O Estado de São Paulo, n. 45864, 14/05/2019. Política, p. A4

 

Dono da Gol delata MDB e cita 'benefícios' a Maia

Breno Pires

14/05/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Delação. Juiz do DF homologa acordo de Henrique Constantino; ele fala em propina de R$ 7 mi a Temer e outros emedebistas e vantagens ‘financeiras’ a presidente da Câmara

Um dos donos da Gol Linhas Aéreas, o empresário Henrique Constantino afirmou em delação premiada ter repassado R$ 7 milhões em propina a pedido do ex-presidente da República Michel Temer e de integrantes da cúpula do MDB. O empresário também cita “benefícios financeiros” pagos ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

A delação, homologada no dia 16 de abril pelo juiz da 10.ª Vara Criminal Federal do Distrito Federal, Vallisney de Souza Oliveira, cita o envolvimento de ao menos 12 políticos de cinco partidos diferentes – além de MDB e DEM, PT, PP e PSDB.

Sobre Temer, Constantino disse que o então vice-presidente da República participou de uma reunião em junho de 2012, em Brasília, ao lado de Eduardo Cunha (MDB-RJ) e Henrique Eduardo Alves (MDB-RN), que eram deputados na época.

Segundo o empresário, durante o encontro foi solicitado o pagamento de R$ 10 milhões “em troca de atuação ilícita de membros do grupo em diversos negócios”. O interesse do empresário era a liberação de financiamento de R$ 300 milhões do Fundo de Investimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FI-FGTS), controlado pela Caixa Econômica Federal, para a ViaRondon, empresa ligada a Constantino.

Do valor pedido pelos emedebistas, o empresário diz que pagou R$ 7,077 milhões, divididos em duas partes. Uma fatia para a campanha do ex-deputado Gabriel Chalita, então integrante do MDB, à Prefeitura de São Paulo, em 2012, e outra para empresas indicadas por Funaro para intermediar a propina, como Viscaya e Dallas.

Constantino conta que chegou ao grupo após se aproximar de Lúcio Funaro, operador de propina do MDB e que também é delator. O empresário afirma ainda que Funaro intermediou propina “de R$200 mil a R$ 250 mil” ao ex-ministro Geddel Vieira Lima para a abertura de uma linha de crédito de R$ 50 milhões da Caixa para a Oeste Sul Empreendimentos Imobiliários, outra empresa de sua família. Geddel era diretor do banco na época.

A colaboração foi firmada em fevereiro com a força-tarefa da Operação Greenfield, da Procuradoria da República do Distrito Federal, que investiga desvios em fundos de pensão, bancos públicos e estatais.

Como parte do acordo, o empresário se comprometeu a devolver R$ 70, 8 milhões a título de ressarcimento à Caixa e ao FGTS – equivalente a dez vezes o valor da propina.

Maia. Em um dos dez anexos da delação premiada, Constantino aponta o presidente da Câmara como recebedor de “benefício financeiro” por meio da Associação Brasileira de Empresas Aéreas (Abear). A entidade foi criada em 2012 para defender os interesses das empresas do setor. A informação consta de um trecho da decisão do juiz que foi divulgado com tarja pela Justiça Federal, mas ao qual o Estado teve acesso. No documento, porém, não há detalhamento sobre a citação ao presidente da Câmara.

Além de Maia, foram citados como beneficiários o ex-senador e atual presidente do MDB, Romero Jucá (RR), o senador Ciro Nogueira (PP-PI), além dos exdeputados Vicente Cândido (PT-SP), Marco Maia (PT-RS), Edinho Araújo (MDB-SP), Otávio Leite (PSDB-RJ) e Bruno Araújo (PSDB-PE), entre outros.

Cada um dos dez capítulos do acordo traz relatos de crimes e, segundo assinalou o magistrado, têm “regular índice de elementos probatórios”.

Constantino incluiu como provas para detalhar os crimes e-mails e trocas de mensagens pelo celular. Em algumas delas, enviadas a Funaro, utiliza termos como “reservas”, “bilhetes” e “poltronas” para se referir às propinas.

Também são citados pagamentos ao ex-governador de Minas Gerais Fernando Pimentel (PT) e patrocínio de uma liga de futebol americano no Brasil com “intervenção” do ex-deputado federal Vicente Cândido.

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Políticos delatados negam ter recebido valores ilícitos

Breno Pires

Beatriz Bulla

Luiz Vassallo

14/05/2019

 

 

Políticos citados na delação premiada do empresário Henrique Constantino negam ter recebido valores ou benefícios do dono da Gol Linhas Aéreas.

“Nunca me pagou nada, isso é mentira dele, não tem como provar e vai ser mais um inquérito arquivado na Justiça brasileira”, afirmou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao chegar a um jantar com investidores estrangeiros, em Nova York. O deputado disse que não conhece e nunca teve nenhum tipo de relacionamento com Constantino.

A defesa de Michel Temer afirmou ter ficado surpreendida com a divulgação da delação na véspera do julgamento do habeas corpus do ex-presidente pelo STJ. “Fica evidente o propósito de constranger os ministros que decidirão amanhã (hoje)”, disse o criminalista Eduardo Carnelós.

Segundo a defesa do ex-deputado Henrique Eduardo Alves (MDB-RN), as afirmações de Constantino são “absolutamente infundadas”. Segundo a defesa, o emedebista nem “sequer o conhece, não tendo jamais conversado ou se reunido com ele”.

O advogado Daniel Gerber, que representa Marco Maia (PT-RS), afirmou que seu cliente “desconhece a acusação e está sempre ao dispor das autoridades competentes para esclarecimento sobre a lisura de seu agir”.

A Associação Brasileira das Empresas Aéreas disse desconhecer os fatos e o teor da delação e afirmou estar à disposição da Justiça. A reportagem não conseguiu contato com os outros citados até a conclusão desta edição.