Valor econômico, v.20 , n. 4789 , 10/07/2019. Política, p. A6

 

Relator reforça 'jabutis' em MP e propõe flexibilização de legislação trabalhista

 

 

 

Raphael Di Cunto

10/07/2019

 

 

 

O relator da Medida Provisória (MP) 881, apelidada de "MP da Liberdade Econômica", Jerônimo Goergen (PP-RS), voltou atrás na decisão de diminuir os "jabutis" no texto e apresentou ontem parecer que amplia a proposta de 18 para 71 artigos, com mudanças na legislação trabalhista, tributária e até sobre os produtos vendidos em farmácias.

Após crítica até do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), sobre a quantidade de alterações, dizendo que o projeto não seria aprovado assim, Goergen tinha prometido "enxugar" o texto, mas apresentou um parecer mais amplo em reunião ontem da comissão de deputados e senadores que analisa o projeto. A oposição pediu mais prazo para analisar e, por acordo, a votação não ocorrerá mais hoje e ficará para amanhã, às 10h.

O novo texto libera o trabalho aos domingos e feriados, diz que a legislação trabalhista será substituída pelo direito civil para funcionários com salário superior a R$ 30 mil e autoriza que empresas funcionem sem alvará (no caso das de baixo risco, há dispensa de qualquer ato público, enquanto as de risco moderado terão autorização provisória e vistoria posterior).

A proposta ainda diminui o poder fiscalizatório dos órgãos de Estado sobre as empresas: determina, em muitos casos, que multas só poderão ser aplicadas em uma segunda visita do fiscal e propõe redução de 30% quando forem pagas em até 30 dias. Permite ainda uma série de recursos em instâncias administrativas.

O parecer cria até um "regime especial de contratação anticrise" que diz que, enquanto a taxa de desemprego não ficar abaixo de 5 milhões de pessoas durante 12 meses, ficarão suspensas regras trabalhistas, como a contratação de experiência ter prazo máximo de 90 dias e a jornada reduzida dos bancários, músicos, operadores cinematográficos e jornalistas. Hoje são 13,5 milhões de desempregados.

Ele também anistia multas pelo descumprimento da tabela do frete rodoviário e diz que os contratos privados prevalecerão sobre a lei sempre que ela estiver com a constitucionalidade sendo discutida no Supremo Tribunal Federal (STF) - que é o caso da própria tabela, mas se aplica a outros setores. O parecer altera a legislação sobre a desconsideração da personalidade jurídica para dificultar que os bens de proprietários de empresas sejam usados para pagar dívidas delas.

A proposta ainda libera as farmácias de terem um farmacêutico presencialmente em questões de situações de emergência ou calamidade pública, nos intervalos de jornadas dos farmacêuticos presenciais e no período noturno, para os estabelecimentos que operarem 24 horas por dia. Além disso, permite que ofereçam outros serviços ligados a saúde e que um ato do Ministério da Saúde autorize a venda de outros produtos além de remédios.

A amplitude fez o parecer ser criticado até por parlamentares favoráveis a tese de mais liberdade para a economia. "Conversamos com a equipe econômica. Vai matar uma ótima MP com tantos jabutis", disse o deputado Felipe Rigoni (PSB-ES). "Do jeito que está vai acabar revogando até a Lei Áurea [que acabou com a escravidão no país", afirmou.