Valor econômico, v.20, n.4799, 24/07/2019. Política, p. A6

 

PGR recorre de decisão de Toffoli, que beneficiou Flávio Bolsonaro 

Mariana Muniz 

24/07/2019

 

 

A Procuradoria-Geral da República (PGR) recorreu, ontem, da decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, que na semana passada determinou a paralisação de todos os processos judiciais nos quais dados bancários de investigados tenham sido compartilhados por órgãos de controle sem a prévia autorização do Judiciário.

Em manifestação de 45 páginas, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmou que existem "obscuridades" na decisão do presidente do STF e pediu esclarecimentos. Para ela, houve uma "expansão indevida do objeto do recurso extraordinário". No dia 16, Toffoli atendeu a pedido feito pela defesa do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), alvo de investigações após relatório de movimentação financeira do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

De acordo com Dodge, o recurso extraordinário que está no Supremo com repercussão geral - no qual a defesa do senador ingressou com uma petição - não questiona a possibilidade de o Coaf emitir Relatório de Informações Financeiras (RIFs) ao Ministério Público do Rio de Janeiro sobre movimentação atípica. Segundo ela, o recurso original (que trata de um casal dono de posto de gasolina), inclusive, reconhece a legalidade do procedimento, regulado pela Lei 9.613/1998.

No documento, a PGR também fala em um possível impacto causado pela decisão de Toffoli nas investigações do MPF e argumenta que diversos inquéritos se valeram de relatórios de inteligência financeira fornecidos pelo Coaf - e defende que o uso do compartilhamento de informações não é novidade no sistema jurídico brasileiro.

"O próprio Supremo Tribunal Federal, aliás, sempre referendou tal modus operandi, justamente por reconhecer a inexistência de violação a sigilo nessas situações. Há diversos casos, alguns bem recentes, em que a troca direta de informações entre Coaf e agências investigativas, sem intermediação do Judiciário, foi essencial ao desfecho de ações penais que tramitaram perante o Supremo Tribunal Federal", diz.

Segundo ela, "há uma infinidade de investigações e ações penais que poderão ser negativamente impactadas", como o caso do médium João de Deus, investigações envolvendo a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) e desdobramentos da Operação Lava-Jato no Rio de Janeiro, que tiveram como alvo os ex-governadores Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão.

No documento, Dodge ainda demonstrou preocupação com as consequências da decisão para a imagem no Brasil no cenário internacional. Citando o Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi), ela afirma que submeter o compartilhamento das informações a autorização judicial é "descumprir os padrões internacionais de combate da lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo", sob o risco de comprometer a atuação do país no mercado financeiro.

Com a decisão de Toffoli, todas as investigações ficaram suspensas até que o plenário do Supremo analise o mérito da questão. A princípio, o julgamento está marcado para 21 de novembro, mas há a possibilidade de o julgamento ser antecipado.