O Estado de São Paulo, n. 45867, 17/05/2019. Política, p. A4

 

'Estão fazendo esculacho em cima do meu filho'

Beatriz Bulla

17/05/2019

 

 

Caso Queiroz. Em Dallas (EUA), presidente afirma que é alvo final das investigações do MP que envolvem seu filho Flávio: “Venham pra cima de mim! (...) Não vão me pegar'

Almoço. Presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia em Dallas na qual recebeu a homenagem Personalidade do Ano

O presidente Jair Bolsonaro afirmou ontem que as investigações do Ministério Público do Rio que envolvem seu filho Flávio Bolsonaro têm por objetivo atingi-lo. Em tom desafiador, o presidente afirmou que Flávio, senador pelo PSL-RJ, é alvo de “esculacho”. “Querem me atingir? Venham pra cima de mim. Querem quebrar meu sigilo, eu sei que tem de ter um fato, mas eu abro o meu sigilo. Não vão me pegar”, disse Bolsonaro durante viagem oficial a Dallas, nos Estados Unidos.

Na cidade americana, onde recebeu uma premiação que, inicialmente, estava prevista para ocorrer em Nova York (mais informações nesta página), Bolsonaro demonstrou irritação ao comentar fatos domésticos. O presidente respondeu a perguntas de jornalistas sempre que era abordado por um grupo de cerca de duas dezenas de apoiadores.

O tema inquérito do MP do Rio foi o que mais o incomodou. A Justiça do Rio, atendendo a pedido da Promotoria, autorizou a quebra de sigilo bancário e fiscal de Flávio, de seu ex-assessor na Assembleia Legislativa do Estado Fabrício Queiroz e de dezenas de outras pessoas que trabalharam com o então deputado estadual.

Pelo menos oito alvos da quebra de sigilo foram funcionários de Jair Bolsonaro durante seu mandato de deputado federal.

Em dezembro, relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), revelado pelo Estado, apontou movimentação atípica de R$ 1,2 milhão em uma conta em nome de Queiroz. Uma das transações citadas no relatório é um cheque de R$ 24 mil destinado à atual primeira-dama Michelle Bolsonaro – o presidente disse que o depósito se referia a parcelas de uma dívida de Queiroz com ele.

“Você sabia que naquele grupo junto do Queiroz tinha umas 20 pessoas, uns 20 funcionários. O meu filho estava com R$ 1,2 milhão, segundo o que o Queiroz teria movimentado. Na verdade é metade, porque o Coaf mostra o que entra e o que sai. Tinha uma senhora lá, empregada de um deputado do PT, que teria movimentado, na mesma circunstância, R$ 49 milhões. O que aconteceu com esse deputado? Ele foi eleito neste ano presidente da Alerj. Ninguém tocou no assunto. Façam justiça!”, afirmou ontem Bolsonaro. “Estão fazendo esculacho em cima do meu filho.”

A Justiça do Rio acatou pedido do Ministério Público e determinou a quebra do sigilo bancário e fiscal do presidente da Alerj, deputado estadual André Ceciliano (PT). Ele é investigado por movimentação financeira suspeita, a partir da Operação Furna da Onça, deflagrada em novembro de 2018.

Na entrevista em que comentou as investigações, Bolsonaro criticou a imprensa. Segundo ele, “grandes setores da mídia” querem prejudicá-lo. “Desde o começo do meu mandato o pessoal está atrás de mim, o tempo todo usando a minha família. Eu me pergunto, por que isso? Qual a intenção disso? 93 pessoas (na verdade, 95 pessoas e empresas tiveram sigilo bancário quebrado)? Eu não quero acusar outras pessoas, mas está escandaloso esse negócio, está escandaloso”, disse Bolsonaro.

O presidente declarou ainda que o sigilo bancário de Flávio está “quebrado” desde o ano passado, mas só agora, para “dar um verniz de legalidade, quebraram oficialmente”. Em outra manifestação em Dallas, Bolsonaro voltou a falar em “perseguição”. “Estão fazendo uma carga em cima dele desproporcional, descomunal, uma perseguição porque é meu filho, nada mais além disso.”

Ele disse para uma repórter da Folha de S.Paulo “entrar de novo em uma universidade que presta” ao ser questionado pela jornalista sobre o bloqueio de verbas na Educação. Ao ser indagado sobre os protestos realizados anteontem em mais de 250 cidades do País, o presidente manteve postura de confronto.

Impeachment. Bolsonaro voltou a criticar os manifestantes e disse que viu uma passeata “Lula livre” – sugerindo direcionamento político dos atos. “Quem decide corte não sou eu. Ou querem que eu responda a um processo de impeachment no ano que vem por ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal, por não ter previsto que a receita foi menor do que a despesa?”

O presidente disse que não vai “ceder” ao pleito dos manifestantes em prol da “governabilidade”. “Querem que eu me adeque (sic) pela tal governabilidade? Não vou ceder a pressão nenhuma. É isso que querem? Um presidente vaselina para agradar a todo mundo? Não vai ser eu. O que vai acontecer comigo? O povo que decida, o Parlamento decida, eu vou fazer minha parte. Eu não vou sucumbir.”

“Pressão”

“Estão fazendo esculacho em cima do meu filho.”

“Querem me atingir? Venham pra cima de mim. Eu abro o meu sigilo. Não vão me pegar.”

“Querem que eu me adeque pela tal governabilidade? Não vou ceder a pressão nenhuma.”

“É isso que querem? Um presidente vaselina para agradar a todo mundo? (...) Eu não vou sucumbir.”

Jair Bolsonaro

PRESIDENTE DA REPÚBLICA

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Nova continência à bandeira dos EUA

17/05/2019

 

 

Nova continência à bandeira dos Estados Unidos

 

 

Na segunda viagem aos EUA desde que tomou posse, o presidente Jair Bolsonaro repetiu o gesto – feito em 2017, quando ainda era deputado – de prestar continência à bandeira americana, e adaptou seu slogan de governo, encerrando o discurso com um “Brasil e Estados Unidos acima de tudo”. A homenagem ao país de Donald Trump, no entanto, ficou pela metade. Na segunda parte, o presidente brasileiro errou a frase e, no lugar de “Deus acima de todos”, emendou: “Brasil acima de todos”.

Bolsonaro discursou por 11 minutos ontem, em Dallas, na cerimônia em que recebeu o prêmio Personalidade do Ano oferecido pela Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos.

O evento, um almoço para cerca de cem empresários, foi organizado às pressas depois que Bolsonaro cancelou a ida a Nova York, onde originalmente receberia a premiação, diante de críticas, inclusive do prefeito da cidade, Bill de Blasio, que o chamou de “perigoso”.

“Lamento muito o ocorrido nos últimos dias”, disse, sobre o episódio. “Não posso ir na casa de uma pessoa onde alguém da sua família não me queira bem. Mas meu amor por todo os Estados Unidos, inclusive os novaiorquinos, continuará da mesma forma.” Na porta do evento, cerca de 20 pessoas protestavam contra a homenagem.

Bolsonaro também falou sobre as manifestações que, na véspera, levaram milhares de pessoas às ruas de mais de 250 cidades contra o bloqueio do orçamento da Educação, nas quais também se ouviram gritos de “Fora, Bolsonaro”. “A esquerda brasileira infiltrou e tomou não só a imprensa, mas também as universidades e as escolas do ensino médio e fundamental.”

Bolsonaro disse ainda que até pouco tempo a política no Brasil era de antagonismo aos Estados Unidos. Em seguida fez uma acusação, sem citar nomes. “Agora, quem até há pouco ocupava o governo teve em sua história as mãos manchadas de sangue na luta armada, matando, inclusive, um capitão, como eu.”