O Estado de São Paulo, n.45865, 15/05/2019. Política, p. A4

 

Planalto é derrotado e Câmara convoca ministro 

15/05/2019

 

 

Votação. Deputados durante sessão que aprovou ontem convocação do ministro da Educação, Abraham Weintraub

Em mais um sinal de desarticulação e falta de base política do governo Jair Bolsonaro, a Câmara aprovou ontem, por 307 votos a 82, a convocação do ministro da Educação, Abraham Weintraub, para dar explicações sobre cortes no orçamento de sua pasta. Pouco antes, líderes de partidos do Centrão se recusaram a se reunir com o presidente, no Palácio do Planalto, sob a alegação de que o momento era inoportuno para o encontro.

A convocação de Weintraub ocorreu de surpresa, horas antes de Bolsonaro embarcar para sua segunda viagem aos Estados Unidos. Em reunião de líderes, no início da tarde, a oposição e o Centrão discutiram a estratégia e, pouco depois, a puseram em prática.

O requerimento foi apresentado pelo deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) e recebeu apenas um voto a menos dos que os 308 necessários para aprovar uma proposta de emenda à Constituição, como a reforma da Previdência. Votaram com o governo apenas 82 deputados. Exceto o PSL e o Novo, todos os outros partidos deram votos para exigir o comparecimento do ministro. O DEM, que possui três ministros no governo, votou contra Bolsonaro: dos 14 deputados presentes à sessão, 11 pediram a presença do ministro.

Parlamentares do Centrão e da oposição afirmaram na tribuna que o líder do PSL, Delegado Waldir (GO), havia concordado com a convocação do ministro durante a reunião de líderes. Waldir não orientou a bancada durante a sessão e tampouco votou para barrar a convocação. A ausência foi destacada pela minoria.

“Quero, em primeiro lugar, registrar o inusitado. Estamos votando a vinda de um ministro, e não estão no plenário o líder do governo, o líder do PSL e a líder do governo no Congresso. Nunca vi um governo mais desorganizado, desarticulado”, disse o líder do PT, Paulo Pimenta (RS).

Após a derrota, o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), usou as redes sociais para dizer que havia “aproximação” do governo com o Congresso, apesar de o colégio de líderes ter decidido, por maioria, adiar a votação de medidas provisórias de interesse do governo. Hugo levara os líderes do PSL, PROS, PSC, Cidadania, Novo, PV, Podemos e Patriota para conversar com Bolsonaro, num encontro classificado por ele como “excepcional”. Após a reunião, porém, parlamentares e governo deram versões conflitantes do que foi conversado .

Na tribuna, Vitor Hugo classificou a convocação do ministro como “um dia especial” e afirmou que seria excelente oportunidade para demonstrar respeito ao plenário e prestar contas.

Weintraub deverá comparecer ao plenário às 15 horas para ser questionado pelos parlamentares. Ele será o primeiro do primeiro escalão do governo a ter de atender a uma convocação.

A sabatina ocorre no mesmo dia em que estudantes, professores e servidores ligados à Educação protestam em diversas cidades do País contra os cortes na área. “Sinto-me honrado em ir novamente ao Parlamento, desta vez no plenário da Câmara dos Deputados, para falar sobre o orçamento do MEC e as diretrizes da nossa gestão para melhorar a qualidade da educação do nosso País”, afirmou Weintraub à noite pelo Twitter.

Em conversas reservadas, deputados lembravam ontem o desgaste para o governo Dilma Rousseff causado pelo então ministro da Educação Cid Gomes. Convocado para uma audiência no plenário da Câmara, Cid caiu em 2015 por exigência do então presidente da Casa Eduardo Cunha (MDB-RJ) após chamar os deputados de “achacadores”. Cunha era líder do Centrão e hoje está preso. Cid é hoje senador pelo Ceará.

Novas derrotas. A votação de ontem, porém, pode não ser a única derrota do governo nesta semana. Após reunião de líderes, os deputados afirmaram que ainda tentarão votar um projeto da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) para sustar os efeitos do decreto que ampliou o porte de armas, assinado por Bolsonaro. O governo tenta, por outro lado, votar três MPs que perdem a validade até o início do mês que vem. Entre elas, a que reestruturou a Esplanada dos Ministérios, que vence no próximo dia 3 .

Questionado se haveria alguma chance de as medidas entrarem em votação, sob o risco de caducarem, o líder do DEM, Elmar Nascimento (BA), disse achar “difícil”. “Isso é problema do governo, ele que tem de se articular.”

Reunião. Elmar se recusou a comparecer ontem à reunião marcada com Bolsonaro. O líder do DEM e o deputado Arthur Lira (AL), que comanda a bancada do PP, eram aguardados no Palácio do Planalto às 16 horas, mas alegaram que o momento seria inoportuno para a reunião.

“Eu fui surpreendido com meu nome na agenda do presidente”, afirmou Elmar. “O que iria parecer se fôssemos lá agora? Qual seria a interpretação? Então, eu disse para o Major Vitor Hugo: deixa a poeira baixar para não parecer que fomos lá fazer algum tipo de barganha.”

Lira foi na mesma linha. Disse que, se o encontro com Bolsonaro ocorresse agora, a interpretação seria a de que haveria uma negociação para aprovar a medida provisória que trata da reforma administrativa.

Os deputados contaram que há cerca de dois meses Bolsonaro afirmou que gostaria de se reunir individualmente com líderes de partidos, mas a reunião nunca foi marcada. Nos bastidores, dirigentes do Centrão suspeitam que o encontro apareceu só agora na agenda de Bolsonaro justamente para constrangê-los./ FELIPE FRAZÃO, VERA ROSA, CAMILA TURTELLI, MARIANA HAUBERT e JULIA LINDNER

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Líderes falam em recuo no MEC, mas governo nega 

15/05/2019

 

 

Deputados que haviam se reunido com o presidente Jair Bolsonaro na tarde de ontem disseram após o encontro que o governo iria rever o bloqueio de recursos no orçamento da Educação. A informação, porém, foi desmentida em seguida pela Casa Civil, pelo Ministério da Educação e pela equipe econômica.

Líderes de quatro legendas, entre eles do partido do próprio presidente, disseram que Bolsonaro telefonou para o ministro da Educação, Abraham Weintraub, e determinou que novos cortes deixem de ser feitos.

A informação foi dada pelos líderes do PSL, Delegado Waldir (GO), do Novo, Marcel Van Hattem (RS), do Podemos, José Nelto (GO), e do Cidadania, Daniel Coelho (PE). “O presidente falou que não haverá contingenciamento na pasta da Educação”, disse Diego Garcia (Podemos-PR), que participou da reunião. Estavam presentes ainda parlamentares de PV, PSC e Patriota. A reunião ocorreu às 18h, logo após a Câmara aprovar a convocação de Weintraub.

Após deputados narrarem a ordem de recuo no MEC, a Casa Civil desmentiu em nota: “Não procede a informação de que haverá cancelamento do contingenciamento no MEC. O governo está controlando as contas públicas de maneira responsável”.

O MEC afirmou que a ligação entre o presidente e o ministro nem sequer existiu. Após a confusão, Weintraub dirigiu-se ao Planalto para falar com o presidente. Segundo a pasta, Bolsonaro disse a ele que o bloqueio será mantido. O Ministério da Economia afirmou em nota que a Presidência não pediu revisão no contingenciamento.

O Estado procurou novamente os líderes. Van Hattem se disse “surpreso” com o desmentido. Garcia também reafirmou ter visto o telefonema. O porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, enviou o seguinte esclarecimento: “O presidente disse que, se dependesse dele, não haveria corte em nenhum ministério. Contudo, afirmou sermos escravos da lei de responsabilidade fiscal”. / C.T., RENATO ONOFRE e RENATA AGOSTINI