Valor econômico, v. 20, n. 4781, 28/06/2019. Especial, p.F2

 

Origem social é o fator de maior impacto

 

Jacilio Saraiva

28/06/2019

 

 

A origem social é o fator de maior influência nas desigualdades de desempenho entre estudantes. Essa é uma das conclusões da pesquisa "Educação, pobreza e desigualdades", desenvolvida pelo Observatório Sociológico Família-Escola (OSFE), da faculdade de educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), dentro do projeto Rede de Grupos de Pesquisa em Educação e Desigualdades, apoiado pela Fundação Tide Setubal. "O nosso objetivo foi apresentar experiências que tratam das relações entre educação e desigualdades e inspirar políticas públicas e iniciativas da sociedade civil", explica a professora Maria Alice Nogueira, da UFMG, uma das responsáveis pelo estudo.

O levantamento teve foco em informações sobre as camadas mais vulneráveis da população, em níveis elementares do sistema de ensino, entre 1996 e 2017. Como fonte, usou 180 obras em três línguas (inglês, francês e português), inclusive o Educational Resources Information Center (Eric), banco de dados patrocinado pelo Departamento de Educação dos Estados Unidos; e o Persée, portal francês criado para difundir publicações digitais acadêmicas.

Em português, a pesquisa contemplou nove periódicos nacionais, como a Revista Brasileira de Educação. "Além disso, foram incluídos 14 relatórios realizados por seis ONGs internacionais, que abordam programas de intervenção na relação entre educação escolar e vulnerabilidade social", explica a professora Tânia Resende, também envolvida no projeto.

As professoras dividiram o conteúdo em oito eixos temáticos, como educação infantil, políticas de combate à evasão escolar e experiências de parcerias entre escolas, famílias e comunidades. "Descobrimos que a desigualdade educacional pode começar antes do jardim da infância", diz a pesquisadora Viviane Ramos.

"Descobrimos que a desigualdade educacional pode começar antes do jardim da infância" Viviane Ramos, do Observatório Sociológico Família-Escola

Em um dos estudos, a análise mostra como a desigualdade na distribuição de renda afeta o rendimento dos estudantes. Jovens de 15 anos de 41 países fizeram testes de matemática, leitura e ciências. Ao final, a correção mostrou que alunos com notas altas em todas as disciplinas tinham mais recursos em seus países, escolas e famílias. Já os estudantes de locais de alta desigualdade econômica ou com distribuição desigual de professores certificados saíram das provas com as médias mais baixas.

"Há novos comportamentos entre as famílias sobre como vão investir na educação dos filhos", diz Maria Alice. "O destino que os pais fazem de um investimento na educação também está relacionado com o meio social onde vivem". Hoje há crianças que já aprendem matemática em escolas trilíngues.

As especialistas também destacam que o aumento da desigualdade de renda nas últimas décadas acontece em paralelo à queda do desempenho dos jovens na escola. Um dos documentos indica que a diferença de performance escolar entre integrantes de famílias de renda alta e baixa é cerca de 30% a 40% maior entre as crianças nascidas em 2001 do que entre as que nasceram 25 anos antes. "A renda familiar é hoje quase tão importante no desempenho dos filhos quanto a educação parental."

No Brasil, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) e o Censo Escolar indicam que 3,8 milhões de crianças e jovens de 4 a 17 anos não frequentavam a escola em 2010, principalmente os mais pobres, negros ou que viviam no campo. O aporte para inseri-los no sistema foi estimado em R$ 11,8 bilhões anuais.