O globo, n. 31357, 14/06/2019. Economia, p. 15

 

Impacto fiscal será de R$ 1,13 tri

Manoel Ventura

Geralda Doca

14/06/2019

 

 

Com aumento de imposto e redistribuição de recurso

Após mudanças negociadas com partidos, o deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) apresentou ontem uma nova versão da proposta de reforma da Previdência na Comissão Especial da Câmara que discute as mudanças no sistema de aposentadorias. Mesmo com o texto desidratado, o relator garantiu que a reforma terá um impacto fiscal total de R$ 1,13 trilhão em dez anos. Para atingir esse montante, o deputado apresentou medidas de aumento de receita que incluem elevação de imposto.

Moreira decidiu propor aumentar a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) de bancos de 15% para 20%. Ele estima um potencial de arrecadação de aproximadamente R$ 50 bilhões nos próximos dez anos com a medida. A desidratação da reforma junto com o aumento do imposto representa uma economia de R$ 913,4 bilhões em dez anos.

O relator também estabeleceu o fim da transferência de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para o BNDES. Esses recursos são financiados com o PIS/Pasep. Atualmente, a Constituição determina que, pelo menos, 40% dessas receitas sejam destinadas ao BNDES para financiar os programas de desenvolvimento econômico. A versão original da proposta de reforma da Previdência do governo previa que esse mínimo seria de 28%. Moreira alterou esse trecho da proposta e passou a prever que ao menos 28% dos recursos do PIS/Pasep sejam destinados aos cofres da Previdência Social. Isso representará um impacto de R$ 217 bilhões.

Fundo deficitário

Técnicos do governo, porém, criticaram a proposta, porque não se trata de dinheiro novo, mas que passará a compor a conta do regime geral. Além disso, o FAT está deficitário há alguns anos e precisa de aportes do Tesouro para pagar o seguro-desemprego. Integrantes da equipe econômica consideram que a reforma é para cortar despesas e não para aumentar a arrecadação.

A versão da reforma enviada pelo presidente Jair Bolsonaro em fevereiro previa uma economia de R$ 1,23 trilhão em uma década. O secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, Rogério Marinho, considerou que o impacto fis caldo relatório és ignifica tivo:

— O impacto apresentado é significativo, relevante, vai realmente ajudara diminuir essa deterioração das contas públicas. O ministro (Paulo Guedes) sempre falou em um valor em torno de R$ 1 trilhão. Me parece que está muito próximo do valor.

Ao apresentar o relatório, Moreira fez uma defesa da necessidade da reforma, que teve rombo de R$ 290 bilhões apenas na União em 2018. Ele afirma que a Previdência tornou-se o principal fator de desajuste das contas públicas do Brasil e que o país está em “estado falimentar”. Mas as mudanças propostas não têm apenas um caráter fiscal:

—A reforma da Previdência é uma necessidade fiscal, não resta dúvida. Mas não é apenas uma necessidade fiscal. É também uma questão de justiça social. Abrir mão da oportunidade que temos hoje de reformar o sistema é, portanto, sabotar o futuro e manter um sistema injusto.

Segundo o relator, reformar a Previdência é um passo fundamental para fazer o Estado brasileiro voltar a caber em si. “Antigamente falávamos no dragão da inflação. Hoje o gasto público também é um dragão descontrolado, ameaçando o nosso futuro”, afirma Moreira no parecer.

O relator confirmou que a reforma não irá alterar as regras do Benefício de Prestação Continuada (BPC, pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda) e da aposentadoria dos trabalhadores rurais. Também foi excluído o regime de capitalização, pelo qual cada trabalhador contribui com sua própria aposentadoria. A ideia é discutir esse modelo no segundo semestre.

Moreira criou uma regra de transição mais suave, facilitou a aposentadoria de professoras e deixou na Constituição a maioria das normas de aposentadoria. O governo queria que as mudanças fossem feitas por projeto de lei.

Apesar de protestos de servidores, também foi mantida a proposta do governo de estabelecer alíquotas progressivas de contribuição previdenciária, no valor nominal de até 22%.

As mudanças no texto foram bem recebidas no mercado financeiro, em razão do potencial fiscal da reforma. Especialistas em contas públicas,porém, criticaram a exclusão de pontos do projeto apresentados pelo governo.

—Acabaram coma capitalização e ades constitucionalização, pontos que precisavam ser mantidos. Mas o mais grave é terem tirado os estados — afirmou Raul Velloso.

Para o economista Luis Eduardo Afonso, professor da USP, o conteúdo do relatório traz sinais contraditórios, como a exclusão de estados e municípios e da capitalização:

— No caso da capitalização, foi a solução fácil para um problema difícil. O receio é de que jamais voltemos a esta discussão, que precisa ser feita.

Mudança no abono

O novo texto da reforma alterou ainda a regra de concessão do abono salarial, que representa o pagamento de um salário mínimo. Atualmente, ele é concedido ao trabalhador do setor privado que ganha até dois salários. Pela proposta do relator, o abono passará a ser concedido a quem ganha até R$ 1.364,43. O governo propôs que o abono só fosse pago para quem ganha um salário mínimo.

— Acreditamos que a adoção de um salário mínimo de rendimento para ter acesso ao benefício é indevida, pois existe um enorme contingente de trabalhadores de baixa renda com salário ligeiramente superior ao salário mínimo e que passaria a ficar de fora do programa — afirmou Samuel Moreira.