Valor econômico, v.20, n.4801, 26/07/2019. Opinião, p. A10

 

A importância estratégica do seguro rural 

Bernardo Rothe 

26/07/2019

 

 

Em praticamente todos os países onde a agricultura tem relevância econômica, o seguro rural é um pilar estruturante na política agrícola. Ele tem papel estratégico na segurança alimentar ao permitir estabilidade econômico financeira ao setor produtivo e manter o produtor na atividade.

A evolução do seguro rural no Brasil é impressionante. Segundo dados da Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg), de 2006 a 2018, houve crescimento de 1.298% deste tipo de seguro. O segmento rural passou a ocupar fatia de 4,27% no mercado de seguros gerais ao final do ano passado. Em 2006, essa participação era de 0,66%.

Nesse período, triplicou o número de seguradoras atuantes nas modalidades de seguros agrícolas no país, saltando de 4 empresas protegendo 25 culturas para 12 participantes em 51 culturas.

Nesses 12 anos, o número de produtores protegidos subiu de 16,7 mil para 97,5 mil, o capital segurado passou de R$ 2,9 bilhões para R$ 28 bilhões. A área segurada era de 1,56 milhão de hectares em 2006 e passou a 10,7 milhões de hectares em 2018.

O valor dos sinistros indenizados das modalidades agrícolas registrados em 2006 foi de R$ 24 milhões e alcançou R$ 1,4 bilhão em 2018. Em 2019, deverá ser ainda maior em função das perdas de produção na safra 2018/2019 em diversas lavouras com culturas de verão nos Estados do Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Goiás e Tocantins, principalmente.

Outro aspecto relevante é o Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural - PSR. Entre outras coisas, o PSR é um auxílio pecuniário (percentual ou valor) concedido pelo governo federal e, em alguns Estados, pelo governo estadual para o pagamento de parte do prêmio do seguro. O objetivo é tornar o seguro mais acessível aos produtores.

O PSR tem contribuição expressiva para expansão e massificação do seguro. Modelos similares de parceria público-privada são adotados em todos os mercados com estruturas de seguro rural estabelecidas e consistentes há anos.

Nos últimos 12 anos a subvenção ao seguro rural foi multiplicada por 10, saindo de R$ 31 milhões para R$ 371 milhões em 2018. Com o lançamento do plano safra 2019/2020, o Governo Federal anunciou o aumento de recursos para o PSR para R$ 1 bilhão em 2020. Esse anúncio demonstra a importância que vem sendo dada a esse mecanismo dentro da estrutura de política agrícola.

A proteção do seguro rural no Brasil evoluiu bastante e acompanhou o desenvolvimento do agronegócio. Contudo, para garantir maior equilíbrio econômico-financeiro nesse setor, responsável por 21,1% do Produto Interno Bruto em 2018, segundo dados do Cepea/Esalq e da CNA, o seguro rural precisa continuar crescendo e se aperfeiçoando.

A formação de complexos agroindustriais e as transformações nas cadeias produtivas levam a uma avaliação mais complexa dos riscos, pelo maior grau de especialização e pela importância crescente do capital no processo produtivo. Se essa maior presença do capital traz ganhos em investimento e produtividade, também aumenta as consequências e prejuízos em uma eventual manifestação dos riscos, sejam eles climáticos, sanitários ou de mercado.

A geração de valor com os produtos securitários nos ramos rurais, até pouco tempo, era pouco percebida pelo produtor, mas essa realidade vem mudando. Já se pode afirmar que o progresso das coberturas, o conhecimento das necessidades e dos riscos e, principalmente, a vivência e a materialidade do seguro a partir dos sinistros, têm gerado maior aculturamento e busca pela proteção, o que é fundamental para essa atividade que, pela sua natureza, tem riscos.

O cenário competitivo nesse segmento tem o desafio de se aproximar cada vez mais de coberturas e condições de produtos individualizados que considerem as necessidades dos agentes econômicos dessa cadeia em seus diferentes aspectos, relevos, tipos de solo, microclimas, culturas semeadas e tecnologias usadas.

Em um cenário onde cada vez mais o impacto das mudanças climáticas afeta cadeias produtivas do agronegócio, é estratégico integrar as políticas de gestão de risco.

A agricultura de precisão e a biotecnologia são cada vez mais presentes nos sistemas produtivos que têm de enfrentar as mudanças climáticas. O seguro agrícola precisa estar junto dessas evoluções que afetam diretamente o risco.

Nesse ambiente desafiador, fica evidente a importância social do seguro rural que reduz perdas dos produtores, garante emprego e renda com continuidade do ciclo econômico. Essa vantagem alcança as menores comunidades e os grandes centros, mas também protege a população que depende do agronegócio.

Seguro rural é investimento, não é custo. Essa é a clara conclusão que tiveram milhares de produtores, trabalhadores e governantes em países onde o agronegócio é relevante para a atividade econômica. Estados Unidos, Espanha, México e Índia são exemplos de nações com ricas experiências de políticas públicas de proteção e gestão do risco, onde o seguro está cada vez mais presente.

O Brasil tem tudo para ser um exemplo em gestão de risco na agricultura e é o que se espera desse país que deverá por muitos anos alimentar grande parte da população mundial. Devemos analisar com atenção os problemas enfrentados em outros países e os resultados que alcançaram. Essas referências não precisam ser copiadas, mas servirão de insumo para as discussões do melhor modelo para realidade brasileira, com seus desafios e sua pluralidade.