Valor econômico, v.20, n.4775, 20/06/2019. Brasil, p. A5

 

Produtividade do trabalho cai no 1º tri 

Sergio Lamucci 

20/06/2019

 

 

A produtividade do trabalho voltou ao terreno negativo no primeiro trimestre deste ano, recuando 1,1% em relação ao mesmo período do ano passado. Nessa base de comparação, o indicador caiu 1,2% no setor de serviços e 1,2% também na indústria, nos dois casos um resultado pior do que no trimestre anterior. Na agropecuária, a produtividade por hora trabalhada cresceu 0,4% sobre igual intervalo de 2018, mas, apesar do número positivo, houve uma desaceleração expressiva comparado ao aumento de 2,8% do quarto trimestre do ano passado. Os cálculos são dos economistas Fernando Veloso, Silvia Matos e Paulo Peruchetti, pesquisadores do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV).

"No primeiro trimestre, o número de horas trabalhadas aumentou mais do que a produção [em relação ao mesmo trimestre de 2018]. Foram horas menos produtivas", diz Veloso. O economista chama a atenção para o mau desempenho do segmento de serviços. Concentrando 70% das horas trabalhadas na economia, o comportamento do setor é determinante para a produtividade do trabalho agregada na economia. Com a queda de 1,2% ocorrida de janeiro a março em relação aos primeiros três meses de 2018, o indicador do segmento de serviços encolheu pelo vigésimo trimestre consecutivo nessa base de comparação.

Veloso aponta os efeitos do aumento da informalidade para explicar a piora da produtividade no setor de serviços e também na construção civil, um segmento importante da indústria. Com a crise, aumentaram o emprego e as horas trabalhadas no setor informal, menos produtivo do que o formal. "São empresas que não têm muita escala, com menos capital físico, com funcionários de escolaridade menor, que usam tecnologias pouco avançadas", diz Veloso.

Além disso, a composição do emprego dentro do setor de serviços também tem sido desfavorável a segmentos mais eficientes, segundo ele. É o caso do ramo de atividades profissionais, voltadas a empresas. Já um dos segmentos com maior expansão é o de serviços pessoais, aqueles prestados a famílias - de menor produtividade.

Veloso destaca ainda que, num ambiente de grave crise econômica, houve um aumento de pessoas trabalhando por conta própria. Muitas pessoas abriram empresas como um mecanismo de sobrevivência. num momento muito ruim do mercado de trabalho. "Isso impediu que o desemprego fosse ainda maior, mas agravou o quadro de proliferação de pequenas empresas, pouco o produtivas", diz.

No acumulado em quatro trimestres até março deste ano, a produtividade por hora trabalhada no setor de serviços está negativa em 0,8%. Por essa métrica, o indicador está no vermelho desde o terceiro trimestre de 2014. No caso do agregado na economia, a produtividade do trabalho recuou 0,3% no acumulado dos últimos quatro trimestres. Em 2017, houve um aumento de 0,9%, sugerindo uma recuperação dos ganhos de eficiência, movimento que perdeu força ao longo de 2018 - no ano passado, a produtividade do trabalho caiu 0,1%, nos cálculos dos economistas do Ibre/FGV, que comparam o valor adicionado das Contas Nacionais com as horas trabalhadas da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, ambas do IBGE. O valor adicionado mostra o quanto cada atividade agrega aos bens e serviços consumidos no processo produtivo.

A produtividade do trabalho na indústria no primeiro trimestre também teve um desempenho ruim. Houve uma queda de 1,2% na comparação com o mesmo trimestre do ano anterior, interrompeu uma sequência de 12 trimestres consecutivos de alta no setor. "A produtividade da indústria já havia dado sinais de que estava perdendo fôlego desde o início de 2018, dado que a sua taxa de crescimento havia diminuído de 2% no primeiro trimestre de 2018 para 0,9% no quarto trimestre", diz o texto de Veloso, Silvia e Peruchetti. Na agropecuária, a produtividade também perdeu gás, mas ainda ficou no azul no primeiro trimestre, com alta de 0,4%.

Além do efeito da maior informalidade sobre a eficiência no trabalho, Veloso destaca dois outros problemas. O primeiro é uma questão estrutural, causada pelo ambiente hostil aos negócios, com muita intervenção estatal na economia e um sistema tributário complexo, que fez a produtividade crescer pouco, em torno de 0,5% ao ano desde a década de 1980.

O outro é o efeito das políticas adotadas entre 2007 e 2015, caso de muitos investimentos malfeitos - como em refinarias de petróleo - e do salto do crédito direcionado na economia. Essa má alocação de recursos tem um impacto negativo sobre a produtividade do capital e também sobre a do trabalho, segundo Veloso.

Nesse cenário, ele aponta o grande desafio da economia brasileira. Com o fim do bônus demográfico (o período em que a população em idade ativa cresce acima da população total) e sem um boom de commodities, o aumento da renda per capita vai depender exclusivamente da evolução da produtividade. "O nosso problema crônico, a produtividade, é que vai determinar o crescimento, e ela tem sido muito baixa", diz Veloso. "O longo prazo chegou."