Valor econômico, v. 20, n. 4777 , 22/06/2019. Política, p. A6

 

Estudo mostra Brasil em 2º na AL contra a corrupção

 

 

 

Fernando Exman

22/06/2019

 

 

 

Atrás apenas do Chile, o Brasil alcançou a segunda posição no mais recente índice que busca medir a capacidade dos países da América Latina e do Caribe de combater a corrupção. Também passaram pelo escrutínio Colômbia, que ficou virtualmente empatada com Argentina, ambas seguidas de Peru, México, Guatemala e Venezuela.

Obtido com exclusividade no Brasil pelo Valor, o "Índice de Capacidade de Combate à Corrupção (CCC)" elenca os avanços estruturais em instituições e instrumentos de combate a malfeitos que garantiram essa posição ao Brasil. Por outro lado, o relatório aponta as fragilidades e os desafios a serem enfrentados para se evitar retrocessos.

O Brasil destacou-se pela sua capacidade legal. Ou seja, a independência do seu sistema judicial e de órgãos anticorrupção, seu nível de capacidade de combate a crimes de colarinho branco, o estabelecimento de canais de cooperação internacional e o uso de instrumentos de colaboração premiada e acordos de leniência. No entanto, o desempenho do país foi prejudicado pelas dificuldades de se aplicar as regras de financiamento de campanhas eleitorais, a fragmentação partidária e fragilidades nos processos legislativo e decisório.

O índice, lançado hoje,terá periodicidade anual, é resultado de uma parceria entre o Americas Society/Council of the Americas (AS/COA) e a consultoria Control Risks. A seleção dos países foi feita em função do peso destes no Produto Interno Bruto (PIB) da região, que "tem atualmente dez ex-presidentes denunciados ou condenados por atos de corrupção", como destaca o documento.

O diretor sênior de política do Council of the Americas, Roberto Simon, cita como riscos as atuais denúncias de potenciais abusos judiciais e eventuais desconfianças da população em relação a quem liderou o processo de combate à corrupção. Além disso, registra movimentos da classe política para barrar as ferramentas já adotadas na área, o que até agora vem sendo impedido pela mobilização popular.

"A gente está num momento importante em que temos enormes desafios. A trajetória é incerta", disse Simon ao Valor, ponderando que o mesmo é visto em outros países. "É um risco em todo lugar."

Os autores do levantamento alertam para o momento delicado que o Brasil e outros países na região vivenciam. Eles lembram que desde 2014, quando surgiram a Lava-Jato e outras operações na região, houve a adoção de instrumentos de combate à corrupção, como a colaboração premiada e acordos de leniência. Também contribuíram para os avanços observados uma onda de jornalismo investigativo, uma maior mobilização da população e o uso das redes sociais para denúncias, complementam.

Sócio sênior e responsável pelas atividades da Control Risks na região, Geert Aalbers acrescenta: "Há uma crescente pressão em todos os países para se ter medidas revertidas".

Em relação ao Brasil, o relatório também alerta para os riscos envolvendo a definição do próximo comando da Procuradoria-Geral da República, o julgamento sobre a prisão após condenação em segunda instância, restrições ao censo e à aplicação da Lei de Acesso à Informação.

Simon ainda destaca as brechas para a prática de caixa dois existentes nas atuais regras de financiamento eleitoral. Ele explica que o Chile também proíbe doação empresarial, mas consegue aplicar sua lei com mais rigor. Na Argentina, é permitido o financiamento de empresas. Há, contudo, o controle dos registros. Nesse quesito, o Brasil só ficou à frente de Guatemala e Venezuela. "É a área de longe mais problemática para o Brasil", afirma. "Essas deficiências colocam o Brasil para trás."

A metodologia adotada leva em conta 14 variáveis que buscam medir a capacidade de cada país em desvelar, punir os envolvidos e impedir a corrupção. São considerados, por exemplo, o funcionamento do sistema judicial, a independência dos investigadores e características do sistema político-partidário.

O índice CCC se vale de informações públicas disponibilizadas por organismos internacionais e instituições privadas, as quais são somadas à avaliação de analistas da Control Risks e de especialistas locais, como advogados, jornalistas e profissionais da área de compliance.

Segundo os autores, o objetivo do índice não é substituir ou servir de contraponto a rankings desse tipo já existentes. Mas fomentar o debate por meio de indicadores objetivos que possam ir além de uma sondagem baseada na percepção subjetiva de entrevistados.

Para Geert Aalbers, o índice também evidencia a relação entre corrupção e o risco político no ambiente de negócios. No caso do Brasil, conclui, o relatório aponta que o problema da corrupção está sendo atacado. "Para uma empresa no exterior olhando a América Latina com a premissa de que ela preza por um ambiente transparente para fazer negócios e competir de forma igual, este é um sinal positivo para o Brasil", disse. "O Brasil tem sido bem-sucedido no combate e em punir os envolvidos."