Título: Eleição direta em cidades do DF
Autor: Marcos , Almiro
Fonte: Correio Braziliense, 23/09/2012, Cidades, p. 30

A demissão do administrador de Águas Claras, Manoel Carneiro, envolvido em irregularidades denunciadas pelo Correio na confecção de gibis, um negócio de quase R$ 1 milhão sem licitação, trouxe à tona a velha discussão sobre a possibilidade de participação popular na escolha dos titulares das administrações regionais. Hoje fruto apenas de arranjos políticos, atrelado diretamente à indicação governamental, o modelo de sucessão no comando das cidades causa insatisfação na comunidade e também de parlamentares. Tramita no Senado Federal uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê a eleição direta para os cargos de administrador e vice-administrador.

Ainda que nem todos concordem com a ideia, a bancada de senadores e deputados federais do DF defende a necessidade urgente de se ouvir a população no processo. Na prática, no entanto, não há indicativo de mudança a curto prazo. No início da década de 1960, havia sete administrações. Hoje são 31, sendo a caçula criada no início de 2012, por meio do desmembramento da Fercal de Sobradinho. Se, por um lado, a situação mudou com a criação de uma administração atrás da outra, o que nunca se alterou foi o processo de escolha dos administradores.

Os governadores sempre tiveram a prerrogativa e a usaram como carta na manga para montar a base de sustentação dos governos, especialmente depois da eleição da primeira bancada da Câmara Legislativa em 1991. Com esse poder, os chefes do Executivo sempre governaram com maioria na Casa. "Esse modelo é arcaico. Fruto apenas de acordos. O País avança em instrumentos democráticos e a capital federal não dá o exemplo. É um absurdo a população não poder escolher quem administra a sua própria cidade", reclama o senador Rodrigo Rollemberg (PSB), autor da PEC parada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.

Levantamento feito pelo gabinete do senador no fim do ano passado indicou que pelo menos 10 dos 30 administradores regionais sequer moravam nas cidades que administravam. Além disso, 14 já foram trocados em menos de dois anos de governo. "Eles não têm identidade com as comunidades. Não conhecem os problemas locais. Como vão poder dizer que administram ou representam alguém?", argumenta o deputado Izalci Lucas (PR), que defende modelo em que a população seja consultada.

Outros deputados, como Roberto Policarpo (PT) e Ronaldo Fonseca (PR), destacam que os administradores precisariam de mais autonomia para solucionar, pelo menos, os problemas mais urgentes. Hoje nem sequer serviços básicos como tapa-buracos e limpeza podem ser feitos pelas administrações. Policarpo e Fonseca defendem a criação de listas tríplices definidas pela população a serem apresentadas ao governador.

Câmara de vereadores

Erika Kokay (PT), Reguffe (PDT) e Jaqueline Roriz (PMN) também concordam com a necessidade de se ouvir o povo no processo, mas entendem que é preciso encontrar alguma alternativa à PEC, já que dificilmente esta seria apreciada no Congresso. A proposta teria apoio apenas dos três senadores do DF e de meros oito entre 513 deputados federais. "O povo precisa ser ouvido. Mas precisamos pensar em alguma outra saída. Sou contra a criação de estrutura com Câmara de Vereadores e mais cargos comissionados para onerar ainda mais a máquina pública. A população precisa é de mais investimentos em saúde, educação e segurança", argumenta Reguffe.

Paulo Tadeu (PT), também defende a participação popular, mas teme mais gastos. A PEC, que conta com o apoio dos outros dois senadores do DF, Cristovam Buarque (PDT) e Gim Argello (PTB), não prevê a criação de municípios e nem de Câmaras de Vereadores. A fiscalização da atividade das administrações ficaria a cargo da Câmara Legislativa, que hoje teoricamente é responsável pelo controle da execução orçamentária do DF. No entanto, ainda é incerto de que maneira se daria a descentralização dos recursos, já que o GDF precisaria dotar as administrações de verba para que caminhassem com independência.

Os próprios administradores reclamam hoje da falta de autonomia e de viverem de pires nas mãos circulando pelas secretarias, já que não têm mecanismos para, de fato, administrar as cidades. "O administrador é a ponta de todo o processo, está mais próximo da comunidade e é cobrado todos os dias. Mas não é prefeito. Não tem dinheiro disponível para trabalhar. Mais de 90% das ações dependem de autorização do governo. Os motivos para aceitar o cargo? Pelo bom salário e pela chance de se tornar conhecido da população", diz um ex-administrador.

Exemplo bem-sucedido de administrador que evoluiu politicamente é o próprio vice-governador Tadeu Filippelli (PMDB), que esteve à frente de São Sebastião no início dos anos 1990. O salário de um administrador hoje é de R$ 14,4 mil.

Multiplicação As administrações regionais foram criadas em 1964, logo após a fundação da nova capital, para ajudar a organizar o DF. A Constituição de 1988 reforçou a indivisibilidade do DF em municípios, mas diante do considerável crescimento populacional, no ano seguinte houve uma reorganização territorial e administrativa, sendo criadas mais cinco administrações. Com o passar dos anos, outras surgiram.