O Estado de São Paulo, n. 45803, 14/03/2019. Política, p. A15

 

 

Tendência no STF é fixar competência da Justiça Eleitoral

Breno Pires

 

Amanda Pupo

14/03/2019

 

 

Dois ministros já votaram para não haver separação de crimes comuns quando associados a caixa 2; procuradores veem risco à Lava Jato

Julgamento. Sessão do Supremo Tribunal Federal que começou ontem e vai definir foro para casos de prática de caixa 2 ligada ao crime de corrupção

Em sessão marcada por críticas a procuradores da Lava Jato, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) indicou ontem que crimes como corrupção e lavagem de dinheiro devem ser julgados na Justiça Eleitoral se estiverem relacionados à prática de caixa 2. O entendimento é contestado pela Procuradoria-Geral da República, que vê risco de esvaziamento de investigações.

O placar do julgamento, iniciado ontem e que será retomado hoje, está em 2 a 1 a favor da tese, que tem prevalecido na Segunda Turma da Corte.

A expectativa é de que o relator do caso, ministro Marco Aurélio Mello, e Alexandre de Moraes, que votaram ontem, sejam seguidos em seus votos por quatro ministros que já defenderam a mesma tese em outras ocasiões – Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e Dias Toffoli. Com isso, caso não mudem de opinião, ficaria garantida maioria sobre a Justiça Eleitoral como foro.

O cenário é visto por integrantes do Ministério Público como desastroso para investigações criminais e operações como a Lava Jato. Na avaliação de procuradores, a Justiça Eleitoral não tem estrutura para julgar crimes mais complexos, como corrupção e lavagem, que exigem investigações aprofundadas. A principal crítica é que os processos podem demorar e levar a prescrições, além do risco de anulação de atos já realizados pela Justiça Federal.

Na sessão, os ministros reagiram ao discurso dos procuradores. O presidente da Corte, Dias Toffoli, anunciou, da tribuna, uma representação contra o procurador da República Diogo Castor, da força-tarefa da Lava Jato no Paraná, por suposto “ataque à Justiça Eleitoral”. “Não é admissível este tipo de ilação. Críticas no debate jurídico são necessárias, fazem parte da dialética, e por isso o Supremo e os tribunais são feitos de maneira colegiada. Agora, a calúnia, a difamação, a injúria, não serão admitidos”, disse.

‘Golpe’. Reveladora do desconforto com as críticas direcionadas à Corte, a reação de Toffoli veio após um advogado ler da tribuna um artigo publicado por Castor, no qual o procurador fala em “novo golpe à Lava Jato” e diz que tribunais eleitorais são compostos de magistrados por indicação política.

O presidente do Supremo citou ainda a criação de um fundo de R$ 2,5 bilhões por acordo da força-tarefa com a Petrobrás. “Esse mesmo procurador da República é subescritor daquele acordo que criou fundação privada para administrar dinheiro público. Não vou avançar mais porque isso, hoje, está na jurisdição de vossas excelências por uma ação apresentada pela própria Procuradoria-Geral da República”, disse Toffoli, em referência à ação em que a PGR pede a anulação do acordo para criar o fundo.

Votos. O julgamento iniciado ontem é sobre o destino de inquérito envolvendo o ex-prefeito do Rio Eduardo Paes (DEM) e o deputado federal Pedro Paulo (DEM-RJ), que apura indícios de caixa 2, lavagem, corrupção e evasão de divisas. “Não está em julgamento aqui o poder judiciário eleitoral”, acrescentou Toffoli.

Alexandre de Moraes somouse ao presidente da Corte nas críticas. “Há necessidade de maior decoro em especial de procuradores que vêm sistematicamente agindo com total desrespeito a colegas dos ministérios públicos estaduais.”

Em seu voto, Moraes disse que o entendimento consagrado no Direito no Brasil é o de que a Justiça Eleitoral julga crimes que tenham conexão com os eleitorais. “A discussão não é nova”, disse. O ministro argumentou que o próprio Executivo concorda que a norma atual é essa ao citar o projeto enviado pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro, ao Congresso, prevendo que a Justiça Eleitoral passe a julgar apenas crimes eleitorais.

Na sessão de ontem, apenas o ministro Edson Fachin votou a favor da separação do processo, para que só suspeitas de caixa 2 sejam julgadas pela Justiça Eleitoral. Para o relator da Lava Jato no STF, os demais crimes devem ser julgados na Justiça Federal.

Posicionamento

“O posicionamento de todo o Judiciário, Legislativo e Executivo é de que a competência é da Justiça Eleitoral quando há crimes comuns conexos a delitos eleitorais.”

Alexandre de Moraes

MINISTRO DO SUPREMO