Título: Palanque internacional
Autor: Renata Tranches
Fonte: Correio Braziliense, 26/09/2012, Mundo, p. 18

Barack Obama usa pronunciamento para responder a críticas do adversário republicano Mitt Romney e ameaçar o regime iraniano

Na reta final em sua luta pela reeleição, o presidente dos EUA, Barack Obama, usou ontem a bancada da 67ª sessão anual da Assembleia Geral das Nações Unidas para mandar uma mensagem ao público interno e, ao mesmo tempo, desafiar o mundo árabe a lutar contra a intolerância, a violência e o extremismo. O líder democrata discursou depois da colega brasileira, Dilma Rousseff. Em tom de ultimato, Obama afirmou que seu país fará "o que for preciso" para impedir o Irã de desenvolver uma arma nuclear e alertou que existe um prazo para uma negociação diplomática. O presidente defendeu ainda a saída do regime sírio (Leia mais na página 19), "que persegue seu povo", e conclamou a comunidade internacional a confrontar a turbulência no Oriente Médio. "Estamos diante de uma escolha entre as forças que nos distanciam e as esperanças que nos aproximam", disse.

Passando pelas principais questões da agenda externa dos EUA, o presidente iniciou seu discurso de 30 minutos falando sobre o embaixador Chris Stevens, assassinado durante um ataque ao consulado norte-americano em Benghazi (Líbia), em 11 de setembro. As circunstâncias da morte do diplomata se deram em meio aos protestos desencadeados no mundo muçulmano depois da divulgação de um trailer do filme Innocence of muslims ("A inocência dos muçulmanos", pela tradução livre) — ofensivo ao profeta Maomé. Obama conclamou os líderes a se unirem em oposição a atos de violência contra as representações americanas e a promoverem a tolerância, como reação à raiva provocada pelo vídeo. "É obrigação de todos os líderes, em todos os países, falarem enfaticamente contra a violência e o extremismo."

Homem protesta vestido de Ahmadinejad diante do hotel do iraniano

Na véspera do discurso do presidente do Irã, Mahmud Ahmadinejad, previsto para hoje, Obama falou à Assembleia Geral que ainda há prazo para resolver o impasse sobre o programa nuclear persa de maneira diplomática. "O tempo não é ilimitado", avisou. O norte-americano se viu pressionado por recentes pedidos do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, para que imponha um "limite" de tolerância ao Irã antes de uma ação militar contra o país. A menção de ontem pareceu responder a esses clamores e, ao mesmo tempo, rebater as críticas de seu adversário republicano — Mitt Romney acusou Obama de negligenciar as relações entre Washington e seu principal aliado no Oriente Médio. "Um Irã com armas nucleares não é um desafio que possa ser contido. Ameaçaria eliminar Israel, a segurança das nações do Golfo (Pérsico) e a estabilidade da economia global", disse Obama. "Os EUA farão o que for preciso para impedir o Irã de obter uma arma nuclear."

Segundo o presidente, além de restringir os direitos de seu próprio povo, o Irã continua "amparando o ditador em Damasco", em referência ao ditador sírio, Bashar Al-Assad. Para Obama, o regime de Damasco segue "perseguindo" sua população e, por isso, deve ter um fim. "Temos de nos empenhar em garantir que o que começa com cidadãos exigindo seus direitos não termine em um ciclo de violência sectária", falou o mandatário, numa alusão à crise síria, que teve início em março de 2011 como manifestações por mudanças democráticas e, hoje, configura-se como uma guerra civil e entre grupos sectários.

Prestação de contas A seis semanas das eleições presidenciais, o presidente pareceu ter direcionado seu discurso ao público interno, como avaliou o professor de Relações Internacionais Williams Gonçalves, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Criticado por Romney por não ser duro o bastante com relação ao Irã e nem em sua resposta à morte do embaixador americano, Obama tocou em questões que são alvo de debate dentro dos EUA. "Sua preocupação foi mostrar que está atento aos temas preferenciais dos americanos e, sobretudo, aos quais Romney promete apresentar solução", disse Gonçalves.

Outra indicação de que se dirigia ao público interno foi a ênfase do mandatário ao direito de expressão, tão caro à sociedade americana. Depois de conceituar o vídeo sobre Maomé como "bruto e nojento", além de ofensivo ao islã, Obama ponderou que ele não justifica a violência desencadeada. "Não há palavras que justifiquem a morte de inocentes", afirmou. "Como presidente do nosso país e como comandante em chefe de nossas forças militares, eu aceito que as pessoas digam coisas horríveis sobre mim todos os dias. E sempre defenderei o direito de elas de fazerem isso", declarou, sob aplausos.

Fora do ar no Brasil A pedido da União Nacional de Entidades Islâmicas, do Brasil, um juiz do Tribunal da Justiça de São Paulo determinou ontem ao YouTube que remova de seu conteúdo o polêmico trailer do filme que provocou os distúrbios no mundo islâmico. A decisão dá prazo de 10 dias para que o site acate a decisão, sob pena de pagar multa diária de US$ 10 mil. O texto define o caso como "um conflito claro em relação à liberdade de expressão e à necessidade de proteção de indivíduos ou grupos humanos contra manifestações que possam induzir ou incitar a discriminação de preconceito de religião".