Título: Israel fixa limite para o Irã
Autor: Lunam, Thais de
Fonte: Correio Braziliense, 28/09/2012, Mundo, p. 16

Em discurso perante a Assembleia Geral, o premiê Benjamin Netanyahu risca uma linha vermelha e assinala o ponto em que se tornaria irreversível a capacidade de Teerã para obter armas nucleares

Em um discurso marcante não apenas pela dureza das palavras, mas também pela maneira ilustrativa como foi feito, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, exigiu da comunidade internacional, na Assembleia Geral das Nações Unidas, que imponha um limite ao programa nuclear iraniano, colocado sob a suspeita de incluir um componente bélico secreto. Segurando a figura de uma bomba parecida com as de desenhos animados e uma caneta, Netanyahu traçou a "linha vermelha" em um ponto no qual o Irã teria 90% daquilo que é necessário para obter a bomba atômica — a marca a partir da qual seria praticamente impossível deter o processo.

"Está ficando muito tarde", advertiu Netanyahu, depois de estimar que Teerã já completou 70% do projeto, passou de uma fase inicial para uma intermediária e estaria em posição de atingir o limite crítico até meados de 2013. Embora venha pressionando inclusive os Estados Unidos, seu principal aliado, a acenar claramente com a ameaça de um ataque militar contra as instalações nucleares iranianas, o premiê procurou afastar a impressão de que esteja "marcando data" para um conflito. "As linhas vermelhas não levam a guerras, elas evitam guerras", afirmou, embora frisando que "o calendário nuclear não prevê folgas".

O governante israelense tratou de ressaltar a ameaça internacional representada por um país cujo presidente, Mahmud Ahmadinejad, negou várias vezes a existência do Holocausto e reiterou a ameaça de "varrer Israel do mapa". "Nada poderia colocar o mundo em tanto perigo quanto um Irã com armas nucleares", disparou. "Faz pouca diferença se essas armas letais estão nas mãos do regime terrorista mais perigoso do mundo ou da organização terrorista mais perigosa (a Al-Qaeda)", comparou. Repetindo o gesto feito na véspera pela delegação israelense, que se retirou antes do discurso de Ahmadinejad, a missão iraniana boicotou o pronunciamento de Netanyahu.

"Líderes iranianos falam do fim do Estado de Israel. Com suas redes terroristas armadas com bombas atômicas, vocês se sentiriam a salvo no Oriente Médio, na Europa ou nos Estados Unidos?", indagou o premiê. Quando traçou com a caneta vermelha a "linha fatal", Netanyahu invocou o presidente americano John F. Kennedy, que teria feito o mesmo — com sucesso — em 1962, durante a crise dos mísseis, com Cuba. "A incapacidade de estabelecer essa linha é que leva à agressão", insistiu, para em seguida afirmar que novas rodadas de sanções econômicas não impedirão o Irã de ter seu arsenal nuclear. "Apenas diante de uma linha vermelha clara Teerã cederá", garantiu Netanyahu, que acusou o regime islâmico de "ganhar tempo" com as tentativas de diálogo.

Obama Nesse ponto, o governante israelense permitiu-se fazer um reparo a Barack Obama, que discursou na terça-feira. Embora tenha afirmado que o Irã será impedido de obter a bomba atômica e advertido Teerá de que o tempo para negociações está se esgotando, o líder americano reafirmou a opção preferencial por uma solução diplomática. "Agradeço o esforço do presidente Obama em impor sanções, mas chegou a hora de impor limites", discursou Netanyahu. O debate coincidiu com uma reunião entre a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, e os chanceleres do Reino Unido, da França, da Rússia, da China e da Alemanha. Os seis países compõem uma articulação diplomática para negociar com Teerã.

Independentemente da definição de uma "linha vermelha", Uri Marantz, cientista político da Universidade de Michigan (EUA), não acredita que Israel e Irã entrarão em guerra. "Em primeiro lugar, nenhum dos dois tem recursos e apoio para ter sucesso em um conflito que poderia durar anos. Em segundo lugar, o ultimato serve aos propósitos dos dois governos de reforçar seus círculos eleitorais pró-guerra, bem como legitimar o ressentimento ideológico que mantêm entre si", detalhou.

Marantz assinala que os dois países têm queixas legítimas um contra o outro. "O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, criticou recentemente o governo iraniano por incitar o racismo, o ódio e o genocídio contra o Estado judaico", recordou. Israel, por sua vez, seria a única potência do Oriente Médio com capacidade nuclear instalada, com cerca de 200 ogivas. Como Israel não é signatário do Tratado de Não Proliferação (TNP), a Agência Internacional de Energia Atômica não pode visitar suas instalações.

Urânio para a bomba Em troca da renúncia à bomba atômica, os países signatários do Tratado de Não Proliferação (TNP) asseguram o direito a desenvolver o ciclo do combustível nuclear, que envolve o enriquecimento do urânio. Com um teor de 5% ou 20% do isótopo mais radioativo, o mineral alimenta reatores de uso civil. Para fins militares, o teor requerido é 90%. Para enriquecer urânio até a 20%, segundo os especialistas, é necessário um grande número de centrífugas, o que facilita o monitoramento externo. O salto para 90%, no entanto, pode ser feito em escala mais modesta e, portanto, mais sigilosa.

13 dias de tensão Durante a Guerra Fria, o mundo nunca esteve tão próximo de um confronto nuclear quanto no período entre 16 e 28 de outubro de 1962. A "crise dos mísseis", como ficou conhecida, começou com a revelação de imagens ob tidas em Cuba por aviões-espiões norte-americanos. Elas mostravam silos para mísseis nucleares, com os quais a União Soviética poderia atacar cidades americanas sem dar tempo a uma resposta. O presidente John F. Kennedy ordenou um bloqueio naval à ilha, para impedir a passagem de navios militares soviéticos. O então premiê da URSS, Nikita Krushev, cedeu e ordenou a retirada dos mísseis.