mês ou semanalmente. O que sabemos é que esse erro que levava ao pagamento manual era muito esporádico, mas, em 2017, aumentou vertiginosamente”, detalhou o delegado Wenderson.

A Dicap é ligada à Coordenação Especial de Repressão à Corrupção, ao Crime Organizado e aos Crimes contra a Administração Pública e contra a Ordem Tributária (Cecor). O chefe dessa última, delegado Leonardo de Castro, ressaltou que o material apreendido pode levar a outros envolvidos. “A investigação continuará. Esse inquérito deve ser finalizado e, se houver mais suspeitos, serão abertos outros para apuração”, adiantou.

Leilão

Com os suspeitos, policiais encontraram cerca de R$ 20 mil em moedas estrangeiras, 22 veículos de luxo, celulares e documentos. “Ao fim do processo, caso haja condenação, os veículos vão a leilão, e os valores podem ser revertidos para ressarcir o prejuízo do banco”, explicou Leonardo.

Os envolvidos vão responder pelos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa com aumento de pena em virtude da participação de servidores públicos. Dois deles estão foragidos. Somadas, as penas chegam a 30 anos de prisão.