O globo, n. 31354, 11/06/2019. Economia, p. 13

 

Fôlego na caixa

Geralda Doca

Rennan Setti

Ramona Ordoñez

11/06/2019

 

 

Banco vai se desfazer de ações da Petrobras. Parte dos recursos pagará aportes ao Tesouro

A Caixa Econômica Federal vai se desfazer de suas ações na Petrobras, uma operação estimada em R$ 7,2 bilhões (considerado o preço de fechamento dos papéis em 7 de junho, de R$ 29,85). Será a maior operação desde a oferta feita pela Telefônica Brasil em abril de 2015, que captou R$ 16,1 bilhões.

Esse movimento reflete tanto a estratégia da Caixa de reduzir sua dependência de recursos do Tesouro Nacional como uma pressão, por parte do Ministério da Economia, para que os bancos públicos comecem a devolver os aportes recebidos — só no caso da Caixa, são R $40 bilhões. Parte dos recursos obtidos coma vendados papéis da Petrobras teria essa finalidade.

O objetivo é pagar os aportes feito pelo Tesouro nos últimos anos, na forma de Instrumento Híbrido de Capital de Dívida (IHCD), tipo de empréstimo que não tem prazo

para pagamento. Segundo fontes ligadas à instituição, o Banco Central já deu aval para que a Caixa antecipe uma primeira parcela de R$ 3 bilhões ainda esta semana. O plano é pagar o equivalente aR $20 bilhões ainda em 2019.

A antecipação do pagamento desses empréstimos vai resultar no enxugamento das operações do banco. E, segundo fontes, no caso da Caixa a antecipação do pagamento pode ser vantajosa porque os juros cobrados estão acima da Taxa Selic, hoje em 6,5% ao ano.

A Caixa tem uma fatia de 3,2% da Petrobras e, coma oferta das ações ordinárias (ON, com direito a voto), deve zerar sua posição na petrolífera. Do total, 24% das ações serão destinados a pequenos investidores, sendo que 2% vão prioritariamente para funcionários de Petrobras e Cai xaque queiram comprá las. Além disso ,4% serão destinados preferencialmente a investidores que concordarem em não vender as ações adquiridas por 45 dias.

A instituição financeira deve ainda se desfazer de sua participação no Pan, além de trabalhar para acelerar a abertura de capital (IPO) das subsidiárias na área de cartões, seguros, loterias e gestão de ativos. Entre 2009 e 2013, o Tesouro fez seis aportes na Caixa na forma de IHCD, totalizando R$ 40 bilhões. Já no caso do

Banco do Brasil, somam R$ 8,1 bilhões. Como há limites para os bancos efetuarem os desembolsos, como por exemplo, obedecer os limites de segurança e solvência sem comprometer o capital principal, os valores precisam ser pagos em parcelas. Esses pagamentos não impactam o resultado primário do governo federal, mas têm efeito sobre a redução da dívida bruta.

A Caixa pretende vender pelo menos 15% das ações de suas subsidiárias. A estimativa é que isso poderia gerar uma receita extra de R$ 15 bilhões. De acordo com o cronograma, os primeiros IPOs serão da Caixa Seguridade e da empresa de cartão de crédito, previstos para ocorrer até o fim deste ano. A oferta de ações da gestora de ativos e loterias ficará para o primeiro semestre de 2020.

Melhora da nota caixa

Segundo analistas do setor bancário, a operação será positiva para a nota de crédito da Caixa.

—A venda de ações é o caminho mais rápido para seguira estratégia que anova diretoria traço upara o banco. Além do mais, não faz sentido a Caixa ter ações. Não é um banco de tesouraria — observou Luis Santacreu, analista da Austin Rating.

Segundo Sergio Garibian e Pedro Breviglieri, da agência de classificação de risco da S& P, a operação atende à estratégia de concentrara Caixa em sua origem — crédito imobiliário e de impacto social.

Nos últimos anos, o banco já havia conseguido melhorar sua rentabilidade, dedicar-se a operações de menor risco (habitacional e consignado) e frear o crescimento de sua carteira, cujo ritmo acelerado exigia muito capital.

— Isso fez com o banco registrasse uma melhora expressiva do capital regulatório, exigido pelo BC. A venda será positiva para a melhora de capital da Caixa, mas pouco relevante em volume, em comparação ao seu tamanho. Tende ater impacto maior a abertura de capital de subsidiárias, como a Caixa Seguradora e a unidade de cartões, que vem sendo planejada — disse Breviglieri.

— Deve vir dessas operações parte bastante importante dos R$ 40 bilhões que a Caixa estuda pagar ao governo. A Caixa não quis comentar.

Sem uso de FGTS

O pequeno investidor que quiser comprar as ações da Petrobras oferecidas pela Caixa terá de faze ruma aplicação míni made R $3 mil. Se a compra de ações for via fundo de investimento, o valor mínimo é menor: R$ 100. Para participar da oferta, os pequenos investidores devem procurar suas corretoras.

A expectativa é que elas comecem campanhas de alerta nos próximos dias. Diferentemente do que ocorreu no passado, não será possível utilizar recursos do FGTS para comprar ações.

Especialistas em mercado de capitais acreditam que a demanda será forte. Fabiola Cavalcanti, sócia de mercado de capitais no Tozzini Freire, ressalta a “escassez de alternativas e a perspectiva de retomada do setor óleo e gás e do pré-sal”.

No caso da Petrobras, a operação é considerada como positiva pela direção. De acordo com fonte próxima à estatal, a entrada de novos acionistas privados deporte significativo trará maior liquidez para os papéis e maior diversificação da base acionária

— Mas, na prática, o montante ofertado é pequeno e não faz muita diferença para uma empresa do tamanho da Petrobras —disse a fonte.

Outra fonte, porém, ressalta que, apesar de não ser um volume significativo, resultará em menor interferência política na estatal. Isso, avalia uma terceira fonte, certamente aumentará o valor da companhia:

— Quanto mais bem precificada a Petrobras, melhor para o governo e para o país em caso de necessidade de venda.

A Petrobras divulgou fato relevante ao mercado sobre a operação, mas não quis comentar o assunto.

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Desconto no valor das ações é atrativo para investidor

Bárbara Nóbrega

Rennan Setti

11/06/2019

 

 

Segundo analistas, Petrobras tem melhores perspectivas hoje do que quando governo permitiu usar FGTS para comprar papéis

Na oferta de ações ordinárias (ON, com direito a voto) da Petrobras a ser feita pela Caixa, 24% dos papéis serão destinados a pequenos investidores—que podem incluir pessoas físicas, jurídicas e fundos de investimento. O valor mínimo da compra por estes é de R$ 100 (caso seja feita via fundos), e o máximo, de R$ 1 milhão. Os investidores poderão reservar as ações junto às corretoras entre a próxima segunda-feira e o dia 24. O preço será fixado em 25 de junho, e a liquidação ocorrerá no dia 28.

A maior parte dos analistas vê a estatal como uma boa opção de investimento, mas eles ressaltam que é preciso observar o cenário macroeconômico do país. E lembram que o principal atrativo para o investidor é o desconto obtido nesse tipo de operação.

— Dado o porte da oferta, será preciso haver desconto importante para haver demanda, senão o investidor simplesmente compra os papéis na Bolsa. Na média, este fica entre 5% e 10%. Isso é uma oportunidade, pois a Petrobras já estava na carteira recomendada de praticamente todas as corretoras e tem uma boa perspectiva após mudanças na gestão e a liberação para venda de ativos pelo STF (Supremo Tribunal Federal) — diz Rodrigo Marcatti, sócio-diretor da Veedha Investimentos.

Segundo Bruce Barbosa, analista da Nord Research, a perspectiva da Petrobras hoje está melhor do que nos momentos em que o governo liberou a compra de ações da estatal com recursos do FGTS.

Em 2000, 310 mil trabalhadores aplicaram até 50% do saldo do Fundo em ações da estatal, no total de R$ 1,7 bilhão — metade do permitido pelo governo. Em 2010, permitiu-se que quem já tivesse participado da primeira oferta colocasse mais recursos nos papéis, resultando na compra de mais R$ 423,7 milhões em ações. Barbosa cita, além da decisão do STF, a expectativa de retomada dos leilões de petróleo.

De oito analistas ouvidos pela Bloomberg, cinco recomendam a compra das ações.

— A Petrobras tem cada vez menos interferência governamental, o que passa a ser uma opção interessante — diz Álvaro Bandeira, economista chefe do banco Modal Mais.