O Estado de São Paulo, n.45818, 29/03/2019. Política, p. A12

 

Temer vira réu por corrupção em caso da mala de R$ 500 mil 

Luísa Martins 

29/03/2019

 

 

O ex-presidente Michel Temer tornou-se réu ontem na 15ª Vara Federal de Brasília pelo crime de corrupção passiva, no âmbito do episódio da mala de R$ 500 mil flagrada com seu ex-assessor Rodrigo Rocha Loures, ex-deputado pelo MDB do Paraná.

O juiz Rodrigo Bentemuller recebeu denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal do Distrito Federal (DF), segundo a qual Temer seria o destinatário final do dinheiro recebido do grupo J&F, holding da JBS.

Em troca, segundo as investigações, Loures atuaria junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para favorecer a Empresa Produtora de Energia (EPE), termelétrica de Cuiabá (MT) pertencente à JBS.

Dois anos atrás, durante ação controlada da Polícia Federal (PF), Loures - que já é réu no mesmo caso - foi filmado recebendo uma mala de dinheiro das mãos do ex-diretor do grupo Ricardo Saud, a pedido do empresário Joesley Batista, sócio da J&F.

A denúncia já havia sido formulada pelo então procurador-geral da República Rodrigo Janot em agosto de 2017, mas foi barrada pela Câmara dos Deputados por 263 votos a 227, além de duas abstenções. A admissibilidade da acusação pelo Legislativo é um requisito previsto pela Constituição Federal quando o investigado é presidente da República, cargo que Temer ocupava à época.

Assim que o ex-presidente perdeu o foro privilegiado, o caso foi remetido à primeira instância - e a denúncia, ratificada pelo Ministério Público do DF. O procurador Carlos Henrique Martins Lima pede que o ex-presidente pague R$ 10 milhões, a título de reparação pelos danos causados.

Na decisão, o juiz afirma que a denúncia tem "substrato probatório mínimo" para que o ex-presidente passe a responder a uma ação penal na Justiça.

"Pelos relatos apresentados e devidamente materializados nos relatórios policiais, áudios, vídeos, fotos e diversos documentos colhidos no curso das investigações, encontram-se presentes os pressupostos processuais e condições da ação, podendo-se extrair elementos que evidenciam a materialidade do crime imputado e indícios de autoria, os quais justificam a instauração do processo penal", escreveu.

De acordo com o MPF, os R$ 500 mil eram apenas parte dos pagamentos que a J&F destinaria a Temer - estima-se que a propina poderia chegar a um total de R$ 38 milhões em nove meses.

A entrega do dinheiro teria sido acertada no encontro entre o ex-presidente e Joesley no Palácio do Jaburu, em março de 2017. A reunião foi gravada pelo próprio empresário - que, depois, entregou o áudio à Justiça, como parte de seu acordo de colaboração premiada.

A defesa de Temer afirma que a denúncia "é desprovida de qualquer fundamento, constituindo aventura acusatória que haverá de ter vida curta, pois não tem amparo em prova lícita".

Temer responde a outros nove processos em primeiro grau. Semana passada, o ex-presidente chegou a ser preso preventivamente por suposta participação em esquema de propina da construtora Engevix, mas obteve liberdade dois dias depois.