Título: Fé na política
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Fonte: Correio Braziliense, 30/09/2012, Opinião, p. 20
Por mais que certos fatos e alguns protagonistas insistam em turvar o verdadeiro sentido da política, é fundamental que não se perca a noção da decisiva importância dessa atividade para o desenvolvimento da sociedade, desde o mais remoto município até o plenário de organismos do porte da Organização das Nações Unidas (ONU). Não há, de fato, como conduzir com justiça os avanços da sociedade, observadas as características culturais de cada povo, sem a intensa e cada vez maior participação da maioria, seja na tarefa de definir as normas que regerão a vida da comunidade, seja para executar com eficiência os desejos coletivos, sem a política.
É atividade que requer vocação e empenho, constante aperfeiçoamento, entusiasmo e renovação de quadros. Por isso mesmo, tão necessário e prudente como punir e afastar da política os que dela fizerem mau uso é não permitir que, especialmente os mais jovens, confundam a exceção com a regra. A política não é o ideal nem a morada dos que só a exercem em função de interesses pessoais. Esses não são maioria, por mais que possa parecer o contrário, em razão do indispensável noticiário de escândalos políticos — e mesmo que fossem, essa seria apenas mais uma razão para que as pessoas de bem se ocupem da política, seja acompanhando, criticando, sugerindo, votando conscientemente, seja se oferecendo para levar dignidade, correção e bom-senso aos quadros do Legislativo e da administração pública.
É nesse sentido que devem ser entendidas as oportunas palavras da ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), na sessão de julgamento do mensalão quinta-feira passada. Severa nos julgamentos e normalmente econômica em suas palavras, a ministra teve o correto senso da oportunidade para emitir a mensagem que faltava à sociedade. Em meio à constrangedora, mas inevitável, exposição de atos eventualmente condenáveis, a ministra, que também preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de onde comandará as eleições municipais do próximo domingo, avisou: "Não gostaria que jovens desacreditassem na política por causa do erro de um ou de outro".
Cármen Lúcia condenou, naquele dia, vários réus políticos, mas fez questão de separar as coisas. "Meu voto não é absolutamente qualquer sinal de desesperança na política, menos ainda a desconsideração da importância da política para o Estado Democrático de Direito", explicou. Tem razão a ministra. Sempre é bom lembrar que o que está se passando no plenário do STF é a democracia funcionando por meio de uma de suas instituições basilares, que, por mais que seja poderosa, também se submete a leis votadas pelos representantes eleitos pelo povo. E como parte de sua benfeita confissão de fé na política, a ministra lembrou a todos, jovens ou não, as razões daquele julgamento que ela mesma considerou "triste". Segundo Cármen Lúcia, "quem exerce cargo político deve ter mais rigor em termos de ética do que aqueles que tratam de suas próprias coisas. Um prejuízo no espaço político significa que uma sociedade inteira foi furtada".