O Estado de São Paulo, n. 45872, 22/05/2019. Metrópole, p. A14

 

Desmatamento avança da Amazônia, que perde 19 hectares de florestas/hora

André Borges

22/05/2019

 

 

 

 Recorte capturado

 

 

 

Ambiente. Trata-se do maior valor mensal para maio em uma década; esse volume, de apenas 15 dias, está próximo da soma dos nove meses anteriores, entre agosto de 2018 e abril de 2019. Mas o nº de multas aplicadas pelo Ibama caiu 35% desde janeiro

 

André Borges / BRASÍLIA

 

VINICIUS MENDONCA/IBAMA-2014

Jamanxim. Alvo histórico de saques de madeira, a partir da BR-163, floresta perdeu nada menos que 3.100 hectares

 

Em 2018, o País registrou os maiores números de desmatamento na Região Amazônica de toda a história. Desde agosto, a devastação ilegal continua e atinge, em média, 52 hectares da Amazônia/dia. O novo problema é que os dados mais recentes, dos primeiros 15 dias de maio, são os piores no mês em uma década – 19 hectares/h, em média, o dobro do registrado no mesmo período de 2018.

Foram perdidos oficialmente em uma quinzena 6.880 hectares de floresta preservada na Região Amazônica, o mesmo que quase 7 mil campos de futebol. Esse volume ainda está próximo do desmatamento registrado na soma de todos os nove meses anteriores, entre agosto de 2018 e abril de 2019, que chegou a 8.200 hectares.

Os dados foram levados ao governo, que os confirmou. O Estado teve acesso a informações atualizadas do Sistema de Detecção do Desmatamento na Amazônia Legal em Tempo Real (Deter), ferramenta do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) que fiscaliza ações de desmatamento. Os números se referem à devastação registrada nas unidades de conservação, florestas protegidas que são administradas e fiscalizadas por órgãos como o Ibama e o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio). Uma das regiões mais devastadas é a Floresta do Jamanxim, alvo histórico de saques de madeira a partir da BR-163, que perdeu nada menos que 3.100 hectares.

Normalmente, as medições oficiais são feitas de agosto até julho do ano seguinte. No período encerrado em julho de 2018, a região registrou 20.200 hectares de desmatamento, um recorde histórico. No atual ciclo, aberto em agosto e já considerando os números até 15 de maio, o acumulado hoje chega a 15 mil hectares – e pode alcançar um novo recorde.

Questionado, o ministro do Meio Ambiente (MMA), Ricardo Salles, disse que a responsabilidade pela curva crescente do desmatamento é de governos anteriores. “Ainda não deu tempo de implementarmos nossas políticas”, disse. Já Ibama e ICMBio não responderam aos questionamentos.

Técnicos do governo observam que o grande volume de desmatamento em duas semanas pode estar ligado à meteorologia. É que março e abril são de muita chuva e a maior incidência de nuvens dificulta o uso de satélites. Com o fim das chuvas, o céu se abre e a área captada cresce. As taxas da devastação, porém, confirmam os técnicos, referem-se exclusivamente ao desmatamento efetivado neste ano. E a questão climática vale para os anos anteriores, que registraram números menores.

 

Multas. As fiscalizações em campo feitas por agentes do Ibama e ICMbio na região continuam em andamento, mas os dados obtidos pelo Estado mostram que o número de multas diminuiu. Entre 1.º de janeiro e 15 de maio deste ano, o Ibama emitiu 850 multas, 35% menos do que no mesmo período do ano passado, quando foram 1.290. No ICMBio, entre 1.º janeiro e 15 maio, seus agentes emitiram 317 multas na região, praticamente metade do aplicado no mesmo intervalo de 2018.

O MMA não comenta a redução. Já o presidente Jair Bolsonaro tem criticado regularmente o que chama de “indústria das multas”. Em janeiro, o MMA acabou com o Departamento de Florestas e Combate ao Desmatamento, que funcionava dentro da pasta desde 2007. O órgão tinha 15 servidores e estava ligado à Secretaria de Mudanças do Clima e Florestas. Com o fim dessa secretaria, os funcionários foram realocados. O MMA também não comentou a situação.

 

Crítica. A justificativa do ministro Ricardo Salles para os dados oficiais de desmatamento foi rebatida por seu antecessor no MMA. “Não há surpresa nessas informações. Há tristeza. Quando um governo resolve desmoralizar os agentes do Ibama, desmontar o ICMBio e acabar com as unidades de conservação, ele só está dando o sinal verde para o desmatamento”, disse Sarney Filho, hoje secretário de Meio Ambiente do Distrito Federal. “Como diminuir os índices, se os instrumentos criados para combater esses crimes estão sendo desmontados pelo discurso e pela ação concreta do governo?”