O Estado de São Paulo, n. 45864, 14/05/2019. Política, p. A9

 

Moro nega ter condicionado ida ao STF

Pepita Ortega

Edson Fonseca

Breno Pires

14/05/2019

 

 

Ex-juiz afirma, entretanto, que ser ministro da Corte é um ‘sonho de todo magistrado’; ‘compromisso’ foi citado por Bolsonaro anteontem

Ministro. Moro, em simpósio no Rio; ex-juiz afirma que quando recebeu convite para assumir ministério não impôs ‘nenhuma condição’

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, afirmou ontem, em Curitiba, que não impôs “nenhuma condição” quando aceitou o convite de Jair Bolsonaro para fazer parte do governo. Anteontem, o presidente disse, em entrevista à Rádio Bandeirantes, que espera cumprir seu “compromisso” de indicar o ex-juiz da Lava Jato para uma vaga no Supremo Tribunal Federal.

“Ele (Bolsonaro) foi eleito, fez o convite, fui até a casa dele no Rio de Janeiro. Nós conversamos e eu não estabeleci nenhuma condição. Não vou receber convite para ser ministro e estabelecer condições sobre circunstâncias do futuro que não se pode controlar”, afirmou Moro, que participou do Congresso Nacional Sobre Macrocriminalidade e Combate à Corrupção.

“O que eu levei ao presidente foi: ‘Presidente, eu quero trabalhar contra a corrupção, crime organizado e crime violento’. Esse tem de ser o foco do Ministério da Justiça e Segurança Pública. E houve uma convergência de pautas”, disse ele, sobre a declaração do presidente.

O ex-juiz afirmou ainda que ficou “honrado” com a lembrança de seu nome para compor a Corte – a primeira cadeira a ficar vaga deverá ser a do decano Celso de Mello, que se aposentará aos 75 anos de idade em novembro de 2020.

Moro disse que ser ministro do STF é o “sonho” de todo magistrado, mas sua indicação seria assunto a ser discutido quando surgir a vaga. “Antes, não.” “Fico extremamente honrado com a posição do presidente, claro, fui magistrado 22 anos, todo magistrado tem o sonho de compor o Supremo Tribunal Federal, mas isso não é algo com o que eu me preocupo no momento”, declarou o ministro.

Em um evento em Nova York, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que Moro tem “todas as qualidades” para ser ministro do Supremo e afirmou que a declaração de Bolsonaro “nem fortalece nem atrapalha” o trabalho do ministro da Justiça. “É uma questão que foi colocada antes. Ele ia ser ministro (da Justiça), depois estava automaticamente convidado para ser ministro do STF, é um direito do presidente.”

Também em Nova York, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), afirmou que há “uma longa travessia” até a indicação. “O próprio Moro falou que no momento do convite, se ainda houver o convite, ele também vai se manifestar se aceita ou não”, disse.

Congresso. Parlamentares ouvidos pelo Estado consideram que a sinalização de Bolsonaro “abriu a guarda” para uma nova série de ataques ao ex-juiz no Congresso. A avaliação é de que, ao assumir o compromisso mais de um ano antes, o presidente expôs o ministro antecipadamente, e aumentou o desgaste que ele vem enfrentando na Câmara e no Senado. “Minha avaliação é de que ele (Bolsonaro) queimou a largada”, disse o líder do PSL no Senado, Major Olimpio (SP). “Acabou sendo contraproducente. O meu amigo Bolsonaro, no afã de valorizar o Sérgio Moro, acabou o expondo desnecessariamente”, afirmou.

Para o líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), é “estranho” Bolsonaro ter antecipado a intenção de indicar Moro. “O que chama a atenção é ele ter sido nomeado como ministro da Justiça diante de um compromisso anterior de ser ministro do Supremo”, disse.

No Congresso, a oposição articula incluir na reforma da Previdência uma cláusula que aumenta a idade de aposentadoria compulsória de ministros do STF, dos atuais 75 anos para 80, alterando a chamada “PEC da bengala”. Isso impediria Bolsonaro de fazer indicações para o STF durante o mandato. Na Câmara, a deputada Bia Kicis (PSL-DF) tenta colher assinaturas para uma PEC que propõe o inverso: a redução para 70 anos.

'Futuro'

“Nós conversamos e eu não estabeleci nenhuma condição. Não vou receber convite para ser ministro e estabelecer condições sobre circunstâncias do futuro que não se pode controlar.”

Sérgio Moro

MINISTRO DA JUSTIÇA

Pacote

Sérgio Moro disse ontem, no Rio, que considera “possível” a aprovação ainda este ano de seu pacote anticrime. “Acreditamos no projeto, que tem medidas simples e eficazes”, afirmou.

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Votação que tirou Coaf da Justiça fere Constituição, dizem juízes

14/05/2019

 

 

Em nota, Unajuf afirma que Congresso não tem competência para alterar decreto baixado pelo presidente Jair Bolsonaro

A União Nacional dos Juízes Federais do Brasil (Unajuf), que representa magistrados de 1.º grau, manifestou apoio ao ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sérgio Moro, pela manutenção do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) na pasta. Em nota, a entidade afirmou que seria “inconstitucional” a decisão de transferir o órgão para o Ministério da Economia, comandado pelo ministro Paulo Guedes.

A mudança foi aprovada na quinta-feira passada, por 14 votos a 11, na comissão mista que analisa a Medida Provisória 870 – que estabelece nova estrutura para os ministérios do governo. O requerimento ainda precisa passar pelos plenários da Câmara e do Senado, o que deve acontecer na próxima semana.

Segundo a Unajuf, a votação violaria o processo legislativo, por “vício de iniciativa de tramitação”. Para o juiz Eduardo Cubas, presidente da entidade, “o Coaf vai ficar no Ministério da Justiça independentemente da aprovação da MP”. “O que vale é o decreto do presidente. A sociedade está ansiosa por ver a atuação dessa fiscalização”, diz Cubas.

A entidade afirmou ainda que o deslocamento do Coaf para o Ministério da Justiça foi realizado por meio de decreto presidencial no início do ano, e que não caberia ao Congresso Nacional revogá-lo, “prevalecendo a independência do Poder Executivo para atos de gestão”.

A Unajuf argumenta que dispor sobre organização e funcionamento da administração federal “é competência privativa do Presidente da República”.

Empenho. Embora o discurso do Palácio do Planalto tenha sido o de que a manutenção do Coaf na Justiça era prioritária para o combate à corrupção, na prática o governo não se empenhou para que o colegiado ficasse sob a responsabilidade de Moro, ex-juiz da Lava Jato. Sem votos no Congresso, o Planalto preferiu fazer acordo com o Centrão – bloco que reúne aproximadamente 250 dos 513 deputados – e também com a oposição, na tentativa de salvar o novo desenho da Esplanada dos Ministérios previsto na MP 870, enviada pelo presidente Jair Bolsonaro em janeiro.

Além de decidir, por 14 votos a 11, devolver o Coaf à equipe econômica – como era em governos anteriores –, a comissão mista do Congresso também resolveu transferir o comando da Fundação Nacional do Índio (Funai), hoje com o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, para Moro.

O Coaf é considerado estratégico porque recebe informações sobre suspeitas de lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio e até financiamento de atividades criminosas ou terroristas. O colegiado teve participação em investigações como a do mensalão, no governo Lula, e em várias etapas da Lava Jato. Foi também o Coaf que identificou movimentações bancárias atípicas de R$ 1,2 milhão na conta de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), como revelou o Estado. O próprio Flávio foi alvo do Coaf.

'Competência'

“(...) Organização da administração, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos, é competência privativa do Presidente da República.”

Nota da Unajuf