O globo, n. 31357, 14/06/2019. País, p. 8

 

Relatório do pacote anticrime de Moro é adiado

Natália Portinari

Gustavo Maia

14/06/2019

 

 

Apresentação foi cancelada ontem em meio à publicação de mensagens trocadas entre ministro e procurador da Lava-Jato; Bolsonaro volta a defender decretos que flexibilizam porte de armas, derrubados pela CCJ do Senado

A reunião do grupo de trabalho da Câmara dos Deputados em que seria apresentado o relatório do pacote anticrime do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, foi adiada ontem. O cancelamento acontece em meio à publicação de mensagens trocadas entre o ex-juiz federal e o procurador Deltan Dallagnol. Também ontem, após derrota na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, que derrubou os decretos da flexibilização do porte de armas, o presidente Jair Bolsonaro fez declarações admitindo dificuldade na aprovação das medidas.

Líderes ouvidos pelo GLOBO e integrantes do grupo de trabalho para tratar do pacote anticrime avaliam ser improvável que o projeto ande neste semestre em paralelo à reforma da Previdência. Após a publicação de reportagens sobre as conversas de Moro, a tramitação deve ficar mesmo para o segundo semestre, avaliam.

A reportagem do The Intercept mostrou mensagens trocadas entre o então juiz federal Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol. Segundo o site, Moro deu orientações ao procurador sobre como atuar em processos da Lava-Jato, inclusive em um que investigava o ex-presidente Lula.

Embora o adiamento da reunião mostre mais uma vez a fragilidade da negociação política do governo Bolsonaro com o Congresso, a justificativa dada por Capitão Augusto (PL-SP), coordenador da bancada da bala e relator do pacote anticrime, é a de que a reunião foi adiada devido à apresentação ontem do relatório da reforma da Previdência no mesmo horário. Na última quarta-feira, porém, foi firmado um acordo entre os membros do grupo de trabalho no qual todos pediriam vista após a apresentação do relatório.

— Como a pauta era a entrega do relatório aos membros do GT (Grupo de Trabalho), decidimos que o mesmo seja encaminhado aos gabinetes, para que os parlamentares tomem conhecimento do seu teor e elaborem sugestões que deverão ser debatidas num próximo momento — disse Margarete Coelho (PP-PI), presidente do grupo.

O relatório de Capitão Augusto mantém as principais propostas de Moro, inclusive o excludente de ilicitude, que isenta de pena agentes de segurança pública ao matarem “em conflito armado ou em risco iminente de conflito armado”. Também permanecerá a imunidade para quem cometer crimes sob “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”.

"Derrota não é minha"

Um dia depois da CCJ do Senado aprovar sete projetos de decreto legislativo que derrubam os decretos que flexibilizaram o porte de armas, o presidente disse na manhã de ontem não acreditar que o Parlamento “vá derrotar o povo”. O presidente defendeu a legalidade do próprio ato, editado em maio.

A votação das medidas no plenário do Senado também foi adiada para a próxima semana. Na última quarta-feira, na CCJ, os parlamentares aprovaram um requerimento de urgência para que fossem analisados os decretos no mesmo dia, mas houve um acordo para adiar a votação para a próxima terça-feira. As propostas ainda vão precisar passar pela Câmara.

— A derrota não é minha. Estão derrotando... Eu não acredito que o Parlamento vá derrotar o povo. Eles (os brasileiros) decidiram em 2005 pelo direito de comprar armas e munições. E eu não fui além do que está previsto na Lei do Estatuto do Desarmamento, apenas botamos limites ali, porque muita coisa está em aberto e a legislação nos dá esse direito, via decreto, de adequar a lei na sua plenitude —defendeu Bolsonaro.

À noite, o presidente voltou a defender o texto do decreto que flexibiliza o porte de armas, mas admitiu dificuldades para aprovação do chamado excludente de ilicitude.

As declarações foram feitas por meio de uma transmissão de vídeo ao vivo no Facebook, antes de Bolsonaro participar de evento da Assembleia de Deus em Belém, no Pará. O presidente comentou as derrotas sofridas pelo governo e admitiu que será difícil aprovar medidas.