O globo, n. 31347, 04/06/2019. Economia, p. 15

 

Apenas 10 estados na reforma

Geralda Doca

Silvia Amorim

Rennan Setti

04/06/2019

 

 

Regras seriam automáticas para mais endividados e com maior proporção de idosos

Diante da reação de parte dos governadores, especialmente de João Doria (PSDB), de São Paulo, coma exclusão de estados e municípios da reforma da Previdência, o relator da proposta, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), busca uma solução intermediária. Uma alternativa em estudo está numa emenda apresentada por consultores do Congresso eque tem o aval do governo. Ela fixa critérios pelos quais as novas regras seriam automáticas para estados e municípios de acordo com o nível de endividamento e a proporção de idosos. Na prática, a medida garantiria que dez estados do país aderissem: Acre, Alagoas, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo.

Boa parte destes estados está em situação de calamidade nas contas públicas, pressionadas pelas despesas com aposentadorias. A regra prevê a adesão automática de entes com dívida igualou superiora 70% da receita corrente líquida (disponível para gastar) apurada em 2017 e percentual de idosos na população igual ou maior que 10%. Os estados que não se enquadrarem só poderiam aderir mediante a aprovação de lei ordinária em assembleia.

A retirada dos governos regionais da reforma é defendida por partidos do centrão sob o argumento de que, no formato sugerido pelo governo, apenas os parlamentares teriam de arcarcomo ônus político do projeto. A emenda ajudaria a vencera resistência de estados governados pela oposição, especialmente no Nordeste, como Piauí, Paraíba, Ceará e Pernambuco. Para esses, a reforma só valeria se as mudanças fossem aprovadas em assembleias legislativa e câmaras de vereadores. Uma das principais queixas dos deputados é que os governadores do Nordeste “fazem jogo duplo”, ao apoiara reforma em Brasília, mas atacam a proposta quando estão nas suas bases.

Apelo aos estados

Os critérios para incluir estados na reforma e excluir outros são os mesmos para aspre feituras. Ou seja, se o estado entrar, os municípios também entram. Se o estado fi carde fora e aprovar mudanças no regime de aposentadoria na assembleia, seus municípios são abrangidos pela mudança.

Existem no país 2.111 regimes próprios de previdência (RPPS) municipais. As contas dos municípios estão em melhor situação que a dos estados. Nas capitais, porém, os RPPS tiveram déficit somado de R$ 7,26 bilhões em 2017.

Segundo a justificativa da emenda, enquanto alguns estados estão em situação mais confortável, outros enfrentam dificuldades até para pagar salários. “Não podemos lavar as mãos em relação àqueles (estados) que enfrentam grave desequilíbrio financeiro”. A proposta argumenta que a fatura sempre sobra para a União, que é obrigada a executar programas para socorrer estados mais necessitados.

A emenda procura resgatar medidas do texto da reforma, como dar opção a governadores para editar em até dois anos decreto para elevara contribuição dos servidores para 14%, criar alíquota extraordinária limitada a 8% e ampliar aba sede contribuições extraordinárias de aposentados e pensionistas.

A proposta faz parte de um conjunto de alternativas que o relator pretende apresentar aos líderes dos partidos. Há mais três opções: manter o texto como sugeriu o governo ou retirar os estados da reforma, mas permitira adesão por meio da aprovação de lei ordinária em assembleia (quem não tomar iniciativa num prazo de seis meses poderia ficar sem receber transferências voluntárias ). Outrahi pó teseé seguir o modelo da reforma apresentada no governo de Michel Temer, pelo qual as mudanças seriam automáticas após seis meses. Neste prazo, os estados poderiam aprovar regras próprias.

Em almoço com os tucanos Doria, Eduardo Leite (RS) e Reinaldo Azambuja (MS), o relator da proposta fez apelo para que outros governadores se posicionem publicamente a favor da inclusão de estados e municípios na reforma:

— É importante que cada governador se manifeste neste momento. O déficit da Previdência dos estados e municípios é de R$ 96 bilhões (projetado). Se projetarmos esse valor para dez anos, é praticamente a meta que o governo federal pretende economizar com a reforma. Não faz sentido equacionar a previdência do governo federal e deixar estados e municípios de lado.

Os governadores presentes repetiram que atuam para convencer deputados do PSDB e de partidos de suas bases a apoiarem a reforma para os três níveis de governo.

As alternativas do relator

1 -Adoção de critério para definir quais estados entram

Emenda apresentada por consultores do Congresso e que conta com o aval do governo fixa critérios para adesão automática dos estados às regras da reforma. Estados e municípios com dívida igual ou superior a 70% da receita disponível para gasto apurada em 2017 e com 10% ou mais de idosos seriam obrigados a aderir. Os demais só entrariam se aprovassem a mudança em lei ordinária.

2 -Embarque de governos locais no projeto

De acordo com esta opção, o texto da reforma trará a previsão de que as novas regras da Previdência possam ser aplicadas a servidores estaduais e municipais, mas somente se forem aprovadas localmente. Ficaria claro no texto da reforma que as mudanças podem ser aprovadas por meio de lei ordinária, um instrumento que requer um quórum menor para ser aprovado.

3-Desembarque, uma regra semelhante à do governo Temer

Repetindo o que foi proposto no projeto de reforma no governo de Michel Temer, estados e municípios estariam incluídos na reforma. Eles teriam, porém, prazo de seis meses para aprovar mudanças em seus regimes próprios. Se não forem feitas alterações neste período pelos governos locais, após os seis meses passariam a valer para os servidores estaduais as regras aprovadas na reforma.

4-Deixar o texto como foi proposto pelo governo federal

A última alternativa nas mãos do relator é manter o texto conforme foi apresentado pelo governo federal, incluindo servidores estaduais e municipais nas mudanças de regras para aposentadoria. Esta alternativa, porém, enfrenta resistência por meio de parte dos parlamentares. Eles argumentam que não querem arcar sozinhos com o ônus político da mudança de regras da reforma.

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Déficit dos governos locais pode quadruplicar até 2060

Renata Vieira

04/06/2019

 

 

Estudo da Instituição Fiscal Independente aponta que, sem reforma, alíquota de servidor teria de subir a 54% para equilibrar contas

O déficit das previdências dos estados, próximo dos R$ 90 bilhões, pode quadruplicar até 2060 se nada for feito para frear a trajetória de rombos crescentes das contas regionais. O cálculo foi divulgado pela Instituição Fiscal Independente do Senado (IFI). O órgão alerta ainda que o passivo previdenciário ultrapassa o endividamento dos estados junto à União e bancos.

No momento, incluir estados e municípios nas regras propostas pelo Executivo para as aposentadorias ainda é um nó difícil de desatar junto a parlamentares. O relator da reforma da Previdência, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), já afirmou que a definição para o

impasse virá de reuniões com líderes dos partidos ao longo desta semana. Muitos deles, porém, já manifestaram que a tendência geral é deixar servidores estaduais e municipais de fora das regras da União.

Ainda segundo os cálculos divulgados pela IFI, que considera estudos do ex-secretário de Previdência Marcelo Caetano, o equilíbrio do quadro nos estados só seria viável, num cenário em que a reforma não os inclua , a partir da cobrança de uma alíquota de 54% sobre os salários do funcionalismo. O chamado déficit atuarial, isto é, o total necessário para pagar os benefícios se todo o passivo fosse trazido a valor presente, soma hoje nada menos que R$ 5,2 trilhões.

O presidente da comissão especial que analisa a reforma, Marcelo Ramos (PLAM), afirmou ao GLOBO no sábado que, no atual cenário, estados acabarão tendo que pedir socorro novamente à União por causa da trajetória crescente do déficit da Previdência.

“A alteração das regras previdenciárias do servidor estadual parece ser o modo mais eficaz de enfrentar os atuais desequilíbrios e as perspectivas desfavoráveis. Nesse sentido, a PEC nº 6, de 2019, a reforma previdenciária em tramitação no Congresso Nacional, é oportuna, pois altera as regras de modo a postergar aposentadorias e reduzir o valor dos novos benefícios em relação à remuneração da ativa”, afirma o estudo da IFI.