O Estado de São Paulo, n. 45881, 31/05/2019. Política, p. A4

 

Deputados podem esvaziar pacote anticrime de Moro

Renato Onofre

31/05/2019

 

 

Câmara. Grupo que analisa propostas do ministro da Justiça quer excluir do texto item que isenta policiais de punição em casos de homicídio e o que prevê prisão em 2ª instância

Propostas. Capitão Augusto e Sérgio Moro em encontro com a Frente Parlamentar da Segurança Pública, em fevereiro

O ministro da Justiça, Sérgio Moro, pode sofrer um novo revés no Congresso. O grupo de trabalho que analisa seu pacote anticrime na Câmara deve rejeitar duas das principais medidas da proposta. A maioria dos parlamentares é contra manter, no texto, o chamado excludente de ilicitude – que isenta policiais de punição em casos de homicídio em serviço – e o cumprimento de pena após condenação em segunda instância.

Dos dez deputados que integram o grupo, seis disseram ao Estado ser contrários aos dois itens, que foram preservados no relatório do deputado Capitão Augusto (PR-SP). “Sou minoria no grupo. Sei que há questionamentos jurídicos sobre esses dois pontos que podem de fato cair”, admitiu o relator. O texto seria apresentado ontem ao colegiado, mas a reunião foi adiada para a terça-feira que vem. Capitão Augusto incluiu no pacote de Moro o aumento da pena máxima de prisão de 30 para 40 anos, como é hoje na Colômbia. A proposta do ministro não entrava nesse tema.

Apresentado em fevereiro, o pacote anticrime motivou atritos entre o ministro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Cobrado publicamente por Moro a dar celeridade à análise da proposta, o deputado revisou e tratou o pacote do ex-juiz da Lava Jato como um “copia e cola” de outro projeto, apresentado no ano passado por uma comissão de juristas encabeçada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

Em reação, em vez de levar o projeto diretamente a uma comissão especial, como seria o trâmite normal, Maia criou o grupo de trabalho para que fosse feita a incorporação da proposta de Moro com a apresentada pela comissão conduzida pelo ministro do Supremo. O colegiado tem até 15 de junho para apresentar um relatório final.

Derrotas. A falta de prioridade dada ao seu pacote anticrime foi considerada uma derrota para Moro. Por diversas vezes, o ex-juiz disse ter trocado 22 anos de magistratura pela possibilidade de influenciar políticas públicas e propor leis que ajudem no combate à corrupção.

Responsável pela condenação de dezenas de políticos na Lava Jato, Moro, porém, tem enfrentado resistência para levar adiante seus planos. O revés mais recente foi a transferência do Conselho de Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) da sua pasta para o Ministério da Economia. A mudança foi uma exigência de parlamentares para aprovarem a medida provisória que reduziu de 29 para 22 o número de ministérios.

A rejeição à proposta de excludente de ilicitude tem a simpatia do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). A Associação dos Juízes Federais do Brasil divulgou nota técnica afirmando que, da maneira que foi redigida, a medida poderia ser usada até para “exculpar” – eximir de culpa – policiais que cometerem feminicídio. A entidade não concorda em incluir “medo”, “surpresa” e “violenta emoção” como justificativas para livrar agentes de segurança de pena por matar em serviço.

“Esse relatório não representa a maioria do grupo. A Câmara não vai passar por cima da Constituição”, afirmou o deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ), que integra o colegiado.

Maia ainda não definiu se, após o fim do trabalho do grupo, uma comissão especial será formada para analisar o pacote ou se a medida irá direto para a análise do plenário.

Prisão. Outro ponto que deve cair é o cumprimento de pena após condenação em segunda instância. A intenção de Moro ao propor a medida é tornar lei o atual entendimento do Supremo, que já permite o início da prisão após uma decisão colegiada. Mas, para membros do grupo de trabalho ouvidos pelo Estado, esse tipo de alteração tem de ser feita por meio de uma proposta de emenda constitucional.

“É o entendimento de consultores jurídicos e especialistas ouvidos pelo grupo de trabalho”, justificou o deputado Lafayette de Andrada (PRB-MG), também membro do colegiado.

O texto do Capitão Augusto incorpora outras mudanças apresentadas por Moro, como a maneira de se definir o regime de condenação, entre aberto, fechado ou semiaberto. Hoje é considerado o tempo da condenação. A proposta é que o juiz determine qual será o regime, independentemente da pena estipulada. Procurado para tratar do assunto, Moro não comentou. Segundo sua assessoria, o ministro cumpre agenda oficial fora do País.

‘Questionamentos’

“Sou minoria no grupo. Sei que há questionamentos jurídicos sobre esses dois pontos (excludente de ilicitude e prisão após condenação em segunda instância) que podem de fato cair.”

Capitão Augusto

DEPUTADO FEDERAL (PR-SP) E RELATOR DO GRUPO DE TRABALHO

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Parlamentares tentam tirar apoio à PEC 'anti-Mourão'

Naira Trindade

31/05/2019

 

 

Sob pressão, deputados pedem retirada de nomes em projeto que impede posse de vices após afastamento de titulares

Sob pressão das redes sociais bolsonaristas, 16 dos 172 deputados que subscreveram uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), apresentada pelo PT para impedir o vice de assumir o mandato em caso de afastamento do titular, tentam apagar suas digitais. Nos últimos dias, eles ingressaram com requerimento pedindo para retirar suas assinaturas. A maioria alega que nem sequer leu o que avalizou.

A PEC, que recebeu apoio de sete deputados do PSL, partido de Jair Bolsonaro, prevê eleições diretas três meses após o afastamento do presidente, prefeito ou governador, seja qual for a circunstância. Nesses casos, o vice só ficaria no cargo durante esse período. A proposta não deixa brecha para que ele assuma o posto depois desse prazo. A emenda foi apelidada de “anti-Mourão”, em referência ao vice-presidente Hamilton Mourão, que já entrou em atrito com a família Bolsonaro.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já começou a indeferir pedidos para a retirada das assinaturas, sob a alegação de que a proposta está tramitando. Diante desse obstáculo, o líder do Podemos, Diego Garcia (PR) – um dos arrependidos – se movimenta em busca de 87 deputados que se disponham a apoiar um requerimento para retirar de circulação a proposta do deputado Henrique Fontana (PT-RS).

O petista classificou a PEC como uma medida “anti-conspiração”. “Se ela já tivesse sido aprovada, o Temer não seria presidente”, disse ele, em alusão a Michel Temer, que assumiu a Presidência após o impeachment de Dilma Rousseff (PT).

Após a proposta ser divulgada, porém, vários deputados disseram ter se enganado. Na lista dos que retiraram as assinaturas, estão General Girão (RN), Major Fabiana (RJ) e Daniel Silveira (RJ), todos do PSL, que apresentaram a mesma justificativa por ter ajudado o PT a levar a PEC adiante. “Não me recordo com exatidão do momento em que assinei”, escreveram. A deputada Major Fabiana disse, ainda, que jamais apoiaria um projeto que “desnatura” o papel do vice. “Certamente fui induzida a erro quando abordada para assinar essa proposição.”