Correio braziliense, n. 20455, 23/05/2019. Brasil, p. 7

 

Remédio experimental fora da lista

23/05/2019

 

 

Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem que o Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamento experimental ou sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), salvo em casos excepcionais. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) nº 657718, com repercussão geral reconhecida e relatoria do ministro Marco Aurélio.

Iniciado em 2016, o julgamento foi retomado na manhã de ontem com o voto-vista do ministro Alexandre de Moraes, acompanhando a divergência aberta pelo ministro Luís Roberto Barroso no sentido do provimento parcial ao recurso.

Moraes concluiu pela constitucionalidade do artigo 19-T da Lei 8.080/1990, que veda, em todas as esferas de gestão do SUS, o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento experimental ou de uso não autorizado pela Anvisa. “Não se trata de negar direito fundamental à saúde. Trata-se de analisar que a arrecadação estatal, o orçamento e a destinação à saúde pública são finitos”, frisou o ministro.

Segundo ele, a excessiva judicialização na saúde não tem sido bem-sucedida. “Para cada liminar concedida, os valores são retirados do planejamento das políticas públicas destinadas a toda a coletividade”, afirmou. Para o ministro, esse sopesamento é fundamental. “Se não, não teremos universalidade, mas seletividade, onde aqueles que obtêm uma decisão judicial acabam tendo preferência em relação a toda uma política pública planejada”.

Os ministros Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes acompanharam o entendimento divergente e ressaltaram que o Estado deve observar as situações excepcionais em que um medicamento sem registro pode ser fornecido.

O ministro Edson Fachin reajustou seu voto e deu provimento parcial ao recurso, mas manteve entendimento de que o Estado tem o dever de fornecer o medicamento ao cidadão e que cabe ao próprio Poder Público fixar os parâmetros para que esse fornecimento seja garantido.

Ao final da sessão, o Plenário fixou uma tese para efeito de repercussão geral, o que orientará as decisões das instâncias judiciais inferiores: o Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais. A ausência de registro na Anvisa impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento em caso de demora irrazoável da Anvisa em apreciar o pedido de registro sanitário (prazo superior ao previsto na Lei 13.411/2016). As ações que demandem o fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa deverão ser necessariamente propostas contra a União.

Hoje, o STF vai analisar outros três recursos extraordinários que também tratam do fornecimento de medicamentos pelo Estado. (JV)