O Estado de São Paulo, n.45843, 23/04/2019. Política, p. A6

 

Toffoli vai enviar ao MP conclusão de inquérito 

Rafael Moraes Moura 

23/04/2019

 

 

Em uma sinalização à Procuradoria-Geral da República, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, disse ontem que vai enviar ao Ministério Público Federal a conclusão das investigações do inquérito instaurado para apurar ameaças, ofensas e disseminação de notícias falsas contra a Corte.

O inquérito, aberto por iniciativa do próprio presidente do Supremo, é contestado pelo Ministério Público Federal, que foi escanteado desde o início das investigações, pediu o arquivamento do caso e foi ignorado quando Toffoli prorrogou a apuração por 90 dias.

Foi no âmbito desse inquérito que o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, decidiu censurar a revista digital Crusoé e o site O Antagonista, mas depois derrubou a própria decisão ao receber informações de que a reportagem era fundamentada em um documento que “realmente existe”. A reportagem informava que um codinome (“o amigo do amigo do meu pai”), usado em troca de e-mails do empreiteiro Marcelo Odebrecht, se referia a Toffoli, na época advogado-geral da União do governo Lula .

Depois de um feriado prolongado, o presidente do Supremo recebeu em seu gabinete a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, com quem se reuniu a portas fechadas por cerca de 40 minutos. O encontro ocorreu a pedido de Raquel. “Nunca houve arestas”, disse Toffoli à reportagem, ao ser perguntado se a audiência serviu para aparar as arestas entre as duas instituições.

Para o presidente do STF, as relações não ficaram estremecidas. O tom diplomático e de normalidade foi reforçado por Raquel, que busca uma saída que preserve as instituições. “A relação do Supremo Tribunal Federal com o Ministério Público é sempre muito boa. Foi uma visita institucional importante e a coisa toda caminhou muito bem”, afirmou ela, ao deixar o prédio do Supremo.

Raquel ainda analisa as medidas cabíveis no caso. Para um membro do Ministério Público ouvido pela reportagem, Toffoli disse o “óbvio”, mas não “tudo”, faltando se comprometer em não adotar medidas que dependam de ordem judicial.

Na semana passada, a Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão em dez endereços em São Paulo, Goiás e Brasília – tudo isso à revelia do Ministério Público. Moraes também ordenou o bloqueio das contas de investigados no Facebook, WhatsApp, Twitter e Instagram. Um dos alvos foi o general da reserva Paulo Chagas, que disputou o governo do Distrito Federal pelo PRP.

Na cúpula da Procuradoria há o temor de que procuradores entrem na mira da investigação, o que já levou a Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR) a entrar com ação para suspender imediatamente as investigações. Segundo o Estado apurou, o inquérito não deve mirar os procuradores, ao menos neste momento.

Legalidade. Em manifestação encaminhada ao STF, a Advocacia-Geral da União defendeu a legalidade do inquérito e se posicionou contra o pedido da ANPR. O parecer da AGU foi enviado ao Supremo após o ministro Edson Fachin determinar que o órgão se manifestasse na ação em que a entidade de procuradores aponta abuso de poder por parte de Toffoli e busca blindar a categoria da investigação.

Para a AGU, “não existe relação direta” entre a portaria que instaurou o inquérito e as atividades desenvolvidas por membros do Ministério Público.

Oficialmente, a reunião entre Raquel e Toffoli foi realizada para tratar de outras ações apresentadas pelo PT e PDT. Os partidos questionam a atribuição do Ministério Público para definir o destino de dinheiro recuperado em colaborações premiadas. Segundo o Estado apurou, uma das preocupações da Procuradoria é que Moraes avance para discutir, além das delações premiadas, os acordos de leniência firmados com o MP./ COLABOROU BRENO PIRES

Encontro

Dias Toffoli, presidente do Supremo, recebeu a chefe do MP, Raquel Dodge, em seu gabinete na Corte

Relação

“A relação do Supremo Tribunal Federal com o Ministério Público é sempre muito boa. Foi uma visita institucional importante.”

Raquel Dodge

PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA

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Investigação continua e censura foi 'resolvida', diz Moraes 

Célia Froufe 

23/04/2019

 

 

O ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar ameaças a integrantes da Corte, afirmou ontem que a questão envolvendo censura a duas publicações (revista Crusoé e site O Antagonista) “já foi resolvida” e que a investigação seguirá seu curso. Foi seu primeiro pronunciamento público após o vaivém de decisões, na semana passada, em relação ao inquérito.

“Não preciso fazer nenhuma avaliação. Isso já foi resolvido na semana passada e nós vamos continuar investigando, principalmente, e esse é o grande objetivo do inquérito aberto por determinação do presidente do Supremo (Dias Toffoli), as ameaças aos ministros do STF”, afirmou ele, ao participar em Lisboa de fórum jurídico realizado pelo IDP, que tem como sócio o ministro Gilmar Mendes.

Moraes afirmou que o Supremo optou por investigar atuações que têm como objetivo desmoralizá-lo. “O que se apura, o que se investiga, não são críticas, não são ofensas. Até porque isso é muito pouco para que o Supremo precisasse investigar. O que se investiga são ameaças graves feitas, inclusive, na deep web, como foi já investigado pelo próprio Ministério Público de São Paulo”, disse ele. “É um verdadeiro sistema que vem se montando para retirar credibilidade das instituições.”

O ministro também falou sobre sua atuação, ao atender inicialmente a pedido de Toffoli para tirar do ar reportagem que ligava seu nome à Odebrecht. “Assim que chegaram os documentos, eu requisitei imediatamente a cópia integral do inquérito. Assim que ele chegou e eu constatei a presença desse documento, foi levantada a suspensão (da censura)”, disse ele.

A reportagem que motivou a ação do Supremo mostrou que Marcelo Odebrecht enviou à Polícia Federal, no âmbito de uma apuração da Lava Jato no Paraná, esclarecimentos sobre menções em seus e-mails. Uma das menções, de acordo com o empresário, era a Toffoli. Na época do e-mail, julho de 2007, Toffoli não era ministro do STF, mas da Advocacia-Geral da União (AGU), no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Moraes foi questionado sobre se o processo não teria de ocorrer de forma inversa: primeiro haver a constatação de que se tratava de fake news – como alegou Toffoli – para apenas depois impedir a circulação das informações pela revista.

“Você não pode prejudicar a honra de uma pessoa quando há, como houve no caso, uma nota oficial da ProcuradoriaGeral da República”, alegou, acrescentando que o comunicado da PGR dizia que a instituição não tinha conhecimento de nenhum documento, pois nenhum documento havia chegado à Procuradoria.