Correio braziliense, n. 20450, 18/05/2019. Política, p. 3

 

Queiroz: em 18 meses, saques de R$ 661 mil

18/05/2019

 

 

Relatórios enviados pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) ao Ministério Público do Rio (MPRJ) informam que o policial militar Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, sacou R$ 661 mil em dinheiro num intervalo de 18 meses, de janeiro de 2016 a junho de 2018. Essas movimentações, consideradas atípicas, foram anexadas pelo MPRJ ao pedido de quebra de sigilo bancário e fiscal de Flávio, de Queiroz e de outras 93 pessoas e empresas, como parte do inquérito que apura indícios de organização criminosa, peculato (desvio de dinheiro público por servidor) e lavagem de dinheiro.

As movimentações financeiras foram detectadas originalmente pelo sistema de compliance do Banco Itaú, em que Queiroz é correntista, e mostram que o amigo da família Bolsonaro “movimentou enormes volumes de créditos e saques em espécie”. Foram R$ 146,4 mil de janeiro a abril e de outubro a dezembro de 2016; R$ 324,8 mil de janeiro a março de 2017; e R$ 190 mil de novembro de 2017 a junho do ano passado. Segundo os documentos do Coaf, nesses mesmos períodos, a conta de Queiroz recebeu R$ 628,2 mil em créditos ou depósitos.
Até o momento, os dois documentos conhecidos do inquérito sobre as movimentações financeiras do filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro eram um relatório que informava saques e depósitos atípicos de R$ 1,2 milhão na conta de Queiroz ao longo de 2016 e um outro que apontava 48 depósitos fracionados de R$ 2 mil na conta de Flávio entre junho e julho de 2017.
Para os promotores, “as centenas de depósitos e saques em espécie realizados de forma fracionada na mesma conta corrente” de Queiroz “evidenciam” a suspeita de que o ex-assessor de Flávio recebia mensalmente frações dos salários dos demais assessores e “distribuía parte do dinheiro a outros integrantes da organização criminosa”, por meio da prática conhecida no meio político como “rachadinha”.
Os promotores lembram que o próprio Queiroz admitiu, em manifestação enviada por escrito — ele faltou aos depoimentos presenciais —, que arrecadava dinheiro dos colegas de gabinete, mas não conseguiu provar a versão de que usava esses recursos para contratar assessores externos por fora, prática proibida pela Alerj. “Não há evidências de que quaisquer pessoas tenham sido remuneradas pelos valores desviados para a conta de Fabrício Queiroz”, afirmam os investigadores.
Cheque
Os primeiros registros do Coaf sobre o caso revelaram que Queiroz recebeu depósitos de outros nove assessores de Flávio e ainda emitiu um cheque de R$ 24 mil para a primeira-dama, Michele Bolsonaro. Segundo explicação do presidente Jair Bolsonaro, o cheque estava relacionado à quitação de um empréstimo feito por ele a Queiroz. Único assessor a prestar depoimento ao MP, o policial militar Agostinho Moraes da Silva admitiu que repassava R$ 4 mil do salário (de R$ 6 mil) a Queiroz, mas que seria para investir na compra e na venda de carro intermediada pelo colega.
Segundo os promotores, com a quebra de sigilo decretada pela Justiça do Rio de Janeiro será possível “desvendar os mecanismos utilizados para branquear os valores de origem ilícita, quantificar o volume de recursos desviados dos cofres públicos pelo esquema das rachadinhas e identificar todos os coautores e partícipes”.
Outra informação relevante do pedido de quebra de sigilo enviado pelo MPRJ à Justiça está relacionada ao policial civil Jorge Luis de Souza, que atuou como assessor parlamentar de Flávio na Alerj. Segundo os registros, ele fez um depósito de R$ 90 mil em espécie na conta da mãe, Nicelma Ferreira de Souza, em março de 2018, quando ainda trabalhava para o então deputado estadual.
No pedido de quebra de sigilo, o MP se refere à “expressiva quantia” de R$ 90 mil depositada por Jorge Luis, em uma única transação, na conta bancária da mãe, que mora em Rio das Ostras, no norte fluminense. O depósito foi realizado, segundo a documentação apresentada, em março de 2018.