O Estado de São Paulo, n. 45861, 11/05/2019. Notas e informações, p. A3

 

O licenciamento ambiental

11/05/2019

 

 

A Constituição de 1988 assegurou, em seu art. 225, que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Para assegurar a efetividade desse direito, a Carta Magna impôs ao Estado alguns deveres, como, por exemplo, o de “exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade”. Ou seja, onde houver risco de significativa degradação devese antes realizar um estudo de impacto ambiental.

Sendo absolutamente razoável, essa exigência constitucional de estudo prévio foi sendo desvirtuada no correr do tempo, com a criação de inúmeras regras burocráticas. Em muitos casos, essa complexidade normativa guarda pouca relação com a preservação efetiva do meio ambiente, sendo, a rigor, apenas um elemento de entrave à atividade econômica, mesmo quando ela não representa riscos para um ambiente ecologicamente equilibrado.

Diante dessa situação de muitas normas e pouca efetividade, é urgente regulamentar adequadamente o dispositivo constitucional sobre o licenciamento ambiental. Há no Congresso vários projetos de lei sobre o tema, mas ainda não se aprovou uma Lei Geral do Licenciamento Ambiental. A principal iniciativa da Câmara dos Deputados para regulamentar o art. 225 da Constituição é o Projeto de Lei (PL) 3.729/2004, que tramita há 15 anos. Recentemente, o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) assumiu a relatoria do projeto, com a missão de submetêlo à votação pelo plenário da Câmara em regime de urgência. Junto ao PL 3.729/2004, foram reunidas outras iniciativas sobre o tema.

A proteção do meio ambiente é um assunto que envolve muitos interesses. Bastou a notícia de que o Congresso voltava a dar andamento ao PL 3.729/2004 para que 80 organizações não governamentais divulgassem nota de repúdio ao projeto. Questionado sobre essa reação contrária à proposta de Lei Geral do Licenciamento Ambiental, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), fez um chamado ao bom senso: “Como eles (as ONGs) podem ficar contra algo que não conhecem?”.

Ainda não se chegou à redação final do projeto a ser votado. “Vamos trabalhar a construção do texto ouvindo a todos”, disse Rodrigo Maia. A ideia é que o PL 3.729/2004 traga mais equilíbrio ao tema. A versão a que o Estado teve acesso isenta, por exemplo, os produtores rurais da necessidade de pedir licenciamento ambiental para o cultivo agrícola ou criação de gado em suas propriedades. O projeto libera também a silvicultura – as plantações de florestas de eucalipto – da exigência de licenciamento.

“Não faz sentido o produtor começar o licenciamento ambiental do zero porque plantava algodão em um ano e, no outro, vai usar a área, já desmatada, para plantar milho”, disse o relator. Pela atual legislação, o agricultor é obrigado a obter uma nova licença mesmo quando o solo é de uso alternativo.

Uma Lei Geral do Licenciamento Ambiental deve trazer maior segurança jurídica, o que certamente reduzirá custos. Atualmente, os gastos com licenciamento ambiental podem chegar a até 27% do valor do empreendimento. O objetivo, segundo o relator, é alcançar “um equilíbrio entre o setor produtivo e os ambientalistas, para que o licenciamento ambiental deixe de ser uma mera burocracia, um fator que atrapalha, para ser parte do planejamento estratégico do empreendimento e auxilie no desenvolvimento”.

Do mesmo modo que o Congresso conseguiu encontrar uma solução equilibrada com o Código Florestal de 2012, é hora de repensar o licenciamento ambiental. Ele tem uma finalidade constitucional precisa, que não pode ser abandonada.