Correio braziliense, n. 20464, 01/06/2019. Política, p. 4

 

Ministro evangélico no STF?

Maria Eduarda Cardim

01/06/2019

 

 

Bolsonaro diz que Supremo assume indevidamente o papel do Legislativo ao decidir que homofobia e crime

O presidente Jair Bolsonaro questionou, ontem,  durante um evento em um templo da Assembleia de Deus, em Goiânia (GO), qual o papel do Supremo Tribunal Federal (STF), ao analisar a tendência da Corte de criminalizar a homofobia. “O Supremo Tribunal Federal agora está discutindo se homofobia pode ser tipificado como racismo. Desculpe aqui o Supremo Tribunal Federal, que eu respeito e jamais atacaria outro Poder, mas, pelo que me parece, estão legislando”, afirmou.
Desde o início do ano, o STF julga dois processos que discutem se há omissão do Congresso para a edição de leis que criminalizem a homofobia. Dos 11 ministros, seis se pronunciaram e entenderam que, na ausência de lei específica, ofensas a homossexuais e a transexuais devem ser enquadradas como uma forma de racismo. A sessão será retomada em 13 de junho, mas já há maioria formada sobre o tema.
Ao continuar o discurso, o presidente indagou se já não era hora de o STF ter um ministro assumidamente evangélico. “O Estado é laico, mas eu sou cristão. Então, com todo respeito ao Supremo Tribunal Federal, uma pergunta: existe algum, entre os 11 ministros do Supremo, evangélico, cristão assumido?”, questionou. “Não me venha a imprensa dizer que eu quero misturar a Justiça com a religião. Todos nós temos uma religião ou não temos. E respeitamos e tem que respeitar. Será que não está na hora de termos um ministro do Supremo Tribunal Federal evangélico?”, completou, sob aplausos.
Os questionamentos e avaliações de Bolsonaro foram comentados pelo ministro do STF Alexandre de Moraes, que afirmou ser natural que o chefe do Executivo escolha nomes alinhados com a ideologia de seu governo. “Ele, sendo o presidente da República, pode escolher aquele que entender que seria o perfil ideológico mais próximo ao seu governo. Isso ocorre no Brasil, nos Estados Unidos. Cabe ao Senado aprovar. São declarações normais, cada presidente tem o direito constitucional de escolher ministros do STF”, disse.
Durante os quatro anos de mandato, Bolsonaro deve indicar dois nomes para vagas que devem ser abertas na Corte com as aposentadorias dos ministros Celso de Mello e Marco Aurélio Mello. A legislação obriga os ministros a se aposentarem aos 75 anos. O chefe do Planalto já sinalizou que indicaria o atual ministro da Justiça, Sérgio Moro, para a primeira delas.
Já para o presidente da Corte, Dias Toffoli, não existe espaço no Judiciário para ideologias e paixões. Apesar de não se referir diretamente a Bolsonaro, Toffoli contrariou a fala do presidente da República em um evento na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e reforçou que os juízes têm papel moderador e o objetivo único de obedecer à lei e à Constituição. “Por isso, não há lugar para paixões, ideologias e vontades. Juiz não pode ter vontade. Se tiver vontades, sai da magistratura, vai para política, para movimentos associativos, vai para o Executivo, vai ser candidato”, afirmou.
As críticas de Bolsonaro à criminalização da homofobia também foram rebatidas por Alexandre de Moraes. Para o ministro, o que o Judiciário faz é auxiliar minorias. “Não há nada de legislar, o que há é a aplicação da Constituição, que é protetiva de uma minoria, que sofre violência tão somente pela sua orientação sexual. Não é possível continuar com isso. [...] Se a minoria tem direitos negados, se sofre discriminação e perseguição, não consegue mudar o Executivo e o Legislativo, o que sobra? O Poder Judiciário”, disse.
“Arma é para usar”
Ao voltar de Goiânia para Brasília, o presidente almoçou com caminhoneiros em uma churrascaria de beira de estrada em Anápolis (GO) e fez mais uma afirmação polêmica. Bolsonaro incentivou o grupo a dar entrada no pedido de porte de arma de fogo. “No decreto, eu acabei com a comprovação da efetiva necessidade (do porte). Por enquanto, está um pouco caro ainda, mas vamos diminuir isso aí. Mas já abriu as portas, dá entrada... Tem um tempo de dois ou três meses para conceder o porte. Eu coloquei lá como profissão de risco (caminhoneiros). Quanto mais arma, mais segurança. Se tiver arma de fogo, é para usar”, explicou.
No encontro,  Bolsonaro se comprometeu a acabar com os radares móveis — “para dar uma folga para o policial rodoviário” — e disse que pretende aumentar a validade da carteira de motorista para 10 anos e passar o limite de pontos por multas na carteira para 40. O presidente estava acompanhado do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, do líder do governo na Câmara dos Deputados, Major Vitor Hugo (PSL), e do porta-voz da Presidência da República, Otávio Rêgo de Barros.

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Com o PT na bagagem

 

 

 

Rodolfo Costa

01/06/2019

 


O presidente Jair Bolsonaro criou polêmica ao anunciar que vetará a emenda que reintroduz o direito de despacho gratuito de bagagem de até 23kg em voos domésticos e internacionais, previsto na Medida Provisória nº 863/2018. Ao ressaltar que o destaque posto no texto no Congresso foi proposto pelo PT, declarou que não vetaria apenas por ser uma proposta petista. “Minha tendência é vetar. Não é porque (a emenda) é do PT. Se bem que é um indicativo”, disse.
A declaração foi feita em transmissão ao vivo em uma rede social na noite de quinta-feira, ao lado da deputada Aline Sleutjes (PSL-PR) e da senadora Soraya Thronicke (PSL-MS). “Os caras são socialistas, comunistas, são estatizantes. Eles gostam de pobre. Quanto mais pobre tiver, melhor. Olha a educação do PT. Caímos barbaramente e aumentou a despesa”, disse.
O presidente fez a declaração em um momento que comentava sobre a situação de vetar ou não, que classificou como “batata quente no colo”. “Alguns dizem que devo vetar, outros, sancionar. Se sancionar, não cobra bagagem de até 23kg. Eu vetando, será cobrada acima de 10kg. E aí eu começo: pô (sic), se o presidente vetar, ele está fazendo o jogo das empresas aéreas. Se eu sancionar, estou ajudando o passageiro”, comentou.
Ao anunciar o veto, Bolsonaro mostrou que mudou de posição sobre o assunto. Na semana passada, no Recife, ele havia dito que seu coração mandava sancionar a gratuidade da bagagem: “Vou sancionar. Quando começou a cobrança, as passagens não caíram, pô! Não adiantou nada, certo?”
Na quarta-feira, entretanto, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) encaminharam ofício à Casa Civil recomendando o veto. O porta-voz da Presidência da República, Otávio Rêgo Barros, declarou que Bolsonaro tomaria a decisão com base em estudos técnicos “profundos”, mas que ainda não havia se debruçado sobre o assunto.