O Estado de São Paulo, n. 45877, 27/05/2019. Política, p. A8

 

Para Bolsonaro, protesto é recado a ‘velhas práticas’.

 

 

 

Wilton Junior

27/05/2019

 

 

 

Sem citar o Congresso, presidente afirma que ato foi ‘espontâneo’; ‘Ninguém governa sozinho’, reage líder do DEM, Elmar Nascimento

 

Oração. Bolsonaro e a mulher, Michelle, durante culto em igreja batista no Rio

O presidente Jair Bolsonaro demonstrou ontem ter ficado satisfeito com os atos pelo País a favor de seu governo. Em discurso num culto religioso no Rio, pela manhã, afirmou que era uma “manifestação espontânea”, como um recado “àqueles que teimam, com velhas práticas, não deixar que este povo se liberte”. Pelas redes sociais, também compartilhou vídeos de manifestantes no Rio, em São Luís (MA) e em Juiz de Fora (MG).

Mais tarde, questionado se a referência a “velhas práticas” poderia ser entendida como o Congresso, evitou responder. “Pergunta para o povo”, disse. “(Os manifestantes) Foram pedir aquilo que todos querem: paz, democracia, liberdade, responsabilidade”, afirmou ao chegar ao Palácio da Alvorada, em Brasília, e ser recepcionado por um grupo de apoiadores.

No Twitter, o presidente minimizou as críticas a integrantes do Legislativo e do Judiciário nos atos. “A grande maioria foi às ruas com pautas legítimas e democráticas, mas há quem ainda insista em distorcer os fatos”, postou. “Os brasileiros foram pacificamente às ruas para nos cobrar”, disse o presidente.

No Planalto, houve um certo alívio. Havia o temor de que uma mobilizações muito pequenas pudessem ser interpretadas como falta de respaldo popular ao governo. Os ataques a políticos e a ministros do Supremo Tribunal Federal foram tratados como pontuais.

“As manifestações não aconteceram por iniciativa do presidente. As motivações também não. Não há por que atrapalhar qualquer relação entre os Poderes. Tudo que ocorreu foi por iniciativa popular”, afirmou ao Estado o ministro Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).

O apoio a pautas defendidas pelo governo, como a reforma da Previdência e o pacote anticrime do ministro Sérgio Moro, também foi considerado positivo por auxiliares de Bolsonaro. O ministro da Economia, Paulo Guedes, não quis comentar, mas, em conversa com um interlocutor, disse que esse tipo de apoio popular à reforma da Previdência é inédito e um sinal de que “as coisas de fato mudaram” no País.

 

Reação. Líderes do Congresso, porém, reagiram ao fato de terem se tornado alvo dos manifestantes. Um dos principais nomes do Centrão, Elmar Nascimento (DEM-BA), divulgou nota com recado à militância próBolsonaro. “A Câmara e o Senado são fundamentais no processo de aprovação das duas pautas (reforma da Previdência e pacote anticrime). O STF também é pilar da democracia. Ninguém governa sozinho”, afirmou.

Para o líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), o presidente erra quando insinua que o Congresso está impedindo o avanço de pautas importantes. “Ele tem que dizer que práticas são essas, porque nós não temos nenhuma prática em relação a esse governo ou a qualquer outra coisa, nós estamos tentando ajudar o Brasil.”

Em entrevista à TV Record veiculada na noite de ontem, Bolsonaro afirmou que “Centrão virou palavrão”, mas negou que haja uma crise. “Eu, (Davi) Alcolumbre (Presidente do Senado), (Rodrigo) Maia (presidente da Câmara) e Dias Toffoli (presidente do Supremo) estamos em harmonia. Não estamos em litígio”, afirmou. Procurado, Maia não se manifestou./ DANIELA AMORIM, TÂNIA MONTEIRO, RENATA AGOSTINI e DANIEL WETERMAN

 

‘Tiro na testa’

Para Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força (SD), os atos só isolam mais o governo. “O Rodrigo Maia é o único que sustenta o governo ainda hoje. Ataque a ele é um tiro na testa, e não no pé.”