Valor econômico, v.20 , n. 4799 , 26/06/2019. junho, p. A6

 

Mídia britânica destaca política externa 'bolsonariana'

 

 

 

26/06/2019

 

 

A nova dinâmica da diplomacia, sob o comando do chanceler Ernesto Araújo, foi objeto de reportagens de dois jornais britânicos, o "Financial Times" e o "Guardian". Em entrevista ao "Financial Times", Araújo destaca que o Brasil tem hoje convergência de pensamentos e formas de ver o mundo que aproximam o governo de Jair Bolsonaro com a "América de Donald Trump e a Israel de Binyamin Netanyahu". Já o "Guardian" mostra o temor de tradicionais diplomatas brasileiros com os efeitos da "revolução bolsonariana na política externa".

Na entrevista, o chanceler defende a aproximação com os EUA. "Temos muitas coisas em comum em nossa visão e estamos muito abertos a trabalhar uns com os outros por causa da ideia compartilhada de soberania, identidade nacional e como se comportar no mundo."

O jornal "Financial Times" destaca o entendimento de Araújo de que o triunfo das democracias ocidentais está basicamente relacionado à emergência de valores cristãos. Para o ministro, tais valores "devem estar de volta ao centro de como vemos o mundo".

Segundo a reportagem, o Ministério das Relações Exteriores sob Araújo mudou o foco da política externa e prega o alinhamento a governos de direita conservadores e nacionalistas dos EUA e da Europa. O jornal destaca o contraste do pensamento de Araújo com a linha de neutralidade que vinha sendo aplicada pelo Itamaraty na política externa.

Uma fonte do Itamaraty afirma ao jornal que o chanceler é uma figura lamentável e que causa vergonha. A mesma fonte, não identificada, diz ainda que Araújo, durante sua carreira, nunca havia manifestado essas opiniões e que a grande dúvida entre integrantes do ministério é se ele seria um oportunista ou se de fato acredita no que tem pregado.

O "Guardian" aborda o desgosto e desânimo de integrantes do Itamaraty com a visão de política externa do governo. Segundo o texto, muitos diplomatas temem que a "revolução bolsonariana na política externa" possa prejudicar a posição do Brasil no mundo.

Ex-embaixador brasileiro nos Estados Unidos, Rubens Ricupero disse ao jornal que sente "desgosto" e que há, no corpo diplomático, "quase uma completa rejeição ao ministro e às diretrizes atuais". Já Roberto Abdenur, ex-embaixador na China, Alemanha e EUA, afirmou que "nossas relações exteriores atuais levam o Brasil de volta a um período da história em que o país nem mesmo existia: a Idade Média". Marcos Azambuja, ex-secretário-geral do Itamaraty, disse não imaginar que este tipo de guinada pudesse ocorrer na diplomacia brasileira. "Houve uma mudança - e temo que seja para pior."

A reportagem avalia algumas das principais mudanças nas relações internacionais do Brasil sob o comando de Araújo, como o surgimento de desavenças em relação à China, principal parceiro comercial do país.