Valor econômico, v. 20 , n. 4781 , 28/06/2019. Brasil, p. A2

 

Modelo de voto na UE pode frear acordo com Mercosul

 

 

 

 

Humberto Saccomandi

28/06/2019

 

 

 

O governo brasileiro reagiu agressivamente à crítica de Angela Merkel à política ambiental do Brasil. Isso pode também ameaçar a aprovação do acordo comercial UE-Mercosul, cujos termos finais estão para ser fechados - podendo ser anunciados hoje, disse ao Valor o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker.

O presidente Jair Bolsonaro disse que não foi ao G-20 para ser advertido, após Merkel ter chamado de dramática a situação ambiental no Brasil e ter dito que trataria do tema com Bolsonaro no G-20. Já o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, sem diplomacia, mandou países que criticam o Brasil "procurarem sua turma".

Mas essa turma a que o general se refere é a mesma turma que terá de aprovar o acordo UE-Mercosul.

O acordo vem sendo negociado, do lado europeu, pela Comissão Europeia, o órgão executivo da UE. Concluída a negociação, há ainda um longo caminho na UE para que ele entre em vigor.

Primeiro, o acordo negociado precisa passar pelo Conselho Europeu, o órgão que reúne os líderes dos 28 países-membros da UE. O conselho então encaminha o acordo para aprovação pelo Parlamento Europeu. Em seguida, o acordo precisa ser aprovado pelos Parlamentos nacionais de todos os países da UE e por meia dúzia de Parlamentos regionais.

Esse processo é politicamente muito complicado. O acordo UE-Canadá por pouco não foi rejeitado na Bélgica.

Os partidos verdes participam de alguns governos na UE, como na Dinamarca e na Suécia. Além disso, têm bancadas expressivas em muitos Parlamentos nacionais e no Parlamento Europeu. Além dos verdes, o tema ambiental é importante para outros grupos políticos na Europa, inclusive para o movimento do presidente francês, Emmanuel Macron, que se vê como uma espécie de guardião do Acordo de Paris sobre o clima.

As críticas de Merkel foram feitas em resposta a uma pergunta no Parlamento alemão sobre as negociações com o Mercosul. Claramente, para os políticos europeus, o acordo comercial e as questões ambientais estão interligados.

Não está claro se os europeus pedirão alguma contrapartida ambiental ao Brasil, para facilitar a aprovação do acordo UE-Mercosul, mas é bem provável. Merkel foi cobrada por isso no Parlamento alemão. Possivelmente é esse recado que ela dará ao presidente Bolsonaro.

Mandar a premiê alemã "procurar sua turma", como fez Heleno, pode inviabilizar o acordo comercial mais importante já negociado pelo Brasil. (Colaborou Assis Moreira, de Osaka)