O globo, n. 31349, 06/06/2019. País, p. 6

 

Nova regra da CNH atenderia aos menos 1,4 milhão

João Paulo Saconi

Pedro Capetti

06/06/2019

 

 

Aumento de limite de pontos, de 20 para 40, permitiria que esses motoristas não perdessem a habilitação nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, se mudança na legislação, proposta pelo governo, entrasse em vigor hoje

O projeto de lei apresentado pelo presidente Jair Bolsonaro que pretende ampliar, de 20 para 40 pontos, o limite da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) permitiria que pelo menos 1,4 milhão de motoristas, considerados atualmente infratores, continuassem dirigindo nos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo.

Esse é o total de motoristas que hoje, segundo as unidades do Detran nos dois estados, têm entre 20 e 39 pontos somados na habilitação. De acordo com a legislação vigente, no período de um ano a partir da primeira infração, eles teriam o documento suspenso. Diante da proposta do governo, porém, poderiam seguir dirigindo até completar o novo limite de 40 pontos.

O levantamento feito pelo GLOBO com base nos dados do Detran mostra que o espectro de possíveis beneficiados engloba quase 650 mil fluminenses e 829 mil motoristas paulistas. Esses números se dividem em duas faixas: a de motoristas infratores com mais pontos (entre 30 e 39) e menos (entre 20 e 29). Em ambos os estados, a maioria deles está na primeira categoria (95,6% no Rio e 67,5% em SP).

No projeto de lei encaminhado à Câmara dos Deputados, que também altera outros pontos do Código Brasileiro de Trânsito (CTB), não constam números de motoristas que atingiram tal pontuação e poderiam ser beneficiados com as novas regras. Nas justificativas apresentadas, o texto assinado pelo ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, aponta que “alcançar 20 pontos está cada dia mais comum na conjuntura brasileira”.

Na avaliação de Eduardo Biavati, sociólogo pela Universidade de Brasília (UNB) e especialista em educação no trânsito, a carteira é uma concessão que o Estado dá aos cidadãos caso eles se mostrem aptos para dirigir sem oferecer riscos. Para Bivati, uma vez que o motorista ultrapassa esse limite, ele não teria condições de seguir dirigindo.

— Vimos que com 20 pontos não conseguimos controlar tragédias no trânsito. Será que com 40 vamos conseguir? O cidadão vai refletir melhor? Com 20 pontos nosso resultado é muito ruim. Não temos esse cálculo do número ideal. No máximo você torce para que nesse período um condutor não mate alguém, já que com 20 ele já faz isso — afirmou.

Processo educativo

Diretor da ONG Trânsito Amigo, Fernando Diniz defende que se dê celeridade aos processos punitivos de suspensão da carteira, apesar da possibilidade de aumento dos pontos exigidos. Só assim, segundo ele, o processo educativo das multas será realmente efetivo.

— Muitos desses motoristas estão com processos em andamento. Eles demoram tanto que essa reeducação, o processo de reciclagem, de reeducação, perde o efeito pedagógico. Às vezes o cara continua dirigindo — afirma.

— A pessoa não vai mudar de comportamento e atitude. Ele (o projeto) vai continuar beneficiando o motorista infrator, que vai precisar de mais 20 pontos. Se conceder 40, ele vai precisar de 60.

Biavati afirma que, se aprovada, a legislação vai de encontro ao tratado da Organização Mundial de Saúde (OMS) pela segurança no trânsito, do qual o Brasil é signatário. O acordo prevê redução de 50% no número de mortes até 2020.

— No ano passado o Ministério da Saúde projetou que podemos chegar em uma redução de 11% até 2020. Mesmo com insuficiência de investimentos e deficiências, conseguimos salvar muitas vidas. Agora estamos dando três passos para trás —lamenta.

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Bolsonaro sobre pontuação: ‘Por mim eu botaria 60’

Jussara Soares

06/06/2019

 

 

Um dia após entregar projeto de lei à Câmara, presidente disse que a ‘indústria da multa’ vai deixar de existir no Brasil

O presidente Jair Bolsonaro disse ontem que, por ele, o limite para a perda da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) seria de 60 pontos. No dia anterior, Bolsonaro entregou pessoalmente, na Câmara dos Deputados, um projeto de lei propondo passar de 20 para 40 pontos, em 12 meses, o limite para a suspensão do documento por excesso de infrações.

A proposta também altera outros trechos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Acaba, por exemplo, com multa para o transporte de criança com até sete anos e meio de idade sem cadeirinha adaptada ao seu tamanho e peso, como prevê uma resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) em vigor desde 2008.Para entrar em vigor, o projeto precisa ser aprovado pela Câmara e pelo Senado.

— Fui lá na Câmara dos Deputados, falei com o presidente Rodrigo Maia, o nosso aliado em vários projetos. Apresentamos um projeto para fazer com que a carteira nacional de habilitação passe sua validade de cinco para dez anos. Que o caminhoneiro que transporta aqui o que o Centro Oeste produz não perca sua carteira com 20 pontos, e sim com 40 pontos. Por mim eu botaria 60, porque, afinal de contas, a indústria da multa vai deixar de existir no Brasil — disse o presidente, em evento pelo Dia Mundial do Meio Ambiente em Aragarças, em Goiás.

Cruzada contra multas

Na ocasião, o presidente anunciou ainda que, em conversa com o ministro da Economia, Paulo Guedes, acertou a contratação de mil agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Bolsonaro voltou a dizer que as multas por radares móveis deixarão de ser aplicadas no país.

— Meus amigos policiais rodoviários federais, acabei de acertar com o Paulo Guedes a contratação de mais mil servidores para essa área para bem ajudar no trânsito nos estados. Mas a multagem eletrônica vai deixar de existir para o bem dos motoristas e do nosso Brasil —disse o presidente.

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Câmara aprova emenda que encurta negociação de MPs.

Bruno Góes

Eduardo Bresciani

06/06/2019

 

 

Proposta, que voltará ao Senado, estabelece que uma medida provisória poderá perder a validade em quatro fases da tramitação

A Câmara aprovou ontem uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que encurta o tempo de negociação do governo para aprovar medidas provisórias (MPs) no Congresso. Agora a PEC retornará ao Senado, onde foi aprovada em 2011 com regras diferentes.

Hoje, a partir da publicação, Câmara e Senado têm até 120 dias para votar o texto editado pelo Executivo antes que perca a validade. Pelo projeto aprovado ontem, uma MP poderá deixar de ter efeito em 40 dias, na primeira fase de tramitação no Congresso, caso não seja aprovada em comissão especial.

O texto foi negociado pelos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Havia uma insatisfação entre senadores por terem que aprovar MPs sem discuti-las, devido ao esgotamento de quase todo o prazo pelos deputados.

A proposta estabelece que uma MP poderá perder a validade em quatro fases da tramitação. Os prazos são: 40 dias para aprovação de parecer em comissão especial de deputados e senadores; mais 40 dias para apreciação no plenário da Câmara; 30 dias para o plenário do Senado; e mais 10 dias para a Câmara votar novamente, caso o Senado altere a redação da MP. Atualmente, as MPs têm validade de 60 dias, prorrogáveis por igual período, sem prazos fixos para tramitação na Câmara e no Senado.

Todos os partidos encaminharam a favor da proposta. Apesar da dificuldade na relação entre o Palácio do Planalto e o Congresso, líderes do governo minimizaram o prazo mais apertado.

Um dos motivos para o Planalto não se opor à mudança é que existem em tramitação outras propostas que tiram diretamente poderes da Presidência. Uma delas, do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), limita a cinco o número de MPs por ano. O presidente da Câmara afirma que só levaria adiante propostas como essa se valessem para depois do mandato de Bolsonaro:

—Minha tese é, para não ficar na questão de tirar competência (do presidente), que primeiro a gente possa separar o tempo (prazo), que não tem nada a ver com restrição de poder. E, se for discutir a PEC do Randolfe, vamos votar para o próximo governo. Aí tira a tensão de que a gente quer tirar alguma prerrogativa do governo.

O texto aprovado pela Câmara incorporou decisões tanto do Congresso quanto do Supremo Tribunal Federal, como a proibição de reedição de MPs no mesmo ano legislativo e da inclusão de temas estranhos ao do objeto da medida, o chamado “jabuti”.

A última vez que a Constituição foi alterada para tratar da tramitação de MPs foi em 2001. O texto aprovado proibiu expressamente a criação ou aumento de impostos por meio da ferramenta e impediu a reedição de MPs.