Valor econômico, v.20, n.4785, 04/07/2019. Brasil, p. A6

 

Técnicos estão 'nos finalmentes' para criar eSocial 'mais simples'

Lu Aiko Otta 

Ana Krüger 

Fabio Graner 

Raphael Di Cunto 

04/07/2019

 

 

Os técnicos do ministério da Economia estão desde a última terça-feira reunidos ininterruptamente para tentar concluir o processo de reformulação no eSocial, segundo informou o secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, Carlos da Costa. "É o que eu chamo de 'rave' do eSocial", disse Costa.

Ele acrescentou que esse esforço mais concentrado deve se encerrar na tarde desta quinta-feira. "Estamos nos finalmentes para o novo eSocial, muito mais simples", afirmou o secretário, que tem sido um dos maiores críticos do programa. O governo, disse ele, já suspendeu a expansão do eSocial, que vinha sendo feita em etapas. "Vários módulos novos, altamente burocráticos, iam entrar agora, com exigências para as empresas", disse.

Uma outra fonte do governo apontou que a intenção é apresentar a nova versão na próxima semana. O tamanho do enxugamento que está sendo feito, contudo, ainda não foi dimensionado. O prazo da próxima semana veio à tona por causa da pressão do deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), relator da MP da Liberdade Econômica (MP 881), que em seu relatório preliminar propunha o fim do eSocial.

Goergen disse ao Valor que o secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, Rogério Marinho, se comprometeu a tentar lançar o novo eSocial até a próxima terça-feira. "Se isso ocorrer, vou retirar a extinção do meu relatório. Mas incluirei a necessidade de avaliação da implantação desse novo programa após seis meses para verificar se deu certo", informou.

Para Renato Vilela Faria, especialista em direito tributário e sócio do Peixoto & Cury Advogados, o fim do eSocial não seria positivo, mas a iniciativa de enxugá-lo, reduzindo burocracias e informações desnecessárias, sim. "Não faz o menor sentido o sistema pedir o título de eleitor do funcionário", exemplificou, destacando que a digitalização das obrigações de escrituração é um aspecto favorável que não deve ser desconsiderado na discussão.

O advogado disse que a simples extinção do programa geraria desperdício de investimentos e treinamento feito pelas empresas e ainda prejudicaria a capacidade de fiscalização da Receita Federal. "É uma ferramenta importante de fiscalização, que dá mais poder de atuação para a Receita. Hoje, ela e os Estados têm uma ferramenta muito evoluída para o combate à sonegação."

Em relação a outros aspectos da MP 881, o deputado Jerônimo Goergen desistiu de propor, em seu parecer, a criação de um sistema de "tax free", em que os impostos pagos por turistas estrangeiros ao comprar produtos no país seriam devolvidos para eles, e de mudanças na lei do menor aprendiz.

Segundo Goergen, esses dois pontos vão andar por meio de projetos já em tramitação no Congresso e, por isso, ele decidiu retirar do texto. "Vou agora enxugar o projeto porque ficou muito amplo, mas ao ficar muito amplo também gerou resistência de muitos setores afetados", disse o relator da MP, que promete apresentar o parecer na terça-feira.

O "tax free", que devolveria IPI, ICMS e PIS/Pasep aos turistas estrangeiros, será discutido num projeto na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara. O presidente do colegiado, Sergio Souza (MDB-PR), será o relator e, para diminuir resistências dos governadores sobre a renúncia de ICMS, o benefício será opcional para os Estados que quiserem aderir. Já mudanças nas cotas de menores aprendizes serão debatidas em outro projeto de lei, relatado pelo deputado Marco Bertaiolli (PSD-SP), vice-presidente da comissão do Congresso que analisa a MP.

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Sistema é 'excessivo', mas extinção seria 'passo atrás'

Marta Watanabe 

04/07/2019

 

 

O eSocial faz exigências consideradas "excessivas" por analistas e poderia ser simplificado, mas foi um passo importante para unificação de formulários relacionados à contratação e administração de empregados e também facilitou o recolhimento da contribuição previdenciária e demais encargos sociais.

Thiago Barbosa, sócio da área trabalhista do escritório Machado Associados, diz que o sistema pode ser simplificado para os empregadores domésticos e também retiradas as duplicidades de informações requeridas.

Marcel Satomi, advogado trabalhista do mesmo escritório, lembra que o eSocial exige informações que muitas vezes não estão relacionadas ao vínculo empregatício ou à atividade exercida pelo empregado. Ele exemplifica com a exigência de a empresa apresentar dados da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) dos funcionários para os casos em que o empregado não exerce função de motorista ou alguma outra que demande o documento. São informações aparentemente simples, explica, mas que tomam tempo para o empregador recolher e administrar e não fazem parte da relação entre a empresa e o funcionário.

Patrícia Escapolin, consultora trabalhista da Athros Auditoria e Consultoria, diz que algumas exigências aumentam a burocracia e dificultam processos de contratação e administração de funcionários. A contratação de funcionários, diz ela, pode ficar travada por inconsistências que aparecem no cadastro do futuro empregado. "Às vezes uma mudança de nome porque o candidato mudou o estado civil. Ou alguma falha porque ele tem um homônimo", diz ela. Nesses casos, é preciso que o futuro funcionário levante os documentos necessários para que a contratação seja efetivada. "E muitas vezes as empresas precisam contratar empregados imediatamente."

Embora não seja possível mensurar, as exigências do eSocial, diz Patrícia, certamente elevaram a carga de trabalho relacionada à administração de funcionários, em razão do maior número de informações que os empregados passaram a gerir. "Há muitas empresas do grupo dois que ainda estão se adaptando", diz ela. O grupo dois passou a enviar as folhas de pagamentos ao sistema do eSocial desde janeiro deste ano. As empresas do grupo dois, explica a consultora, são aquelas que faturaram até R$ 78 milhões em 2016 e não são optantes do Simples Nacional.

Outra repercussão do eSocial foi a maior preocupação das empresas em relação aos recolhimentos da contribuição previdenciária e dos encargos sociais, diz Satomi, do Machado Associados. "Passou a haver preocupação maior com as bases de incidência", exemplifica.

De qualquer forma, ressalvam os especialistas, acabar com o sistema do eSocial seria um retrocesso, já que ele também trouxe avanços. Patrícia diz que o recolhimento da contribuição social e dos encargos sociais, bem como compensações, foi facilitado com o novo sistema. Barbosa, do Machado Associados, diz que a implantação do eSocial exigiu treinamento dos profissionais que lidam com a administração dos empregados dentro das empresas e que algumas mudanças no decorrer da implantação causaram um certo desgaste em relação ao sistema. Mas ele também destaca que a unificação no envio de informações que antes constavam de formulários esparsos foi um avanço importante.