Correio braziliense, n. 20464, 01/06/2019. Política, p. 4

 

Sabotagens, choro e noites sem dormir

Jorge Vasconcellos

01/06/2019

 

 

O presidente Jair Bolsonaro passou noites sem dormir e teve crises de choro, em meio às pressões do cargo. Essa e outras revelações foram feitas em uma entrevista à revista Veja, divulgada ontem. O presidente também falou das peripécias financeiras do amigo Fabrício Queiroz, de “sabotagens” no governo, de uma bronca no guru Olavo Carvalho, do ex-presidente Lula e do atentado sofrido durante a campanha eleitoral.
“Já passei noites sem dormir, já chorei pra caramba também. Angústia, né? Tá faltando o mínimo de patriotismo para algumas pessoas que decidem o futuro do Brasil. O pessoal não está entendendo para onde o Brasil está indo. Não preciso dizer quem são essas pessoas. Elas estão aí”, disse o presidente na entrevista. “Imaginava que ia ser difícil, mas não tão difícil assim. Essa cadeira aqui é como se fosse criptonita para o Super-Homem”, disse o presidente, que também admitiu ter cometido um erro ao nomear o colombiano Ricardo Vélez para o Ministério da Educação.
“Errei no começo quando indiquei o Ricardo Vélez como ministro. Foi uma indicação do Olavo de Carvalho? Foi, não vou negar. Ele teve interesse, é boa pessoa. Depois liguei para ele: ‘Olavo, você conhecia o Vélez de onde?’. ‘Ah, de publicações’. ‘Pô, Olavo, você namorou pela internet?’, disse a ele, contou o presidente.
O presidente apontou “sabotagens” dentro do governo e disse que a pressão do cargo é muito grande, além de revelar que mudou o “jeito de conduzir os destinos do Brasil”. “É uma luta de poder. Há sabotagens, às vezes, de onde você nem imagina. No Ministério da Defesa, por exemplo, colocamos militares nos postos de comando. Antes, o ministério estava aparelhado por civis. Havia lá uma mulher em cargo de comando que era esposa do 02 do MST. Tinha ex-deputada do PT, gente de esquerda... Pode isso? Mas o aparelhamento mais forte mesmo é no Ministério da Educação”, afirmou.
Sobre Lula, afirmou que não sente compaixão pelo fato de o ex-presidente estar condenado e preso. “Ele saiu de uma situação de líder para a de um cara preso, condenado por corrupção. Apesar disso, não tenho nenhuma compaixão em relação a ele. Ele estava trabalhando para roubar também a nossa liberdade”, declarou.
O presidente admitiu preocupação com a quebra dos sigilos do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), seu filho, requerida pelo Ministério Público. “Se alguém mexe com um filho seu, não interessa se ele está certo ou está errado, você se preocupa”, disse, ao citar que uma das operações investigadas pelo MP — de um financiamento bancário de R$ 1 milhão — está registrada em cartório.
Bolsonaro repetiu que cabe ao ex-assessor de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) Fabrício Queiroz explicar as operações suspeitas, mas insinuou haver um aumento da exposição do caso por se tratar do filho do presidente.
“Teve um episódio dele com o meu filho em Botafogo, um assalto na frente de casa, e o Queiroz, impetuoso, saiu para pegar o cara. Então, existe essa amizade comigo, sim. Pode ter coisa errada? Pode, não estou dizendo que tem. Mas tem o superdimensionamento porque sou eu, porque é meu filho. Ninguém mais do que eu quer a solução desse caso o mais rápido possível”, disse.
O presidente também disse estar convicto de que a facada que levou durante a campanha eleitora foi um crime encomendado. “Não quero me vitimizar nem inventar um culpado para o episódio, mas isso não saiu da cabeça dele”, disse Bolsonaro sobre o autor da facada, Adélio Bispo, que foi considerado pela Justiça inimputável — quando não pode responder penalmente por um crime — ao ser diagnosticado com um transtorno mental.
Cunha vai para presídio no Rio
O ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB) deixou na manhã de ontem o Complexo Médico Penal (CMP), em Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, onde estava preso há dois anos e sete meses. Ele foi transferido para o Rio de Janeiro, a pedido de seus advogados, para ficar mais próximo da família. De acordo com a Polícia Federal, Cunha ficará detido no Presídio Pedrolino Werling de Oliveira, Bangu 8, no Complexo Penitenciário de Gericinó, na zona oeste. O ex-deputado estava preso no Paraná desde outubro de 2016. Em março do ano passado, ele foi condenado em primeira instância a 15 anos e quatro meses de reclusão pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.