O Estado de São Paulo, n. 45911, 30/06/2019. Política, p. A8

 

Governo diminui ritmo de liberação de verbas a Estados

30/06/2019

 

 

 

 Recorte capturado

 

 

Transferências somam R$ 3,7 bi até maio, menor do que em outros períodos de crise econômica; municípios reclamam de cancelamentos

 

Apesar do discurso descentralizador sintetizado no slogan “Mais Brasil e menos Brasília”, o governo Jair Bolsonaro assinou neste início de mandato um volume de convênios com Estados, municípios e entidades menor do que os seus antecessores. Segundos dados do Portal da Transparência, foram R$ 3,7 bilhões em contratos publicados entre janeiro e maio deste ano, ante R$ 5,8 bilhões em igual período no ano de 2017 e R$ 4,8 bilhões em 2016 e 2015, anos já marcados pela crise econômica no País.

O levantamento inclui tanto as transferências voluntárias envolvendo projetos elaborados por prefeitos e governadores, quanto os convênios vinculados a programas federais, como o Minha Casa, Minha Vida. Em 2018, foram R$ 14,1 bilhões em acordos assinados pelo ex-presidente Michel Temer nos cinco primeiros meses do ano, mas a concentração do recurso é reflexo da restrição imposta pela lei eleitoral, que proíbe a assinatura de convênios durante a campanha.

Prefeitos ouvidos pelo Estado relataram que o ritmo de execução dos convênios federais neste ano ainda é lento, mas esperam que o quadro melhore após a aprovação da reforma da Previdência, prevista para ocorrer em julho na Câmara dos Deputados. “Assinar novos convênios está bem difícil. A prioridade tem sido executar os que estão em andamento. No início do ano o governo chegou a atrasar pagamentos de algumas medições de obras, mas estou otimista de que as coisas vão melhorar”, disse o prefeito Orlando Morando (PSDB), de São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo.

“Estamos com o menor nível de despesas discricionárias (não obrigatórias) da década. As despesas obrigatórias aumentaram muito nos últimos anos, com custeio de pessoas e previdência, e o governo foi forçado a reduzir despesas discricionárias. Os convênios se encaixam dentro delas”, afirmou o economista e secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco.

 

Anulados. Se o atraso nos pagamentos compromete o cronograma das obras, pior é quando um projeto que já havia sido aprovado anteriormente pelo governo é anulado. Só nos cinco primeiros meses do ano, o governo Bolsonaro anulou 227 convênios assinados em gestões anteriores. Os contratos repassariam R$ 149,5 milhões para obras e programas em Estados e municípios.

Foi o que ocorreu no início deste mês com o convênio assinado em 2016 pelo Estado do Mato Grosso com o Ministério de Desenvolvimento Regional para construir uma ponte de concreto sobre o Rio Ariranha, no Alto Araguaia, a 418 km de Cuiabá. Orçada em R$ 1,7 milhão, a obra substituiria a atual ponte de madeira, que está em condições precárias, e melhoraria o escoamento da produção agrícola e pecuária da região.

O cancelamento pegou de surpresa moradores dos distritos que seriam beneficiados com o projeto. O secretário de Agricultura e Pecuária do município, João Dias de Freitas, disse que entende a crise pela qual o País passa, mas que não tem como não lamentar a decisão do governo por se tratar de uma reivindicação antiga. “Agora é esperar a boa vontade do governo.” O Estado do Mato Grosso já encaminhou um pedido de “reconsideração” do cancelamento ao governo federal alegando já ter condições de atender às contrapartidas previstas no convênio.

Já no Distrito Federal, o cancelamento de um convênio de R$ 3,2 milhões para a reforma do pronto-socorro do Hospital Regional de Ceilândia afetou os pacientes que frequentam a unidade e se queixam da estrutura, como corredores estreitos e estragos em paredes e no teto. “Há lugares com mofo e buraco. O lugar é muito pequeno para atender todo mundo que vêm de outras regiões, como Águas Lindas e Sol Nascente”, relatou a professora Nubia Bontempo Martinele, de 39 anos./ FABIO LEITE, CAMILA TURTELLI e FÁTIMA LESSA, ESPECIAL PARA O ESTADO

Custeio

“As despesas obrigatórias aumentaram muito nos últimos anos, com custeio de pessoas e previdência, e o governo foi forçado a reduzir despesas discricionárias. Os convênios se encaixam dentro delas.”

Gil Castello Branco,

SECRETÁRIO-GERAL DA CONTAS ABERTAS