O Estado de São Paulo, n. 45810, 21/03/2019. Economia, p. B3

 

Benefício rural e BPC são pontos sensíveis

Amanda Martimon

Elma Assis

Rodrigo Zuquin

21/03/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Levantamento do ‘Estado’ mostra que esses dois itens têm a maior rejeição dos parlamentares na proposta apresentada pelo governo

Guedes declarou que mudanças no BPC facilitaria a aprovação da proposta

Os dois pilares da reforma da Previdência – idade mínima e transição para os trabalhadores da ativa – são os pontos que contam com mais apoio dos deputados, segundo levantamento feito pelo ‘Estado’. Mais de 100 deles disseram ser favoráveis à fixação das idades de 65 anos (homens) e 62 anos (mulheres) e às três regras de transição para aposentadoria por tempo de contribuição.

Os itens de maior rejeição são as novas regras para a aposentadoria rural e para o pagamento do benefício assistencial a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, o chamado BPC (Benefício de Prestação Continuada). Nesses dois pontos, o número de deputados contrários ultrapassou a marca de 200.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criticou nesta semana as mudanças no BPC. Segundo ele, o governo criou uma “confusão desnecessária” ao incluir o tema na reforma, uma vez que a medida é polêmica e traz pouca economia.

Hoje, idosos em situação de pobreza recebem benefício de um salário mínimo a partir de 65 anos. O mesmo é pago a pessoas com deficiência. Pela proposta, haveria pagamento de R$ 400 para idosos a partir de 60 anos. Aos 70 anos, o benefício atingiria um salário mínimo.

Apenas 46 deputados disseram que votariam a favor das mudanças no BPC; 218 disseram ser contrários; e 249 preferiram não opinar. Até parte dos “governistas-raiz” defende a alteração desse ponto, e o governo já indicou que vai negociar.

Em entrevista ao Estado, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que uma mudança nesse item facilitaria a aprovação da proposta. Para ele, com 62 anos para o recebimento inicial e 68 anos para atingir um salário mínimo, e elevando o valor de partida para R$ 500 ou R$ 600, a medida “passa”.

No campo. O ponto com maior rejeição entre os deputados são as mudanças nas regras para a aposentadoria do trabalhador rural. Pelo levantamento, 219 deputados disseram que votariam contra a proposta de aumentar para 60 anos a idade mínima, para mulheres e homens do campo, com exigência de 20 anos de tempo mínimo de contribuição.

Hoje, o trabalhador rural pode se aposentar com idade mínima de 55 anos (mulheres) e 60 anos (homens), com 15 anos de tempo mínimo de contribuição. Outros 57 deputados disseram ser favoráveis às novas exigências; 237 não quiseram se posicionar.

Já o ponto da proposta com mais adesão são as três opções de regras de transição na aposentadoria por tempo de contribuição. Elas têm o apoio de 108 deputados. Outros 141 congressistas disseram ser contra as regras para quem está no mercado de trabalho. Nesse item, 264 preferiram não declarar o voto. A fixação das idades mínimas tem apoio de 100 deputados. Outros 164 deputados afirmam que votariam contra esses parâmetros e 249 não quiseram responder.

Atualmente, é possível se aposentar de duas formas: por idade 60 anos (mulheres) e 65 anos (homens), com contribuição mínima de 15 anos. Também há a aposentadoria por tempo de contribuição, sem previsão de idade mínima, mas com exigência de tempo mínimo de tempo de contribuição de 30 anos (mulheres) e 35 anos (homens).

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Comissão da reforma terá líder tucano

Naira Trindade

21/03/2019

 

 

Em uma jogada ensaiada com o ministro da Economia, Paulo Guedes, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, vai oficializar nos próximos dias o nome do deputado Eduardo Cury (PSDB-SP) como relator da reforma da Previdência na comissão especial que trata o assunto na Câmara. Quando a proposta do ex-presidente Michel Temer estava na Câmara, ele não quis responder ao levantamento do Estado como votaria.

A escolha de Cury ao posto que ganhará muita relevância nos próximos meses é do próprio secretário da Previdência, Rogério Marinho. Filiados ao PSDB, Marinho e Cury se aproximaram ainda na Câmara, onde trabalharam juntos os últimos quatro anos.

A aliados do Centrão, Maia havia demonstrado resistência em indicar o tucano à relatoria da PEC 6/2019. A ideia inicial de Maia era encontrar um nome de consenso nesse bloco que atuou unido durante a campanha presidencial. Entre as principais opções estava o nome de Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).

Após uma série de reuniões, Maia foi convencido por Marinho e Guedes a ceder. Ribeiro, porém, passa a ser cotado para a cadeira de relator da proposta da reforma da Previdência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.

Deputado reeleito, Cury foi prefeito de São José dos Campos (SP) de 2005 a 2012. É formado em engenharia industrial mecânica.

Há três semanas cotado para assumir a relatoria da Previdência, já vinha estudando o texto da matéria. Cury terá nas mãos a missão de convencer os deputados a aprovarem o texto que propor. Dentro do seu partido, o PSDB, sabe que não tem maioria definida em torno do texto apresentado pelo governo, mas já demonstrou a aliados estar disposto a iniciar o diálogo.

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Análise: Reforma depende de ação rápida de coordenação política

Adriana Fernandes

21/03/2019

 

 

A aprovação da reforma da Previdência do presidente Jair Bolsonaro pelo Congresso Nacional está a caminho, mas uma votação rápida da proposta, com a preservação da maior economia possível de despesas, dependerá de uma ação rápida de coordenação política para afastar os pontos mais polêmicos que já contaminam o ambiente ainda favorável ao endurecimento nas regras de aposentadoria e pensão.

Como mostrou levantamento do Estado, dos 212 deputados que afirmaram serem contrários ao texto, 119 mudariam os votos caso haja alterações no texto.

O governo precisará retirar os “bodes da sala”, principalmente os artigos do texto da proposta que alteram as regras do benefício para idosos e pessoas com deficiência de baixa renda (BPC) e da aposentadoria dos trabalhadores rurais.

Por ora, o ingrediente adicional e mais perigoso para a aprovação da reforma, sem dúvida nenhuma, fica por conta do projeto de lei que reestrutura a carreira dos militares, aumenta o soldo (parte principal do salário) dos militares e garante a incorporação nas remunerações de gratificações a generais, inclusive os que já estão na reserva. Essa medida pode beneficiar, inclusive, ministros do governo Bolsonaro, além do vicepresidente Hamilton Mourão.

Polêmico, o projeto foi recebido com desconfiança até mesmo pelos aliados mais próximos de Bolsonaro. É gritante o erro de timing político de misturar aumento de remuneração para os militares, mesmo que depois de um período de mais de 19 anos de achatamento salarial, no momento em que o governo pede sacrifício a todos os brasileiros com a reforma. O custo é alto com a reestruturação e o governo terá de tirar dinheiro de outras áreas para pagar.

Na esteira da proposta, o risco maior é de o governo aumentar as resistências à reforma em vez de juntar apoio.

A parte de reestruturação dos salários, incluída no texto, tem tudo para ser retirada do projeto, assim como o BPC e as modificações na aposentadoria rural. A questão é saber qual o grau de perigo para a reforma como um todo, se isso acontecer.

A batalha até a votação não está ganha e será mais difícil do que o time de Bolsonaro contava depois da expressiva vitória eleitoral. Pelo contrário, os dados revelam que o governo terá de ceder. A desidratação é certa e o R$ 1 trilhão de economia que o ministro da Economia, Paulo Guedes, quer garantir não se sustenta.

Uma reforma muito branda não resolveria o problema da sustentabilidade das contas públicas.

A boa notícia do levantamento é que em pontos-chave como a fixação de idades mínimas e as regras de transição a rejeição é menor. Um avanço e tanto.